Chovem críticas sobre Cameron ao visitar cheias no Norte de Inglaterra

Primeiro-ministro britânico defende actuação do Governo, mas populações falam em negligência e oposição aponta para diferença de tratamento entre Norte e Sul.

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O primeiro-ministro britânico, David Cameron, viajou para o Norte de Inglaterra para aferir, in loco, a dimensão dos prejuízos resultantes das cheias “sem precedentes” e descritas como “catastróficas” na histórica cidade de York – onde centenas de pessoas foram forçadas a abandonar as suas casas no dia de Natal, perante a avassaladora subida das águas.

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O primeiro-ministro britânico, David Cameron, viajou para o Norte de Inglaterra para aferir, in loco, a dimensão dos prejuízos resultantes das cheias “sem precedentes” e descritas como “catastróficas” na histórica cidade de York – onde centenas de pessoas foram forçadas a abandonar as suas casas no dia de Natal, perante a avassaladora subida das águas.

O leito dos rios Ouse, Foss e Aire, e vários afluentes, tem estado a sair das margens desde o fim-de-semana, deixando dezenas de localidades – aldeias e vilas rurais mas também cidades e centros industriais – submersas, sem electricidade ou telecomunicações e isoladas por força da inundação ou destruição dos acessos.

Além da pitoresca e turística região do Lancashire, que inclui o chamado Lake District, foram afectadas grandes cidades como Leeds e a área metropolitana de Manchester, que registaram falhas de energia. Zonas da Escócia, do País de Gales e da Irlanda do Norte também foram atingidas pelo mau tempo.

A circulação rodoviária e ferroviária foi interrompida, e em muitos locais as canoas e botes de borracha tornaram-se o único meio de resgate de centenas de famílias que viram a água subir acima do tejadilho dos carros. Em menos de um mês, várias regiões do Reino Unido viram-se parcialmente submersas pela subida das águas dos rios provocada por chuvas torrenciais e pelo falhanço dos sistemas de retenção de águas: no início de Dezembro, as tempestades Desmond e Eva causaram prejuízos superiores a 1,3 mil milhões de libras (1,8 mil milhões de euros), segundo a PricewaterhouseCoopers.

Mais do que clamar contra o tempo, os habitantes das áreas afectadas, especialistas de protecção civil e políticos da oposição insurgiram-se contra o Governo conservador e as suas medidas de austeridade, que levaram a uma redução de 27% do orçamento destinado à defesa contra cheias e da transferência para as administrações locais do financiamento de programas de protecção civil. O primeiro-ministro defendeu as decisões do seu executivo, e negou que tenha havido um desinvestimento: “Gastámos muito dinheiro em defesas [de cheias] e vamos gastar ainda mais no futuro”, garantiu, dizendo que o orçamento para os próximos seis anos ascende aos 2,3 mil milhões de libras (3,1 mil milhões de euros), que evitarão que 300 mil casas sejam inundadas.

“Estamos aqui para aferir a situação e perceber que mais precisamos de fazer. Depois destes acontecimentos, o normal é avaliarmos o que aconteceu com o dinheiro que já gastámos e as estruturas que construímos, e depois olhar para o dinheiro que ainda vamos gastar e o que está previsto construir para saber se os nossos planos estão correctos ou se precisamos de fazer mais”, justificou o primeiro-ministro – que deixou palavras de elogio e pelo trabalho dos serviços de emergência e de protecção civil, dos 500 soldados destacados e de centenas de voluntários.

As críticas políticas contra Cameron tiveram também uma componente regional, com o líder conservador a ser acusado de negligenciar o Norte do país, terreno tradicionalmente favorável ao Labour. “Cheias desta dimensão são inimagináveis em Londres ou no Sudeste, onde há muito foram montados os mais sofisticados sistemas de protecção contra cheias”, escrevia em editorial o Yorkshire Evening Post. Para a líder do conselho municipal de Leeds, Judith Blake, era difícil ignorar as diferenças Norte-Sul na distribuição de recursos: “Todos percebemos que as populações afectadas pelas cheias no Norte não tiveram o mesmo apoio  atribuído, por exemplo, ao Somerset”, comparou.

Pelo seu lado, o líder do Ukip, Nigel Farage, criticou as prioridades do executivo. Porque é que o Reino Unido dáajuda financeira a países como o Bangladesh quando esse dinheiro poderia salvaguardar as populações em risco de cheias, interrogou. “Os nossos cidadãos devem estar em primeiro lugar”, escreveu no Twitter.

Além do Governo, também a agência ambiental do Reino Unido esteve sob ataque, por causa da sua política de gestão dos recursos hídricos e dos sistemas de protecção de cheias. Estes terão de ser “completamente reequacionados” na sequência dos últimos eventos, reconheceu a agência. “Passámos de situações extremas conhecidas para situações extremas desconhecidas”, declarou o vice-director David Rooke, reconhecendo o papel das alterações climáticas. Será ainda preciso rever os sistemas de alerta de cheias e inundações, bem como sensibilizar as populações para a necessidade de preparar as suas habitações para uma mais rápida recuperação dos efeitos das inundações, disse à BBC.

A situação pode piorar dramaticamente nos próximos dias, com a chegada da tempestade Frank, que segundo os serviços meteorológicos deverá ter um “impacte significativo” nas zonas já inundadas, onde a acumulação de água poderá ultrapassar os 120 milímetros. As rajadas de vento e o elevado índice pluviométrico levaram os serviços a decretar alertas à população, incluindo de potencial risco de vida.