Teerão mostra por fim a sua escondida, e muito valiosa, colecção de arte moderna
Durante quatro décadas as obras de Picasso, Rothko, Warhol ou Bacon reunidas para o Museu de Arte Contemporânea de Teerão mantiveram-se escondidas num cofre-forte. Agora surgem, por fim, nas paredes do museu, disponíveis ao olhar dos iranianos.
Nos últimos anos do regime do Xá Reza Pahlavi, a imperatriz Farah Pahlavi adquiriu mundo fora obras de Picasso, Rothko, Warhol, Pollock, Gauguin ou Bacon, criando aquela que é uma das maiores e mais valiosas colecções de arte moderna ocidental. O objectivo? Rechear o Museu de Arte Contemporânea de Teerão, que ela própria ajudara a fundar.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Nos últimos anos do regime do Xá Reza Pahlavi, a imperatriz Farah Pahlavi adquiriu mundo fora obras de Picasso, Rothko, Warhol, Pollock, Gauguin ou Bacon, criando aquela que é uma das maiores e mais valiosas colecções de arte moderna ocidental. O objectivo? Rechear o Museu de Arte Contemporânea de Teerão, que ela própria ajudara a fundar.
Com a revolução islâmica de 1979, que conduziu o Aiatola Khomeini ao poder, as obras, muitas delas consideradas blasfemas ou representativas da intoxicação da sociedade iraniana pela cultura ocidental, desceram à segurança de uma caixa-forte do museu. Desde sexta-feira, porém, estão colocadas nos locais inicialmente previstos: nas paredes do museu, disponíveis ao olhar dos iranianos. É a primeira grande exposição de arte estrangeira ali patente desde 1999.
Na inauguração, sexta-feira, o ministro iraniano da Cultura, Ali Jannati, explicou que o recente acordo com as potências ocidentais quanto ao programa nuclear do país abriu as portas para a colaboração noutros sectores – como o cultural. “Este é um primeiro passo, e esperamos que haja mais cooperação mútua para divulgar artistas iranianos notáveis, bem como para exibir mais obras da nossa colecção estrangeira de arte”, declarou à AFP.
Na exposição agora inaugurada, os iranianos poderão apreciar Suicide, acrílico de Warhol na linha da série Death and Disaster, arrematada na Sotheby’s de Nova Iorque, em 2013, por 98 milhões de dólares, Sienna Orange and Black on Dark Brown, de Mark Rothko, ou Reclining Man With Sculpture, de Francis Bacon. Estão agrupadas 42 obras da colecção estrangeira e uma mostra de 130 trabalhos da pintora, escritora, artista visual e tradutora iraniana Farideh Lashai, falecida em 2013, aos 68 anos.
A inauguração sinaliza a abertura do museu ao mundo, firmada em Outubro com um acordo assinado com o governo alemão para a cedência de 30 obras ocidentais e 30 iranianas para exposição em Berlim durante três meses, no que constitui a primeira internacionalização do Museu de Arte Contemporânea de Teerão.
Num extenso artigo publicado pela Bloomberg, o jornalista Peter Waldman, que visitou o museu e a caixa-forte, descreve os jardins por onde passeiam estudantes de fotografia que utilizam como alvo das suas objectivas as esculturas de Max Ernst, Giacometti ou Magritte ali expostas, e descreve obras da colecção como Mural On Indian Red Ground, uma das maiores “drip paintings” de Jackson Pollock (2,7 metros por 2,4 metros), e também uma das mais valiosas – a Christie’s avaliou-a em 234 milhões de euros em 2010.
A sobrevivência da colecção de 1500 obras durante as últimas quatro décadas deve-se, por um lado, à resistência dos responsáveis do museu às propostas de compra que foram surgindo regularmente, mesmo aquelas que, por representarem nudez ou homossexualidade, são consideradas inaceitáveis pelo poder religioso – “Se as vendêssemos, o que compraríamos que tivesse o mesmo valor?”, questionava na reportagem da Bloomberg Majid Mollanoroozi, o director do museu. Deve-se, por outro lado, à dedicação e coragem de homens como Firouz Shabazi Moghadam.
No pico da revolução islâmica, passou dois anos praticamente fechado no museu, assegurando que a colecção se mantinha intacta. E quando abordado pelas autoridades para a cedência de algumas obras, impunha-se perante elas e recusava abrir as portas da caixa-forte, temendo que não mais voltassem ao museu. “Só Deus sabe onde fui encontrar coragem para o fazer”, confessou. “Normalmente tenho tanto medo, mas em relação a esta caixa-forte, neste museu, sou como um leão”.