Última crónica
1) Esta é a minha última crónica na Revista 2 do PÚBLICO. Constrangimentos editoriais determinam que a revista termine no final do ano e que diversos colaboradores interrompam os seus textos.
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1) Esta é a minha última crónica na Revista 2 do PÚBLICO. Constrangimentos editoriais determinam que a revista termine no final do ano e que diversos colaboradores interrompam os seus textos.
Compreende-se que assim seja. Os custos de uma revista com qualidade são significativos e as tiragens não compensam. Gente nova prefere publicações de outro tipo e cada vez mais acompanha as notícias em edições de suporte digital. Dos meus colaboradores no hospital, são muito poucos os que, como eu, têm o hábito de comprar e ler em papel um jornal diário.
É provável que os jornais ainda se conservem por algum tempo. A morte do livro clássico foi anunciada de modo exagerado e todos os dias se continuam a publicar romances e ensaios, embora os grandes êxitos editoriais estejam agora reservados a autores que aparecem muito na televisão, ou que propõem receitas milagrosas para o corpo e para a alma.
Pela minha parte, é um ciclo que agora termina. Tenho à minha frente a minha primeira crónica, publicada em 20/11/94 na Notícias Magazine, com ilustrações de João Vaz de Carvalho. O título é curioso e bem centrado em polémica dessa altura: “Não falem mais da geração rasca”. Vinte e um anos depois, a discussão faz menos sentido, mas as conclusões desse texto permanecem bem actuais, como pode ver-se: “Aos pais de hoje, cabe a importante tarefa de estarem atentos a todas as manifestações de crescimento dos seus filhos. Um amor excessivo e sem limites pode ser um obstáculo para a autonomia, mas esta será tanto melhor alcançada quanto mais o vínculo afectivo for sentido na relação pais/filhos (…) ajudar a crescer não é estar sempre de acordo e mal vão as gerações se todos pensam do mesmo modo.”
Ao longo destes 21 anos de colaboração ininterrupta na imprensa, o tema das relações entre pais e filhos esteve muitas vezes presente. Nada é mais importante, porque a educação e as relações afectivas primordiais são cruciais para o futuro de cada indivíduo e do seu país. Neste momento, os pais estão próximos dos filhos como nunca mas, em muitos casos, há um marcado défice de autoridade e uma hesitação constante em traçar limites. Se o autoritarismo de outrora está condenado para sempre, a educação indulgente e permissiva, tão típica de tantos lares de hoje, tem dado origem a adolescentes determinados mas pouco respeitadores, cada vez mais centrados em si e pouco atentos ao reconhecimento do outro.
Também escrevi muito sobre a escola. É curioso como a escola da democracia ainda conserva tantas semelhanças com o Liceu Pedro Nunes da minha adolescência, com a diferença importante de os professores do meu tempo serem os protagonistas de um saber único, enquanto os de hoje partilham os seus conhecimentos com os alunos perante os dados permanentes da Internet. A verdade é que ainda predomina a exposição prolongada, o power-point compacto, a rara utilização pelos alunos do computador na sala de aula, num contexto em que a indisciplina cresce e o trabalho com as famílias não abunda. Esta é uma das áreas em que a mudança, tantas vezes proposta nos meus textos, se torna decisiva.
2) Última sugestão de leitura — Leiam Assim Começa o Mal, de Javier Marías. Com este belíssimo romance regressamos aos anos 1980 de Espanha, cinco anos depois da morte de Franco, onde tantos branqueavam o seu passado e procuravam sobreviver na democracia. O livro, todavia, é mais do que isso: um texto inesquecível sobre o amor, o desejo e a culpa. Um romance sobre o mal, a verdade e a ocultação.