Viagem ao infinito com A Winged Victory For The Sullen
Música celestial onde as categorias se confundem – clássica, de câmara ou ambiental – eis a proposta de dois compositores americanos, acompanhados por ensemble de cordas, para ouvir esta quinta-feira em Lisboa, sexta em Braga e domingo na Madeira. Dustin O' Halloran promete uma "viagem ao infinito."
Sonoridade instrumental, com qualquer coisa de celestial, nem apenas música clássica, ou ambiental, ou de câmara, ou minimalista, ou cinemática, ou electrónica, mas tudo isso ao mesmo tempo. Não é fácil definir A Winged Victory For The Sullen, o projecto do pianista e compositor de música para filmes, Dustin O’ Halloran, e do compositor e membro dos Stars Of The Lid, Adam Wiltzie.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Sonoridade instrumental, com qualquer coisa de celestial, nem apenas música clássica, ou ambiental, ou de câmara, ou minimalista, ou cinemática, ou electrónica, mas tudo isso ao mesmo tempo. Não é fácil definir A Winged Victory For The Sullen, o projecto do pianista e compositor de música para filmes, Dustin O’ Halloran, e do compositor e membro dos Stars Of The Lid, Adam Wiltzie.
Música doce e melancólica, ondulando em câmara lenta, povoada por notas de piano e estática desoladora entre as teclas. À volta plácidos arranjos de cordas e uma filigrana acústica em crescendo. Tudo isto, aparentemente simples, e muito eficiente, evocando estranhas formas, o espaço, o cosmos ou a formação de átomos.
Ambos americanos, a viver na Europa, Dustin em Berlim, Adam em Bruxelas. Conheceram-se há sete anos em Bolonha, Itália, e desde então têm colaborado. Não precisavam. São ambos muitos ocupados. Dustin lança álbuns a solo e, principalmente depois de Sofia Coppola o ter convidado para colaborar em Marie Antoinette, é um reconhecido criador de bandas sonoras (para cinema ou televisão, incluindo a série Transparent, que lhe valeu um Emmy o ano passado), enquanto o segundo também compõe para cinema, mas é mais celebrado pelos Stars Of The Lid, essencial formação na esteira do ambientalismo experimental.
A verdade é que aquilo que começou por ser uma ideia paralela nas suas vidas tem hoje um papel central, com A Winged Victory For The Sullen a tornar-se num projecto de culto. Em Agosto, por exemplo, subiram ao imponente palco do Royal Albert Hall de Londres. Esta quinta-feira estarão no teatro Maria Matos, em Lisboa, na sexta-feira no GNRation de Braga e domingo no festival MadeiraDig.
Em Lisboa será especial. É que para além da formação convencional (Dustin no piano, Adam na guitarra e electrónica, e mais três músicos de cordas, em violino, violoncelo e viola), haverá o reforço de um ensemble local de 10 músicos de cordas.
“A primeira vez que o promotor Pedro Santos nos viu tocar foi com uma orquestra e desde então ficou essa ideia no ar de repetirmos esse formato aqui, como uma orquestra local”, dizia-nos Adam, esta terça-feira, em Lisboa, enquanto Dustin expõe que o concerto será focado no último álbum, Atomos, editado o ano passado, embora também vá haver espaço para serem tocadas peças do primeiro álbum homónimo lançado em 2011. "Será como uma viagem ao infinito", diz, com sorriso.
O disco que a dupla vem agora apresentar a Portugal resultou de uma encomenda do conhecido coreógrafo de dança britânico Wayne McGregor que, depois de ouvir o primeiro álbum do projecto, os convenceu a criar música para um espectáculo seu.
“O processo dele trabalhar é muito orgânico e livre o que se aproxima da forma como também nós operamos”, reflecte Dustin, acrescentando que, apesar de ser uma peça comissariada, não existiram imposições. “Ele deixa as coisas em aberto, embora nos tivesse dado pistas e materiais que nos pudessem inspirar.”
Adam completa: “falámos muito de espaço interior ou da ideia de infinito e ele foi-nos dando vídeos, filmes de ficção científica dos anos 80 ou fotos, enfim, uma série de materiais, mas nunca falamos sobre referências musicais o que foi óptimo, porque preferimos operar a partir de conceitos e não de coisas concretas.”
Quando começaram a trabalhar na música não existia a ideia de a editar em álbum, “estávamos apenas focados em criá-la para dança porque havia sido isso a que nos havíamos proposto”, afirma Dustin, mas a verdade é que depois da estreia, em Outubro do ano passado, perceberam que possuía autonomia. “E de repente o projecto alargou-se para um álbum e para esta série de concertos, que vivem independentemente da dança. Aliás muitas pessoas que vêm ver-nos nem sabem que aquilo que estão a ouvir foi pensado, anteriormente, para uma coreografia.”
Em concerto, diz Adam, o som resulta “mais dinâmico” do que em disco. “Quando compusemos e depois gravávamos este material fizemo-lo em apenas quatro meses. Não existiu tempo para ponderações. Agora conhecemos melhor e temos uma relação mais aprofundada com o que fizemos e até introduzimos alterações”, retracta Adam. “São os mesmos temas, elementos e ambientes, mas é como se estivessem mais crescidos e completos”, reforça Dustin. “Agora tocamos como quinteto com os músicos de cordas que têm espaço para reinterpretar. Pegam no que compusemos e colocam lá a sua personalidade.”
Quando se ouve a sua música pode pensar-se em compositores como Arvo Pärt, Gorecki ou Gavin Bryars, ou em autores mais novos catalogados como pós-clássicos como Ólafur Arnalds, Max Richter ou Nils Frahm, mas mesmo assim ficará algo por explicar. “Temos influências muito diversas, do rock ao noise, e também de música clássica. Mas não num sentido tradicional. Quer dizer, são Philip Glass ou Steve Reich clássicos? Não creio. Somos apenas artistas, inspirados pelas mais diversas coisas.”
Quando se juntaram os dois não tinham qualquer expectativa em particular. Agora, ri-se Dustin, “não tenho tempo para mais nada”, enquanto Adam refere que “desde que nos sintamos inspirados, tenhamos energia e as pessoas respondam haveremos de continuar.” O seu álbum foi gravado entre Berlim e Bruxelas, com uma ponte em Reiquiavique para uma contribuição de Ben Frost, mas o facto de viverem em cidades diferentes não é problemática. “Tenho uma vida normal em Bruxelas”, expõe Adam, “acordo, olho para o céu cinzento, tomo café, e ponho-me a fazer música.”
“Eu faço café pela manhã e saio para beber café e quando chego ao estúdio bebo outro café. Passo lá a maior parte do tempo, com os meus diversos projectos. Sou capaz de estar dez horas fechado em estúdio”, afirma Dustin. “Não admira que quando estamos numa cidade como Lisboa nos sintamos a respirar de novo.”