Supremo da Venezuela declara nulas todas as decisões do novo parlamento
Respondendo a mais um recurso interposto pelo regime chavista, a mais alta instância judicial do país classifica funcionamento da Assembleia Nacional, dominada pela oposição, como um "desacato" à sua autoridade constitucional.
O Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela declarou a nulidade de todos os actos legislativos já aprovados pela nova Assembleia Nacional, empossada há uma semana e dominada pela oposição ao regime chavista – e estendeu essa deliberação a toda a actividade parlamentar futura, que segundo os juízes do Supremo constitui um “desacato” à sua autoridade constitucional.
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O Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela declarou a nulidade de todos os actos legislativos já aprovados pela nova Assembleia Nacional, empossada há uma semana e dominada pela oposição ao regime chavista – e estendeu essa deliberação a toda a actividade parlamentar futura, que segundo os juízes do Supremo constitui um “desacato” à sua autoridade constitucional.
Confirmando o “choque de poderes” legislativo, executivo e judicial, anunciado após a retumbante vitória eleitoral da oposição que inverteu a balança do poder na Assembleia Nacional, o Supremo Tribunal deferiu um pedido de anulação de todas as decisões daquele órgão de soberania, considerando que o seu funcionamento está ferido de ilegalidade por causa da presença de três deputados cuja tomada de posse estava impedida por uma providência cautelar.
A decisão judicial, que a oposição mais uma vez promete desafiar, é a última de uma série de medidas e contra-medidas tomadas pelo regime chavista (via Governo e tribunais) para impedir que a coligação de forças de oposição, a Mesa da Unidade Democrática, possa beneficiar da maioria de dois terços do parlamento conquistada nas legislativas de 6 de Dezembro. “É uma sentença política. Não resta agora a mínima dúvida de que o Supremo está ao serviço do Governo para anular a vontade popular”, reagiu o novo presidente da Assembleia Nacional, Henry Ramos Allup, que classifica a intervenção do tribunal como “um golpe judicial”.
Prosseguindo o braço-de-ferro, o seu vice-presidente, Simón Calzadilla, garantiu que os 112 deputados eleitos pela MUD continuarão a trabalhar e que a agenda do parlamento será cumprida. “Estamos protegidos pela Constituição”, sublinhou. O antigo presidente da assembleia e número dois do chavismo, Diosdado Cabello, informou entretanto que a bancada do Partido Socialista Unido da Venezuela não respeitará nenhuma ordem do parlamento, em conformidade com a decisão do Supremo. Ou seja, o conflito institucional aparentemente está para durar.
Logo depois de reconhecer a vontade expressa nas urnas, o Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, iniciou as manobras para limitar a acção parlamentar da oposição e evitar a sua possível interferência no desempenho do Governo. Começou por substituir 13 dos 32 juízes do Supremo Tribunal de Justiça, depois reforçou os poderes presidenciais à custa da revogação de funções da assembleia legislativa e por fim avançou com a abertura de um novo Parlamento Comunal – um órgão paralelo originalmente idealizado por Hugo Chávez e integralmente composto por elementos chavistas.
Ao mesmo tempo, o regime entrou com uma série de recursos numa tentativa de impugnação dos resultados em oito circunscrições do país, que elegeram nove deputados da MUD – que se porventura perdessem o mandato, deixariam a maioria absoluta da oposição sem os votos necessários para, entre outras medidas, aprovar reformas constitucionais, convocar referendos ou censurar membros do Governo.
Os processos foram imediatamente acolhidos, mas enquanto espera pela deliberação, o regime conseguiu fazer aprovar uma providência cautelar para suspender a posse dos deputados eleitos pelo estado do Amazonas, três deles da oposição e um do “oficialista” PSUV. Como os deputados do MUD foram empossados, a bancada chavista apresentou um novo recurso, pedindo ao Supremo para se pronunciar sobre a alegada inconstitucionalidade da entrada em funções de deputados suspensos: “É um desrespeito”, considerou o tribunal, que decretou que a permanência dos eleitos da MUD na assembleia nulifica todas as resoluções ou leis que venham a ser aprovadas.
Não é claro como se pode desfazer este nó e evitar que a crise inconstitucional se prolongue, uma vez que nem o Governo nem a oposição pretendem acatar os regulamentos do parlamento, as leis do país e as decisões judiciais. Para já, o Conselho Nacional Eleitoral, que sancionou os resultados de 6 de Dezembro como legítimos, manteve-se fora do confronto, mas poderá ser chamado a envolver-se – enquanto não o fizer, dizem especialistas, a sua proclamação mantém-se em vigor e não pode ser revertida ou suspensa por providências cautelares. Se tal fosse possível, alega a oposição, o próprio Presidente Nicolás Maduro teria sido ilegalmente empossado, uma vez que nas eleições de 2014 o seu adversário Henrique Capriles impugnou os resultados eleitorais.
Apesar de não haver solução à vista, tanto a oposição como o regime afastam o cenário de vazio institucional e paralisia do Estado. Os deputados da MUD prometem apresentar, no início de Fevereiro, as conclusões da comissão de avaliação da designação de juízes, que foi constituída para investigar a legalidade das sessões extraordinárias para nomear os juízes, já depois das eleições. E garantem que vão aprovar em breve o seu projecto de lei de amnistia para todos os presos políticos – entre os quais vários dirigentes partidários da oposição a cumprir penas por conspiração contra o Presidente e tentativa de golpe de Estado.
Pelo seu lado, o partido oficialista – que quer agendar a votação de uma proposta para a declaração do estado de emergência económico, dando ao executivo carta branca para “aprofundar a revolução e combater a guerra económica” – considera que a Sala Constitucional do Supremo Tribunal de Justiça pode vir a assumir as funções legislativas da Assembleia, se a maioria da MUD se mantiver em “desacato”.