Quem são os novos ministros?
António Costa desenhou um Governo com 17 ministros, quatro dos quais mulheres. Eis os perfis.
Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
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Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
O ministro que quer continuar o legado de Mariano Gago
Aos 57 anos, o investigador Manuel Heitor torna-se ministro da Ciência e do Ensino Superior – pasta que conheceu bem como secretário de Estado durante seis anos, entre 2005 e 2011, período em que José Mariano Gago foi o ministro responsável por essas duas áreas nos governos socialistas de José Sócrates.
Professor catedrático, Manuel Heitor era até agora director do Centro de Estudos em Inovação, Tecnologia e Políticas de Desenvolvimento (do Instituto Superior Técnico de Lisboa, ou IST), que fundou em 1998. Foi no IST que se licenciou em engenharia mecânica, em 1981. Quatro anos depois, doutorou-se no Imperial College, em Londres, também em engenharia mecânica, a que se seguiu um pós-doutoramento na Universidade da Califórnia em San Diego, em 1986.
Depois da formação e estadia no estrangeiro, desenvolveu a sua carreira académica e de investigação no IST, na área de mecânica de fluidos e combustão experimental. A partir do início da década de 1990 dedicou-se também ao estudo de políticas de ciência, tecnologia e inovação, incluindo políticas e gestão do ensino superior.
Foi pela primeira vez para um governo com o antigo ministro Mariano Gago, como secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Mariano Gago, que morreu em Abril deste ano, já antes disso tinha sido ministro da Ciência, entre 1995 a 2002, nos governos de António Guterres, e foi quem em Portugal deu peso político à investigação científica. Para pôr a ciência na agenda política, Mariano Gago escreveu o livro Manifesto para a Ciência em Portugal, apresentado há 25 anos, em 1990, e que era um programa de governo para esta área.
É a partir deste legado que, ao longo deste ano, Manuel Heitor tem estado envolvido na organização de várias homenagens a Mariano Gago e no lançamento de um novo manifesto para a ciência como um desígnio nacional (“O conhecimento como futuro – Uma nova agenda política para a ciência, a tecnologia e o ensino superior em Portugal”), no qual se defende o aumento do dinheiro do Estado para a investigação.
“Passados 25 anos sobre o Manifesto para a Ciência em Portugal é imperativo reafirmar que a ciência é necessária, para todos; apostando nas pessoas, na sua formação exigente e motivada, prosseguindo o sucesso do desenvolvimento científico e tecnológico; urge, em suma, reclamar a ideia forte de que Portugal é país de ciência (…)”, escreveu num artigo de opinião em Maio no PÚBLICO, em co-autoria com Maria Fernanda Rollo, da Universidade Nova de Lisboa. “Investir na ciência é, como há 25 anos, investir no futuro de Portugal.”
Agora que está à frente da pasta da Ciência, Manuel Heitor vai decidir se vai desfazer muitas das políticas científicas dos últimos quatro anos do Governo Pedro Passos Coelho – a começar pela avaliação muito polémica que a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) fez aos centros de investigação do país (o programa eleitoral do PS prometia um novo processo de avaliação) e a acabar nos cortes nas bolsas de doutoramento e pós-doutoramento. Teresa Firmino
Ministro da Economia
Manuel Caldeira Cabral, um independente próximo do PS
É um regresso a casa. Manuel Caldeira Cabral volta ao Ministério da Economia, já não como assessor, mas agora na qualidade de ministro, aos 47 anos.
Professor na Universidade do Minho, o economista esteve no grupo de peritos que elaboraram o cenário macroeconómico do PS antes das eleições. Mas a sua ligação ao PS é anterior a isso. Não só trabalhou com Manuel Pinho e de Fernando Teixeira dos Santos entre 2009 e 2011, como fez parte do grupo de conselheiros económicos de António José Seguro quando este era secretário-geral do PS.
Durante o último Governo de José Sócrates, pertenceu ao Conselho para a Promoção da Internacionalização e participou no grupo de acompanhamento da estratégia 2020.
Não tem cartão de militante, mas a ligação ao PS manteve-se. Até Abril dividiu as aulas na Universidade do Minho com a elaboração do conjunto de propostas em matéria de economia e finanças que serviram de base ao programa eleitoral de Costa. E nas eleições de 4 de Outubro, foi o cabeça-de-lista, como independente, no círculo de Braga. Do grupo dos 12 economistas, Caldeira Cabral é um dos três que chegam a ministro (a par com Mário Centeno e Vieira da Silva).
No rescaldo das negociações do PS com os partidos à esquerda, apareceu a falar como putativo ministro, sublinhando recentemente à Antena 1 a convicção de que os investidores “sabem que o PS tem políticas macroeconómicas estáveis”.
Caldeira Cabral licenciou-se em 1992 em Economia na Universidade Nova de Lisboa, onde viria a fazer um mestrado em Economia Aplicada em 1996, e mais tarde concluiu o doutoramento na Universidade de Nottingham. Em 2004, precisamente o ano em que se doutorou, foi para Timor-Leste dar aulas na universidade, num projecto de cooperação da Fundação das Universidades Portuguesas. E três anos depois voltaria a Timor, de novo como professor.
Antes de se dedicar à carreira académica a partir de 1993, o economista chegou a trabalhar como assessor na Associação Portuguesa de Seguradores e, antes, como jornalista. Sempre com a economia em pano de fundo: escreveu no Diário Económico e no Semanário Económico.
No currículo tem vários projectos de investigação sobre comércio internacional e exportações. Um trabalho recente, elaborado com outros colegas da Universidade do Minho, centrou-se no tema Internacionalização do Sector da Saúde Nacional nos Mercados de Angola, Brasil, EUA e Alemanha. Pedro Crisóstomo
Ministra do Mar
Ana Paula Vitorino, dos Transportes para o Mar
Já desde a anterior liderança socialista de António José Seguro que esta deputada navegava pelos assuntos do Mar. Foi uma das pessoas que prepararam as matérias relacionadas com o tema no documento programático que Seguro apresentou antes das eleições europeias. E teve de partilhar essas competências quando António Costa assumiu a liderança do PS.
A sua relação com as questões marítimas já vem de trás. Com a sua passagem pela secretaria de Estado dos Transportes teve de tratar de temas paralelos. Essa tutela fez sentido para quem é licenciada em Engenharia Civil, com um mestrado em Transportes. Mas que foi interrompida quando entrou em conflito com o seu ministro, Mário Lino. Foi directora de uma revista sobre o Mar, denominada Cluster do Mar. Mas nestes primeiros meses terá de convencer os peritos do sector, que ainda a encaram como uma nomeação suportada mais pela confiança política do futuro primeiro-ministro do que pela sua competência nesta área. Nuno Sá Lourenço
Ministro adjunto
Eduardo Cabrita, braço político de Costa
A nomeação de Eduardo Cabrita para ministro adjunto resulta muito da proximidade e confiança que tem com o líder do PS. Foi colega de António Costa na universidade e seu secretário de Estado adjunto de quando o futuro chefe de Governo tutelou a Justiça no último Governo de António Guterres.
Depois disso, esteve ainda no Governo de José Sócrates, como secretário de Estado adjunto, com a tutela da Administração Local. A sua escolha para um ministério sem pasta resulta da intenção de Costa poder contar com Cabrita para a gestão das questões políticas no quotidiano do Governo.
As últimas vezes que o cargo surgiu num organigrama governativo foi com Santana Lopes, que nomeou Rui Gomes da Silva para o cargo e Durão Barroso, que escolheu José Luís Arnaut para o posto. Com António Guterres, o cargo pertenceu primeiro a José Sócrates e depois a António José Seguro. Nuno Sá Lourenço
Ministro da Defesa
José Azeredo Lopes, da comunicação para a Defesa
O seu cargo mais mediático foi o de presidente da ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social, entre 2006 e 2011, precisamente durante governos socialistas, porém, é na área do Direito que José Azeredo Lopes tem feito toda a sua carreira académica. Actualmente é chefe de gabinete do presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, de quem foi também o mandatário da candidatura, em 2013 – e fora um dos primeiros subscritores do movimento Dar o Porto ao Manifesto que incentivaram Moreira a avançar para a autarquia. É comentador televisivo e em jornais e gosta de se apresentar como boavisteiro.
Licenciou-se em 1984 na Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto, onde se mantém como professor desde então em disciplinas de direito internacional, primeiro como assistente, depois professor auxiliar, agora associado. Tem leccionado sobretudo nas áreas do direito internacional público e criminal. Foi ali que se doutorou em Ciências Jurídico-Políticas com a tese Entre Solidão e Intervencionismo. Direito de Autodeterminação dos Povos e Reacções de Estados Terceiros, em 2002.
Do seu currículo consta uma longa lista de artigos e participações em júris de mestrados e doutoramentos essencialmente com temas jurídicos – mais em questões de diplomacia mas poucas relacionadas com a Defesa. Diplomado no Institut Européen des Hautes Études Internationales (Nice) em 1985, no início da década de 90 foi auditor da International Law Academy, em Haia, tendo participado em diversos grupos de trabalho e missões internacionais – foi relator das missões dos observadores internacionais da consulta popular em Timor-Leste e do sector judicial do Banco Mundial a Timor, ambas em 1999.
A sua ligação aos media começou em 2002, quando foi convidado para integrar o grupo de trabalho sobre o serviço público de televisão, criado por Nuno Morais Sarmento (PSD), coordenado por Helena Vaz da Silva. Em representação do mesmo ministro negociou em 2003 um acordo de auto-regulação entre as televisões e acompanhou a sua execução até ao final de 2005. Maria Lopes
Ministro dos Negócios Estrangeiros
Augusto Santos Silva: um europeísta, polémico, vai chefiar a diplomacia
Filho de enfermeiros, começou a sua vida política como animador cultural da Comissão de Moradores da Ramada Alta, no Porto. Aos 58 anos, é um dos mais experientes ministros deste Governo. Foi secretário de Estado da Administração Educativa (1999-2000), ministro da Educação (de 2000/2001), ministro da Cultura (2001/2002), dos Assuntos Parlamentares (2005/2009) e da Defesa (2009/2011). Integrou o “núcleo político” dos Executivos de José Sócrates.
É adepto do Salgueiros, professor universitário (da Faculdade de Economia da Universidade do Porto), especialista em sociologia da cultura contemporânea, foi cronista do PÚBLICO e comentador da TVI, de onde saiu agastado com a forma como a estação o tratou.
As suas críticas são, em regra, duras. Gosta de polémicas. Em 2010 escreveu um livro chamado Os Valores da Esquerda Democrática, em que afirmava que o diálogo do PS com a sua esquerda não deveria ser “preferencial”. A sério? “Sim [risos]. Espero boa polémica a esse propósito...”, respondeu, divertido.
Agora que vai chefiar a política externa, aqui fica um sinal do que pensava, em plena crise do Euro: “Portugal não pode fazer outra coisa que não seja o consenso na Europa e na zona euro. Nós queremos Europa, queremos o euro, faremos o que for necessário. Com a simplicidade e a clareza que as linhas políticas devem ter.” Paulo Pena
Ministro do Planeamento e Infra-estruturas
Pedro Marques, um economista com experiência na Segurança Social
Da Segurança Social para as Infra-estruturas e Planeamento. As reformas da segurança social que ajudou a implementar na altura do primeiro governo de José Sócrates, quando foi secretário de Estado de Vieira da Silva, é talvez o aspecto mais relevante do currículo do economista que vai tomar posse como ministro do Planeamento e Infra-Estruturas do governo liderado por António Costa.
Com 39 anos de idade, esteve nos dois governos de José Sócrates, e também foi eleito deputado nas eleições de 2011, pelo distrito de Portalegre.
Em Outubro do ano passado, e numa altura em que era vice-presidente da bancada socialista e responsável pelas áreas de orçamento e finanças, renunciou ao cargo por razões “profissionais”, e para se dedicar à actividade privada na área da consultoria. Pedro Marques fez então saber que suspendeu a sua intenção de se afastar da actividade política activa, que lhe havia surgido mais cedo, apenas para colaborar com o esforço de vitória de António Costa, quando este desafiou Antonio José Seguro para eleições primárias no partido. Luísa Pinto
Ministra da Administração Interna
Constança Urbano de Sousa, uma especialista em segurança e emigração
Constança Urbano de Sousa é uma aposta pessoal de António Costa, com quem este trabalhou quando foi ministro da Administração Interna, entre 2005 e 2007.
Nas últimas legislativas, Constança Urbano de Sousa foi eleita deputada pelo círculo do Porto já com o objectivo de integrar o Governo no caso de António Costa ser primeiro-ministro.
Num momento em que a Europa vive problemas como o terrorismo e os refugiados, António Costa aposta numa especialista em assuntos de justiça, segurança, asilo e emigração. Constança Urbano de Sousa é professora na Universidade Autónoma e foi conselheira e coordenadora da Unidade Justiça e Assuntos Internos da Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia.
Durante a presidência portuguesa da UE, presidiu ao Comité Estratégico Imigração, Fronteiras e Asilo (CEIFA) da União Europeia. São José Almeida
Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa
Maria Manuel Leitão Marques, a catedrática que criou o Simplex, chega a ministra
Toca piano e é especialista em Direito Económico. Doutorada, com agregação, e catedrática da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Maria Manuel Leitão Marques tem 63 anos e é conhecida por ter sido a criadora do Simplex, o ambicioso plano de modernização administrativa, cuja unidade de missão coordenou, quando António Costa era ministro de Estado, em 2005. Chegaria a secretária de Estado da pasta.
Nasceu em Quelimane, Moçambique, mas aos 17 dias de idade já estava a caminho da metrópole. Gosta de viajar. Já subiu, de barco, todos os rios portugueses navegáveis. Já teve um blogue (Causa Nossa), alimentado agora pelo marido, Vital Moreira. A burocracia, diz, “ameaça a nossa competitividade internacional e o nosso bem-estar”.
De esquerda, do Benfica e da Académica, inscreveu-se no MES, logo após o 25 de Abril, e terminou aí, “sem grandes saudades”, a sua militância partidária. Agora ocupará uma das pastas mais relevantes do novo Executivo. E garante que não gosta “de falhar”. Paulo Pena
Ministra da Justiça
Francisca Van Dunem, a primeira mulher negra a chegar a ministra
Francisca Van Dunem nasceu em Luanda há 60 anos e é a primeira mulher negra a assumir um cargo de ministra em Portugal. Conhece a Justiça por dentro. Procuradora há mais de 30 anos, ocupou nos últimos oito anos um dos cargos mais importantes do Ministério Público, como procuradora-geral distrital de Lisboa, responsável pelo maior dos quatro distritos judiciais do país. Acreditando que a Justiça deve ser transparente e prestar contas, foi pioneira ao criar um site onde se reporta diariamente a actividade do Ministério Público.
Dirigiu igualmente o Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, onde antecedeu Maria José Morgado, e esteve, nos anos de 1980, na Alta Autoridade contra a Corrupção. É casada com o professor catedrático da Universidade de Lisboa, Eduardo Paz Ferreira, especialista em Direito Fiscal e Finanças Públicas, e antigo sócio do ministro socialista Sousa Franco, com quem fundou um escritório de advogados.
“É uma magistrada altamente qualificada e de uma honestidade a toda a prova”, resume Alberto Pinto Nogueira, antigo procurador-geral distrital do Porto, que trabalhou com Francisca Van Dunem na Alta Autoridade contra a Corrupção e no Conselho Superior do Ministério Público.
A violência contra os idosos e a violência doméstica são dois temas que lhe são caros. Apesar das funções de relevo que tem vindo a ocupar nos últimos anos, Van Dunem tem primado sempre pela discrição. Veio para Portugal aos 18 anos, para tirar o curso de Direito.
No ano passado concorreu aos lugares existentes no Supremo Tribunal de Justiça para procuradores e ficou no terceiro lugar, podendo ainda vir a ocupar um lugar de juíza conselheira se entretanto abrirem vagas.
Um dos poucos perfis sobre Francisca Van Dunem, feito pela revista Visão em 2007, dá conta de que a magistrada coordenou megaprocessos relacionados com o tráfico de armas na PSP e a corrupção na Marinha. Gosta de cozinhar, de arte — cinema incluído — e de música clássica, mas nem todos lhe apreciam a distância que mantém para com os subordinados. Foi representante de Portugal no Comité Europeu para os Problemas Criminais no Conselho da Europa.
A procuradora-geral distrital de Lisboa chegou a ser representante do governo português junto do conselho de administração do Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia no início dos anos 2000. Em 2012, em entrevista ao PÚBLICO, dizia: "No discurso político, a questão racial continua a ser tabu, manifestamente. Percebo que a abordagem não é fácil. Construiu-se a ideia de que os portugueses eram propensos à miscigenação, misturavam-se culturalmente e que, portanto, isso era um indicador de que não discriminavam racialmente. Eu digo 'não'."
Apesar de, na altura, confessar que nunca tinha sentido discriminação no local de trabalho, e que não achava que a justiça portuguesa discrimine, não tinha dúvidas quanto ao facto de existir racismo em Portugal. "Falta a abordagem franca da questão. Era importante encararmos isso como um problema que, se calhar, nem é assim tão difícil de resolver. Há uma componente educacional, mas é preciso investir nela.” Mariana Oliveira e Ana Henriques, com Joana Gorjão Henriques
Ministro do Ambiente
Matos Fernandes, um ministro com uma encomenda em particular
O nome do novo ministro do Ambiente parece ter sido escolhido a dedo para levar a cabo uma das promessas do Governo de António Costa: reverter as reformas no sector da água e dos resíduos que acabam de ser concretizadas pelo executivo de Passos Coelho.
João Pedro Matos Fernandes era, desde Janeiro de 2014, presidente das Águas do Porto, a empresa municipal responsável pelo abastecimento e saneamento na Cidade Invicta. E o Porto é um dos municípios que se têm manifestado contra a reforma do sector das águas, que resultou na fusão de 19 sistemas que gerem a água “em alta” – ou seja, da fonte até aos reservatórios municipais – em apenas cinco, para harmonizar preços entre o litoral e o interior.
Matos Fernandes, de 47 anos, é engenheiro civil e já teve uma passagem pelo Ministério do Ambiente, durante o primeiro Governo de António Guterres. Foi adjunto e depois chefe de gabinete do secretário de Estado Ricardo Magalhães, quando o ambiente estava nas mãos da ministra Elisa Ferreira, entre 1995 e 1999.
Antes disso, tinha trabalhado na Comissão de Coordenação da Região Norte, entre a conclusão da sua licenciatura em Engenharia Civil na Universidade do Porto e a de um mestrado na área das infra-estruturas de transportes, no Instituto Superior Técnico.
Não voltou a integrar os quadros do ministério no segundo Governo de Guterres, mas ainda foi nomeado, em 2000, como coordenador de uma equipa para acompanhar a colocação em prática dos planos de ordenamento da orla costeira – que, até hoje, não estão cabalmente concretizados.
Nessa altura, já estava no sector privado, na Quaternaire Portugal, uma consultora para projectos de desenvolvimento local e regional, da qual foi administrador até 2005.
Voltou aos cargos públicos um mês depois do regresso do PS ao Governo, com José Sócrates, depois dos curtos governos de Durão Barroso e Santana Lopes (PSD). Assumiu, em Abril de 2005, a posição de vogal da Administração dos Portos do Douro e Leixões (APDL). Entre 2008 e 2012 foi presidente da APDL.
Depois de uma passagem por Moçambique, foi convidado a assumir a presidência das Águas do Porto em Janeiro de 2014, pelo recém-empossado presidente da câmara municipal, o independente Rui Moreira.
Além do dossier do sector das águas, o novo ministro do Ambiente terá também de desfazer outra das medidas emblemáticas do seu antecessor, Jorge Moreira da Silva: a privatização da Empresa Geral de Fomento, o braço da administração central na área do tratamento do lixo.
A reversão da privatização e das fusões na água são duas das medidas que estão nos acordos que o PS fez com os demais partidos de esquerda. Ricardo Garcia
Ministro da Educação
Tiago Brandão Rodrigues, o ministro que estudou o cancro
Quando o secretário-geral do PS, António Costa, o convidou para integrar as listas por Viana do Castelo às eleições legislativas de 4 de Outubro, Tiago Brandão Rodrigues pensou em dizer que não. Foi esse “o primeiro impulso”, confessou ao PÚBLICO em entrevista neste Verão. Aos 38 anos — e apesar de nunca ter sido militante em nenhum partido —, o cientista doutorado em Bioquímica pela Universidade de Coimbra é o novo ministro da Educação do Governo liderado por António Costa.
Nasceu em Paredes de Coura e sempre se considerou “um homem de esquerda”. Madrid, Dallas e Cambridge são cidades que conhece bem: viveu, estudou e trabalhou em todas elas — 15 dos últimos 16 anos foram passados no estrangeiro. Para concorrer como cabeça de lista do PS pelo distrito de onde é natural, Tiago Brandão Rodrigues deixou para trás um lugar de investigador na Universidade de Cambridge, em Inglaterra. Há cinco anos que se dedicava a estudar, no laboratório Cancer Research UK, técnicas de detecção precoce do cancro. No fim de 2013, apresentou na revista Nature Medicine uma técnica de ressonância magnética que provou conseguir detectar mais cedo e com maior precisão esta doença. Saltou para os noticiários, foi capa de revista, deu muitas entrevistas sobre a investigação que o apaixona, ganhou visibilidade e reconhecimento nacional.
Vê na escola pública e na educação para todos dois “dos pilares-mores da democracia”, sem esquecer a ciência, pasta para outro ministro. Em campanha pelo Alto Minho, Brandão Rodrigues notou “alguma resignação” por parte das pessoas. Acreditava, contudo, que o PS conseguiria “criar as condições para construir melhor”. “Não temos que baixar as expectativas de ter um Estado que as assista, um Serviço Nacional de Saúde com esperança e uma escola que as eduque”, sublinhou.
A um mês das legislativas, garantiu estar preparado para fazer parte de um meio “aparentemente não tão consensual”. Acredita que a cultura científica pode ter um contributo importante na política, “que não é um quadrado fechado”. Ana Maria Henriques
Ministro das Finanças
Mário Centeno, de “ministro-sombra” a ministro das Finanças
Era um quase-desconhecido até António Costa o ir buscar para coordenar o cenário macroeconómico que serviu de base ao programa eleitoral do PS, mas rapidamente se tornou num “ministro-sombra” das Finanças. Em pouco tempo já era dado como muito provável num elenco governativo socialista. O papel que Mário Centeno assumiu nos últimos meses, em particular nas negociações do PS com os partidos à esquerda, colou-lhe ainda mais essa figura à pele. Centeno, doutorado em Economia pela Universidade de Harvard (EUA), fez carreira no Banco de Portugal. Entre 2004 e 2013 foi director adjunto do Departamento de Estudos Económicos, até Carlos Costa o indicar como conselheiro especial da administração depois de o economista tentar, sem sucesso, chegar à liderança daquele importante departamento.
Centeno, especialista na área do trabalho, professor no ISEG (Lisboa) e na Universidade Nova, fez parte, em 2006-2007, da Comissão do Livro Branco das Relações Laborais. Quando o seu nome surgiu como coordenador da equipa dos “12 apóstolos” do programa económico do PS, foi de imediato cunhado como “liberal”, um “rótulo” em que Mário Centeno não se revê. “Culturalmente, sou de esquerda”, comentava o economista à Visão há poucas semanas, já eleito deputado independente pelo PS.
Numa série de conversas publicadas pelo PÚBLICO em 2011 — as Entrevistas sobre o futuro —, Centeno foi um dos protagonistas. A reforma do mercado de trabalho era o tema incontornável, num ano que viria a ficar marcado pela chegada da troika e o início de uma série de alterações na legislação laboral. A ideia-chave: “A lei [do trabalho] protege, mas as pessoas não se sentem protegidas.”
As entrevistas que deu nos últimos meses não foram isentas de polémica. Ao Financial Times — que no desfecho das negociações do PS com o Bloco de Esquerda, PCP e Os Verdes já o apresentava como o mais do que provável ministro das Finanças —, o economista tentava tranquilizar as dúvidas sobre o cumprimento das metas orçamentais e motivaria mesmo uma alfinetada do Bloco de Esquerda, por dizer que “ninguém com bom senso pensará em não pagar as dívidas que contraiu”.
“Vamos continuar a reduzir o défice e a dívida, mas a um ritmo mais lento”, assegurava ao jornal britânico, no mesmo dia em que no Parlamento afirmara: “[O PS] assume as suas responsabilidades europeias e honrará todos os compromissos do país.”
Quando voltar a falar no Parlamento, tudo o que ali disser, mesmo que nos próximos dias antes de ser empossado, já terá por baixo a responsabilidade explícita da assinatura de ministro. Pedro Crisóstomo
Ministro da Cultura
João Soares, a surpresa
O nome de João Soares para ministro da Cultura foi uma surpresa. Depois da morte recente de Paulo Cunha e Silva, vereador da Cultura do Porto, ter afastado aquela que era apontada como a solução mais evidente para a pasta, António Costa faz regressar este socialista de 66 anos a um passado longínquo. No currículo do filho de Mário Soares e de Maria Barroso na área da gestão da cultura destaca-se, entre 1990 e 1995, a vereação desse pelouro na Câmara de Lisboa, que depois veio a presidir (1995-2002). Como vereador, deve-se a João Soares a criação da Videoteca de Lisboa, em 1991, da Casa Fernando Pessoa, em 1993, ou a abertura ao público do Arquivo Fotográfico Municipal em 1994. Foi durante o período em que foi vereador que se deu Lisboa Capital Europeia da Cultura em 1994, na altura presidida por Vítor Constâncio, numa sociedade de capitais públicos que juntava a autarquia e a Secretaria de Estado da Cultura.
“Não percebo” foi a primeira reacção que o PÚBLICO ouviu quando começou a testar esta escolha de António Costa junto dos meios culturais. Mas também houve quem observasse que a aposta não era assim tão surpreendente: um gestor cultural de Lisboa reconheceu que a expectativa das pessoas da área é que “dentro do padrão que conhecem, seja nomeado um agente cultural”, mas notou que isso não tem resultado nas últimas experiências, quer as da coligação de direita, quer as do PS. “O que é importante é que seja alguém com peso no Governo e no partido”, acrescenta, lembrando que João Soares – ex-candidato a líder do partido e ex-presidente da Câmara de Lisboa – é, além do mais, “uma pessoa combativa”.
De facto, João Soares foi o primeiro dos apoiantes de António José Seguro que saiu em defesa do actual líder do PS, quando se começava a desenhar o acordo à esquerda. Foi Costa, aliás, que o repescou para as listas do PS. Uma leitura possível é também a de que Soares não chegou ao Ministério da Defesa porque o futuro primeiro-ministro deu prioridade à pasta da Cultura, onde precisava de um peso pesado para substituir a malograda hipótese de Cunha e Silva. E João Soares terá sido a solução.
A par do seu trajecto no PS, João Soares nunca escondeu a sua ligação à Maçonaria, à qual aderiu em 1974, e que vê como um corolário natural da "tradição republicana e laica" em que se enquadra. Di-lo numa entrevista de 1999 ao Expresso, acrescentando que é "muito pouco assíduo" e que não aprecia os rituais maçónicos.
Mas é com a profissão de editor que aparece registado na página do grupo parlamentar do PS. Foi no final de 1975 que João Soares lançou, com Victor Cunha Rego, a editora Perspectivas & Realidades, da qual ainda hoje é proprietário, e que inaugurou a sua actividade com a publicação de O Triunfo dos Porcos, de George Orwell, uma sátira à União Soviética de Estaline. I.S./L.C./L.M.Q.
Ministro da Saúde
Adalberto Campos Fernandes, um médico com fama de gestor
Médico, gestor e coordenador do programa político do PS para a área da saúde, o nome de Adalberto Campos Fernandes para a pasta da Saúde não surge como uma novidade, já que fez toda a campanha ao lado de António Costa e manifestou disponibilidade para eventualmente vir a ser ministro.
Licenciado em Medicina e especialista em Saúde Pública, o também professor da Escola Nacional de Saúde Pública foi presidente do Centro Hospitalar Lisboa Norte (Hospital de Santa Maria e Hospital Pulido Valente) e esteve também à frente do Hospital de Cascais. De momento, liderava a comissão executiva do SAMS — Prestação Integrada de Cuidados de Saúde, o sistema de saúde dos bancários. Pelas instituições em que passou, ficou conhecido por conseguir equilibrar as contas. Trabalhou também no Millennium BCP, na área de seguros de saúde.
Além da licenciatura em Medicina, Campos Fernandes fez várias formações posteriores, sobretudo na área da gestão, nomeadamente na Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Universidade Nova de Lisboa e na Universidade Católica Portuguesa. Completou também o Programa de Alta Direcção de Unidades de Saúde da Escola de Direcção e Negócios da AESE. Na ENSP, leccionava cadeiras relacionadas com Administração Hospitalar, Gestão em Saúde e Políticas de Saúde.
Menos de uma semana antes de integrar o Governo de António Costa, o agora ministro da Saúde defendeu a sua dissertação de doutoramento em Administração da Saúde, dedicada a um tema muito actual: a relação ou combinação entre público e privado na saúde. O título da tese é A Combinação Público-Privado em Saúde: Impacto no desempenho no sistema e nos resultados em Saúde no contexto português.
Segundo descreveu o economista da Saúde Pedro Pita Barros, no seu blogue, a dissertação “reflecte a experiência profissional do autor, além de ter tido uma recolha de informação própria (questionários e entrevistas)”. “A pergunta crucial que é natural surgir é ‘deve o sector privado crescer mais?’, interessante em si mesma e também pelo que possa ter de implicações para políticas futuras no campo da saúde. A resposta não foi evasiva (como poderia ter sido), tendo o autor defendido que o sector privado deve ter as características, incluindo aqui a dimensão, que melhor sirva o serviço público”, descreveu Pita Barros.
Em Junho, Campos Fernandes, numa sessão de apresentação dos programas sectoriais dos partidos, garantiu que, caso o PS viesse a formar Governo, daria prioridade, na área da saúde, ao tema das doenças crónicas, do envelhecimento e da inovação. Uma das ideias passava por transformar a Linha Saúde 24 numa espécie de “centro de contacto” do SNS, através do qual os cidadãos conseguissem facilmente garantir o acesso a consultas, exames complementares e cirurgias.
Campos Fernandes defendia que é também urgente rever as taxas moderadoras — ideia que acabou por ser agora incluída no programa do Governo, com os contributos do BE e PCP. Os socialistas não defendem o fim das taxas, mas Campos Fernandes adiantava, na altura, que a ideia é isentar do pagamento quem chega a um hospital referenciado pelos cuidados primários, Linha Saúde 24 ou INEM. Romana Borja-Santos
Ministro da Trabalho, Solidariedade e Segurança Social
Vieira da Silva volta à Segurança Social
José António Vieira da Silva, de 62 anos, regressa à Praça de Londres para assumir o cargo de ministro da Segurança Social e do Trabalho. O deputado já tinha ocupado a pasta no primeiro Governo de José Sócrates (2005-2009) e foi o rosto da reforma da Segurança Social de 2006, conseguida com o acordo das confederações patronais e da UGT e muito elogiada pelas instituições internacionais.
Embora o programa de Governo do PS fale na necessidade de diversificar as fontes de financiamento da Segurança Social e de discutir o assunto na concertação social, nesse domínio Vieira da Silva considera-se “conservador”. Numa entrevista ao PÚBLICO em 2014, o deputado criticava um eventual alargamento do desconto das empresas à riqueza produzida: “Não creio que seja um bom sinal dizer que paga mais a empresa que cria mais riqueza. Se cria mais riqueza, tem um papel de arrastamento na economia que vai gerar salários noutros sítios”. Mas já fazer depender a taxa social única da natureza dos contratos (a prazo, definitivos) “é uma medida justa”, mas “difícil de aplicar” num contexto de crise.
Vieira da Silva foi o ministro que, em 2006, promoveu um acordo para o aumento do salário mínimo nacional , assinado na Comissão Permanente de Concertação Social pelas quatro confederações patronais (CIP, CCP, CAP e CTP) e pelas duas centrais sindicais (UGT e CGTP). O seu mandato à frente do Ministério da Segurança Social ficou ainda marcado por alterações à legislação laboral muito criticadas pela CGTP.
É uma das figuras de destaque do PS e vai ter nas mãos vários dossiers importantes. No imediato, terá de apresentar à concertação social a proposta de aumento do salário mínimo, mas é também pelo seu ministério que passará a redução da taxa social única dos trabalhadores que ganham até 600 euros. No acordo assinado com o Bloco de Esquerda, o PS propunha-se ainda criar um grupo de trabalho para elaborar um plano nacional contra a precariedade e outro para estudar as pensões não contributivas e as medidas de combate à pobreza.
Licenciado em Economia e professor universitário, Vieira da Silva já tinha sido secretário de Estado da Segurança Social na primeira legislatura de António Guterres (1999-2001), depois secretário de Estado das Obras Públicas (2001-2002) e, mais recentemente, no último mandato de Sócrates, ministro da Economia ((2009-2011). Raquel Martins
Ministro da Agricultura
Capoulas Santos, um repetente na Agricultura
O novo ministro da Agricultura de António Costa é um repetente no cargo. Luís Manuel Capoulas Santos, de 64 anos, foi titular deste ministério entre 1998 e 2002, depois de, entre 1995 e 1998, ter assumido a Secretaria de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O actual deputado do PS, licenciado em Sociologia, tem trabalho feito no Parlamento Europeu (PE), onde esteve entre 2004 e 2014, e pelo qual recebeu o prémio de melhor deputado na área da agricultura, atribuído pela revista de actualidade política The Parliament. O seu nome está em, pelo menos, sete relatórios e recomendações do PE.
Amigo de José Sócrates, Capoulas Santos foi relator de medidas emblemáticas do sector como a proposta do PE que estabeleceu regras para os pagamentos directos aos agricultores, no âmbito da Política Agrícola Comum. Ana Rute Silva