Vídeo "arrepiante" mostra polícia dos EUA a matar jovem negro
Protesto em Chicago após ter sido divulgado um vídeo da morte de um jovem negro. O polícia, branco, disparou 16 vezes e vai ser acusado de homicídio.
Na terça-feira, Jason van Dyke tornou-se o primeiro polícia de Chicago em 34 anos a ser acusado de homicídio no exercício de funções. A prova determinante contra si foi um vídeo gravado por um carro da própria polícia — um documento “gráfico, violento e arrepiante”, disse a juíza Anita Alvarez.
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Na terça-feira, Jason van Dyke tornou-se o primeiro polícia de Chicago em 34 anos a ser acusado de homicídio no exercício de funções. A prova determinante contra si foi um vídeo gravado por um carro da própria polícia — um documento “gráfico, violento e arrepiante”, disse a juíza Anita Alvarez.
“Este vídeo vai partir o coração às pessoas de Chicago”, disse a juíza que decidiu que Van Dyke não teria direito a fiança e vai esperar julgamento na prisão. “Desculpe lá, mas vou mandá-lo deter sem fiança.”
Van Dyke, que a imprensa de Chicago diz ser um “polícia veterano” de 37 anos, não reagiu. Ouviu a juíza sem demonstrar emoções — descreve o Chicago Tribune — e da mesma forma foi levado para fora da sala.
Depois da audiência, as autoridades municipais divulgaram o vídeo e, como se esperava, centenas de pessoas saíram à rua em protesto. Disseram palavras de ordem contra a polícia — e contra este polícia em particular, um homem branco que matou um adolescente negro de 17 anos. “Dezasseis tiros”, gritaram os manifestantes, porque foram 16 as balas que Van Dyke disparou contra Laquan McDonald, no dia 20 de Outubro de 2014.
A existência do vídeo deitou por terra a tese da polícia de Chicago de que Laquan McDonald foi morto em legítima defesa; Jason van Dyke, segundo a explicação oficial, disparou por temer pela vida. Todo o relato oficial dos acontecimentos que consta da versão oficial da polícia, provou-se com as imagens, não corresponde à realidade.
O que se vê é o adolescente a correr, no meio de uma rua. Há carros da polícia no local e chegam mais dois, um deles o que tem a câmara ligada e filma tudo. Um polícia dispara um primeiro tiro e McDonald cai; mais um tiro, contorce-se. Só um polícia dispara, até um colega se aproximar e o mandar parar (parece levar a sua mão à arma de Van Dyke, baixando-a), dizem os jornais Chicago Tribune e Chicago Sun-Times, que viram a sequência completa das imagens.
Feitas as contas, e pelo que se vê no vídeo, explicou a juíza, Van Dyke esteve no local menos de 30 segundos antes de começar a disparar e disparou o primeiro tiro seis segundos depois de ter saído do seu carro-patrulha; 14 segundos passaram entre o primeiro e o último disparo.
O processo contra Jason van Dyke, divulgado pelos media, diz que os polícias foram chamados a uma rua de Chicago onde um cidadão tinha “preso” um rapaz que estava a destruir camiões e a roubar rádios num parque de estacionamento. O documento que relata em pormenor a sequência dos acontecimentos, incluindo as comunicações entre as patrulhas e a central, diz que um dos polícias que acorreram ao local disparou “sem justificação legal e com a intenção de matar ou de causar grandes danos físicos”.
Por causa do vídeo, foi aberta uma investigação exaustiva. Por causa da investigação, o vídeo demorou um ano a ser divulgado.
No dia 19 de Novembro, um juiz decidiu que as autoridades municipais teriam até ao dia 25 de Novembro para divulgar o vídeo, que o presidente da câmara, Rahm Emanuel, se recusava a mostrar enquanto durasse a investigação. As imagens, defendeu Emanuel, são uma prova e, como outras provas, não deveriam ser do conhecimento público, mas sim permanecerem ocultas (uma forma de segredo de justiça). O juiz que avaliou o caso não lhe deu razão: a investigação, considerou, está a ser conduzida pela polícia federal, não pela polícia de Chicago, pelo que as regras estaduais sobre o que deve ficar em segredo de justiça não se aplicam ao vídeo da polícia estadual.
Esperava-se que o município recorresse da decisão do juiz, mas Emanuel não o fez. “Vamos divulgar o vídeo no dia 25 de Novembro”, disse, admitindo pela primeira vez que a morte do adolescente poderia ser crime. “Parece que um agente violou a confiança [pública] a todos os níveis.” Também disse esperar que os dias que sobraram até 25 de Novembro fossem suficientes para a investigação estar concluída e Van Dyke ir a tribunal saber se seria ou não acusado.
A sequência de acontecimentos indica que as decisões foram tomadas de forma a minimizar possíveis perigos — o da violência rebentar nas ruas, em primeiro lugar.
Na terça-feira Van Dyke foi acusado de homicídio e, logo de seguida, Emanuel deu uma conferência de imprensa para apresentar as imagens (o vídeo divulgado não tem som) e para apelar à população para ue mantivesse a calma. Ao seu lado estava o chefe da polícia, Garry McCarthy, que disse: “Um polícia tirou uma jovem vida e vai prestar contas pelos seus actos. As pessoas têm o direito de estar zangadas, têm o direito de protestar. Sabíamos que este dia estava para chegar e estamos preparados. Estamos preparados para protestos, mas não para destruição, para violência”, disse o chefe da polícia.
A família de Laquan McDonald também emitiu um comunicado a apelar à calma: “Ninguém percebe a raiva melhor do que nós, mas, se optarem por intervir, pedimos que o façam de forma pacífica. Não sejam violentos em nome de Laquan.”
“Ver um jovem de 17 anos morrer desta forma tão violenta é muito perturbador”, disse a juíza, que explicou que testemunhas ouvidas na investigação disseram que o adolescente não ameaçou os polícias ou fez qualquer gesto em direcção a eles. Apenas estava “errático” — no vídeo parece não conseguir equilibrar-se — e a autópsia revelou que tomara drogas.
O advogado que defende Van Dyke disse aos jornalistas que está confiante para o julgamento — ainda não marcado —, pois “ao contrário do que se ouviu no tribunal este não é um caso de homicídio”. Se for condenado, o polícia de Chicago pode ter uma sentença entre 20 anos de prisão e perpétua.
O advogado protestou por não haver fiança. A mulher do polícia de Chicago ficou chocada com a decisão judicial — tinha lançado uma campanha para a angariação rápida de dinheiro para pagar depressa a fiança e ter o marido para casa esta quinta-feira, a celebrar o Thanksgiving (o principal feriado dos EUA, aquele em que as famílias se juntam); em menos de uma semana conseguiu dez mil dólares (9400 euros).