Rectificativo está no Parlamento, mas partidos já só pensam na comissão de inquérito
“Remendo” ao orçamento é discutido de urgência no Parlamento, mas partidos à esquerda do PS não abrem o jogo sobre como vão votar. PSD e CDS empurram ónus para o Governo PS.
Os partidos com assento parlamentar discutem e votam na quarta-feira em poucas horas o Orçamento de Estado rectificativo, mas este parece ser só um mero procedimento processual – aquilo em que os deputados já pensam é em mais uma comissão de inquérito a um banco. Apesar de nenhum abrir o jogo sobre como tenciona votar, os partidos empurram culpas: a direita diz que a decisão final sobre o Banif é da responsabilidade exclusiva do Governo socialista, a esquerda defende que foi o Governo PSD/CDS quem deixou o banco chegar a um ponto de não retorno.
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Os partidos com assento parlamentar discutem e votam na quarta-feira em poucas horas o Orçamento de Estado rectificativo, mas este parece ser só um mero procedimento processual – aquilo em que os deputados já pensam é em mais uma comissão de inquérito a um banco. Apesar de nenhum abrir o jogo sobre como tenciona votar, os partidos empurram culpas: a direita diz que a decisão final sobre o Banif é da responsabilidade exclusiva do Governo socialista, a esquerda defende que foi o Governo PSD/CDS quem deixou o banco chegar a um ponto de não retorno.
Numa espécie de duelo sobre quem avançava com a ideia de uma comissão de inquérito ao Banif, o presidente socialista Carlos César e o líder da bancada bloquista quiseram antecipar-se à formalidade de falar em conferência de imprensa e na madrugada de segunda-feira usaram as redes sociais para defender a necessidade de uma investigação parlamentar ao processo de capitalização e venda do banco ao Santander Totta.
Foi depois o PCP quem começou o dia de dedo em riste a falar de um “verdadeiro crime económico” provocado pelo Governo de Passos Coelho, que provocou a “delapidação” de milhões de euros públicos, e a pedir uma comissão de inquérito. O filão da comissão de inquérito continuou a ser cavado pelo BE, com Mariana Mortágua – que brilhou no inquérito ao BES - a falar de “acto criminoso” da direita que colocou os objectivos eleitorais à frente do interesse nacional. E atacou o governador do Banco de Portugal, que “não tem as mínimas condições” para se manter no cargo. Para Ana Catarina Mendes, vice-secretária-geral do PS, a alternativa à venda seria a liquidação do banco, que acabaria por ter custos ao nível de todo o sistema financeiro – e os portugueses teriam que pagar uma factura ainda maior pela “irresponsabilidade” do anterior Governo.
A direita fugiu a falar sobre as suas responsabilidades, levantou dúvidas sobre a solução encontrada e empurrou para o actual Governo a responsabilidade “total” da decisão sobre o Banif. Tanto PSD como CDS se mostraram favoráveis ao inquérito, de tal forma que os centristas, que dizem ter “dúvidas legítimas e fundadas” sobre o processo, remetem já para a comissão a discussão sobre as possíveis soluções que poderiam ter sido adoptadas.
Para acomodar a medida de resolução do banco, o Conselho de Ministros aprovou nesta segunda-feira uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado deste ano, que é discutida e votada na quarta-feira no Parlamento. Ao fim da tarde de hoje, o ministro das Finanças, Mário Centeno, é ouvido pelos deputados, em comissão, sobre o documento e a discussão e votação na especialidade e final global serão feitas durante a manhã de quarta-feira para que haja tempo de o orçamento rectificativo seguir para Belém para promulgação.
Quando ao início da tarde, o ministro das Finanças veio confirmar que a medida de resolução vai ter um impacto de 2200 milhões no défice de 2015, não poupou nas críticas ao modo como o dossier foi conduzido pelo anterior executivo. A operação vai fazer aumentar o défice de 2015 em “mais de um ponto percentual do PIB”, colocando-o num valor a rondar os 4%. O custo, explicou Centeno, vai também “reflectir-se nos défices futuros na medida em que aumenta o endividamento” por causa dos juros, mas “não terá consequências na avaliação” que Bruxelas fizer para determinar se o país sai do procedimento por défice excessivo.
Mantendo a linha do discurso do primeiro-ministro de domingo à noite, Centeno disse que o novo Governo foi “confrontado com a urgência e a sensibilidade” de resolver o dossier com urgência, antes da entrada em vigor das novas regras de resolução bancária a partir de 1 de Janeiro. Uma posição que fora horas antes reconhecida pela comissária europeia com a pasta da política da concorrência, Margrethe Vestager, quando afirmou que o novo Governo português “recém-eleito teve de reagir rapidamente a uma situação difícil”.
Quando questionado sobre a actuação do anterior executivo, Centeno acusou-o de não ter resolvido o dossier por questões políticas, o que “objectivamente prejudicou a solução”, porque colocou pressão sobre a decisão agora tomada, aumentando os custos para os contribuintes. “Ocorreram factos”, como o fecho do programa de resgate (em Maio de 2014) e as eleições legislativas de 4 de Outubro que, segundo o ministro, levaram o anterior Governo a não resolver o processo. “Há alguma evidência de que a não actuação sobre esta questão possa estar associada a estes factos”, acusou, sublinhando que é “importante avaliar todo este processo” e que o Governo “se disponibilizou para essa clarificação”.
À noite, em entrevista à TVI, Maria Luís Albuquerque, ex-ministra das Finanças e agora deputada do PSD, recusou as críticas à sua actuação. A situação do Banif “não estava óptima” quando assumiu a pasta, “mas degradou-se muito nas últimas semanas”. “É inaceitável dizer que não fizemos nada”, afirmou. com Ana Rute Silva