Esquerda garante orçamento, direita quer que Presidente seja mais exigente com PS

Com as audições aos partidos, estará o Presidente pronto para uma decisão? PSD e CDS querem Cavaco a fiscalizar previamente o acordo da esquerda; PS, PCP, Bloco e PEV pedem urgência ao Chefe de Estado na indigitação.

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Em silêncio. Sobre prazos para decidir e sobre soluções possíveis. É como se mantém o Presidente da República depois das duas dúzias de audições que teve na última semana e meia – tanto tempo quanto o Governo PSD/CDS leva de demitido na Assembleia da República – com personalidades de variados quadrantes da sociedade portuguesa. Por parte da Presidência não há qualquer indicação sobre quando poderá Cavaco Silva falar ao país para acabar com o impasse político.

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Em silêncio. Sobre prazos para decidir e sobre soluções possíveis. É como se mantém o Presidente da República depois das duas dúzias de audições que teve na última semana e meia – tanto tempo quanto o Governo PSD/CDS leva de demitido na Assembleia da República – com personalidades de variados quadrantes da sociedade portuguesa. Por parte da Presidência não há qualquer indicação sobre quando poderá Cavaco Silva falar ao país para acabar com o impasse político.

À hora de fecho desta edição, a agenda do Chefe de Estado continuava vazia até segunda-feira, inclusive. Há sempre a possibilidade de Cavaco Silva ainda convocar o Conselho de Estado para o início da semana, algo que costuma fazer com três dias de antecedência. Este sábado há futebol, com o derby lisboeta; no domingo realiza-se um almoço de solidariedade com José Sócrates, a 1500 metros do Palácio de Belém, que promete captar a atenção pública - mas nem o desporto nem a agenda de outros políticos costumam impedir o Presidente de falar. Será no entanto previsível que, se a sua decisão passar por indigitar António Costa, o chamará a Belém antes de o anunciar ao país.

Tal como também se arrasta o braço-de-ferro entre a direita e a esquerda, com as palavras a subirem de tom. Um cenário que não se prevê que melhore, seja qual for a decisão do Presidente, tomando como exemplo as refregas dos últimos dias nos plenários da Assembleia da República. E ouvindo também Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, esta sexta-feira, em Belém: o primeiro reiterou que o PS, depois de ter tido a “irresponsabilidade” de derrubar um executivo “legítimo” na AR, não pode esperar “voltar-se para os partidos que derrubou no Parlamento pedindo-lhes ajuda no futuro”. O segundo avisou, em tom de ameaça, que o Governo de esquerda “poderá ser matematicamente viável, poderá ser formalmente constitucional; será sempre politicamente ilegítimo e o CDS extrairá daí as consequências necessárias e suficientes”.

Se o Presidente da República estivesse em pleno uso das suas competências, o PSD pedir-lhe-ia que dissolvesse o Parlamento e convocasse novas eleições legislativas, mas como a Constituição não o permite, Passos Coelho disse a Cavaco Silva que deve exigir ao PS que forme um Governo "estável" – e os socialistas têm agora “responsabilidade acrescida” de o fazer. “Cabe ao PS construir uma solução de Governo que corresponda àquilo que o próprio PS disse que era indispensável e sem o que não derrubaria o Governo que saiu das eleições: ter uma maioria estável, duradoura e credível - que ainda não tem”, afirmou Passos numa declaração sem direito a perguntas.

As dúvidas sobre a credibilidade da solução do compromisso à esquerda foram continuadas por Portas, que defendeu mesmo que o Presidente deve “verificar a sustentabilidade deste mero projecto negativo”. “Nem nos parece que o líder do PS tenha apresentado o que dizia e prometia ter, nem nos parece que os requisitos firmados pelo Presidente da República [de um projecto de Governo “estável e sólido”] tenham sido satisfeitos”, afirmou, desconfiado, o líder do CDS.

E resumiu: nos documentos subscritos pelo PS, PCP, BE e PEV “não há uma coligação, não há um acordo; são três documentos diferentes; nenhuma das partes se compromete ao mesmo; não há sequer uma assinatura conjunta”. Além disso, “não há garantias de confiança visto que nem a solidariedade em caso de moções de censura ou de confiança está plenamente garantida. Nem garantias de estabilidade visto que não há compromisso quanto ao Orçamento do Estado (OE), Programa de Estabilidade, semestre europeu e Tratado Orçamental”, a que se soma a ausência das questões sobre o enquadramento institucional na União Europeia (em especial na moeda única) e na Aliança Atlântica. “Isto não anuncia nada de bom”, rematou.

Orçamento sim, diz Costa
Passos e Portas cavalgaram a ideia de que o PS “não tem garantias de que o seu próximo Orçamento do Estado possa ser aprovado por estas forças políticas” nem de que Portugal “possa continuar a respeitar as regras europeias”. O PS e o resto da esquerda haveriam de contrariar a tese do orçamento, mas apenas depois de alguma insistência da comunicação social.

“Estamos em condições de, não só vermos aprovado, como de podermos fazer, no mais curto prazo de tempo, um orçamento”, garantiu António Costa. A porta-voz bloquista afirmou que a posição assinada entre o PS e os vários partidos à sua esquerda “tem não só condições para a aprovação de um programa de Governo, como tem compromissos económicos e financeiros para o OE, e as balizas, os compromissos de política económica e de política social que vão balizar também o acordo ao longo de toda a legislatura”.

O secretário-geral do PS afirmou que a solução encontrada pelo PS tira Portugal desta “situação de indefinição” que, a prolongar-se, levaria a uma “crise política desnecessária”. Não quis, no entanto, revelar se o Presidente lhe pediu mais garantias sobre o compromisso à esquerda, como fez há um mês. Costa realçou que o país precisa de uma “rápida solução política, com condições para um Governo de estabilidade, que seja coerente, credível, consistente, respeite os compromissos internacionais e tenha condições de, tão rapidamente quanto possível, dotar o país de um orçamento para 2016, e que possa governar com normalidade e tranquilidade”.

Costa assegurou que o programa do PS “consolidou” as matérias programáticas negociadas com o BE, PCP e PEV, resultando num “programa coerente, consistente com os nossos compromissos eleitorais, compatível com as obrigações internacionais do Estado português”. Catarina Martins aconselhou a que se olhe para a “estabilidade” e “compromissos políticos” feitos à esquerda em vez de se “continuar a discutir fantasmas que não existem”.

Apesar do discurso muito crítico há um mês para com os partidos mais à esquerda, pela recusa dos acordos financeiros europeus e os de índole internacional como os da NATO, o Presidente acabou por não pedir qualquer compromisso adicional ao PCP, admitiu Jerónimo de Sousa.

O líder do PCP, a porta-voz do Bloco, e a dirigente do PEV, Heloísa Apolónia, falaram a uma só voz com a mesma frase repetida desde há sete semanas: “Estão criadas as condições políticas e institucionais para que o Presidente dê posse ao Governo do PS, que tem condições para apresentar o seu programa na Assembleia e entrar em funções adoptando uma política com uma solução duradoura na perspectiva da legislatura.”

Bloco e PEV colocaram a tónica na urgência: a “situação de instabilidade não é justificável” e António Costa “deve ser indigitado o mais rapidamente possível para formar um novo Governo”.

André Silva, do PAN, foi pragmático: deve ser indigitado o líder do segundo partido mais votado. O PAN “não se revê na política nem de esquerda nem de centro-direita” e irá analisar o programa e o orçamento socialistas e só depois decidirá o que fazer.