Surpresas à esquerda

PS, BE, PCP e Verdes aprofundam acordos. A direita tem ajudado

A cerimónia de tomada de posse do XXI Governo foi a mais representativa desde há dezenas de anos. Nenhum dos partidos com assento parlamentar faltou, mesmo o Bloco de Esquerda e os Verdes que nunca participaram, ou o PCP, que há muito deixara de se fazer representar nestes actos protocolares. Depois das evidentes dificuldades na negociação dos acordos entre o PS e os partidos à sua esquerda, é óbvio que a presença de importantes dirigentes destas forças políticas no Palácio da Ajuda tem um simbolismo que vai muito para além da mera presença física. É como se este fosse também um acto de renovado empenho no compromisso estabelecido com os socialistas e uma prova de pública aposta num governo pelo qual também serão chamados a responder, independentemente do que se vier a passar daqui para a frente. De resto, provas de uma real cooperação entre a esquerda parlamentar estão a ser dadas todos os dias em rituais que, pelo menos para já, procuram estabelecer canais de diálogo permanente para evitar conflitos e acertar estratégias. Remeter para a comissão da especialidade a discussão de diplomas sobre os quais ainda não há entendimento, como o ritmo da devolução de salários e pensões ou a reversão das subconcessões nos transportes, revela um mundo de dificuldades entre as partes, mas sinaliza também o sentido de urgência de um processo negocial que todos reconhecem ser decisivo neste contexto. Mas a maior prova de que todos os protagonistas estão empenhados neste “casamento” foi conhecida há dois dias, quando se soube que PS, PCP, Bloco e Verdes vão passar a reunir-se às terças-feiras, na Assembleia da República, para concertar posições. Ninguém acreditaria nesta possibilidade há duas ou três semanas, frescas que persistem na memória as peripécias à volta das negociações entre os partidos de esquerda. As picardias entre bloquistas e comunistas, a impossibilidade de uma reunião conjunta, a assinatura dos acordos à porta fechada, enfim, tudo isto contribuiu para as contas de quem encara o Governo recém-empossado como uma solução a prazo, talvez incapaz de resistir a um segundo orçamento. Mas quem tem presente o conturbado processo histórico de encontros e desencontros entre PSD e CDS nos últimos 20 anos percebe a dimensão deste passo agora dado por uma esquerda desavinda há quatro décadas, mas que concordou agora em sentar-se todas as semanas à mesma mesa para negociar, ou seja, para se entender. Paradoxalmente, foi a violência da reacção da direita e o comportamento menos arbitral e mais alinhado do Presidente da República que cozinharam o caldo de cultura necessário para consolidar este entendimento à esquerda. Esta percebeu que três “acordos” inorgânicos, demasiado particulares, mas excessivamente vagos, não chegam para legitimar uma solução, nem dar solidez e estabilidade a um governo. E muito menos para enfrentar Passos e Portas, agora instalados nas bancadas de S. Bento. Por isso decidiu ir em peso à Ajuda marcar território.

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A cerimónia de tomada de posse do XXI Governo foi a mais representativa desde há dezenas de anos. Nenhum dos partidos com assento parlamentar faltou, mesmo o Bloco de Esquerda e os Verdes que nunca participaram, ou o PCP, que há muito deixara de se fazer representar nestes actos protocolares. Depois das evidentes dificuldades na negociação dos acordos entre o PS e os partidos à sua esquerda, é óbvio que a presença de importantes dirigentes destas forças políticas no Palácio da Ajuda tem um simbolismo que vai muito para além da mera presença física. É como se este fosse também um acto de renovado empenho no compromisso estabelecido com os socialistas e uma prova de pública aposta num governo pelo qual também serão chamados a responder, independentemente do que se vier a passar daqui para a frente. De resto, provas de uma real cooperação entre a esquerda parlamentar estão a ser dadas todos os dias em rituais que, pelo menos para já, procuram estabelecer canais de diálogo permanente para evitar conflitos e acertar estratégias. Remeter para a comissão da especialidade a discussão de diplomas sobre os quais ainda não há entendimento, como o ritmo da devolução de salários e pensões ou a reversão das subconcessões nos transportes, revela um mundo de dificuldades entre as partes, mas sinaliza também o sentido de urgência de um processo negocial que todos reconhecem ser decisivo neste contexto. Mas a maior prova de que todos os protagonistas estão empenhados neste “casamento” foi conhecida há dois dias, quando se soube que PS, PCP, Bloco e Verdes vão passar a reunir-se às terças-feiras, na Assembleia da República, para concertar posições. Ninguém acreditaria nesta possibilidade há duas ou três semanas, frescas que persistem na memória as peripécias à volta das negociações entre os partidos de esquerda. As picardias entre bloquistas e comunistas, a impossibilidade de uma reunião conjunta, a assinatura dos acordos à porta fechada, enfim, tudo isto contribuiu para as contas de quem encara o Governo recém-empossado como uma solução a prazo, talvez incapaz de resistir a um segundo orçamento. Mas quem tem presente o conturbado processo histórico de encontros e desencontros entre PSD e CDS nos últimos 20 anos percebe a dimensão deste passo agora dado por uma esquerda desavinda há quatro décadas, mas que concordou agora em sentar-se todas as semanas à mesma mesa para negociar, ou seja, para se entender. Paradoxalmente, foi a violência da reacção da direita e o comportamento menos arbitral e mais alinhado do Presidente da República que cozinharam o caldo de cultura necessário para consolidar este entendimento à esquerda. Esta percebeu que três “acordos” inorgânicos, demasiado particulares, mas excessivamente vagos, não chegam para legitimar uma solução, nem dar solidez e estabilidade a um governo. E muito menos para enfrentar Passos e Portas, agora instalados nas bancadas de S. Bento. Por isso decidiu ir em peso à Ajuda marcar território.