Denisovanos terão vivido na Sibéria durante milénios
Novas análises genéticas confirmam que este grupo de humanos, desconhecido até há uns anos, pertence a uma espécie distinta dos neandertais e da nossa.
Os resultados publicados esta segunda-feira na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) fazem aumentar para três o número de denisovanos cujos fósseis chegaram até nós. E não só: a comparação genética daqueles três fósseis desta nova espécie humana, hoje extinta mas descoberta há apenas uns anos, leva a equipa internacional autora do trabalho a concluir que os denisovanos terão coexistido com os neandertais e com a nossa espécie durante milhares de anos.
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Os resultados publicados esta segunda-feira na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) fazem aumentar para três o número de denisovanos cujos fósseis chegaram até nós. E não só: a comparação genética daqueles três fósseis desta nova espécie humana, hoje extinta mas descoberta há apenas uns anos, leva a equipa internacional autora do trabalho a concluir que os denisovanos terão coexistido com os neandertais e com a nossa espécie durante milhares de anos.
Recorde-se que, em 2008, um pequeno osso fossilizado do dedo da mão de uma criança fora descoberto na gruta Denisova, nos montes Altai, na Sibéria. A grande surpresa chegou com as primeiras análises ao ADN extraído daquele ossinho, que mostravam que a criança pertencera a um grupo de humanos diferentes de nós e dos neandertais e que se extinguiu há uns 30 mil anos.
O que se sabe hoje sobre a linhagem dos denisovanos foi conseguido, primeiro, com base na análise do chamado “ADN mitocondrial” desse fóssil – um pequeno anel de material genético transmitido por via matrilinear –, e depois com base na sequenciação total do resto do genoma, o chamado ADN nuclear do mesmo fóssil (que constitui a esmagadora maioria do genoma).
A mesma equipa já tinha também anunciado que nós, os humanos modernos, temos nos nossos genes bocadinhos de ADN vindo não só dos neandertais, mas também dos denisovanos, respondendo assim à essencial questão de saber se o Homo sapiens se tinha ou não reproduzido com estas duas espécies. Resumindo, as suas análises têm posto em evidência uma nova teia de migrações e de relações complexas entre nós e essas duas outras duas espécies de humanos entretanto desaparecidas da face da Terra.
Em particular, as comparações genéticas mostraram que os denisovanos e os neandertais são “parentes” muito próximos e que o seu ramo se separou do ramo dos humanos modernos há uns 500.000 anos, ao passo que o ramo dos denisovanos e dos neandertais apenas divergiram um do outro há uns 300.000 anos. “Os denisovanos e os neandertais são grupos irmãos, na medida em que cada um deles é o parente mais próximo do outro”, explicou ao PÚBLICO num email Svante Pääbo, do Instituto Max Planck de Leipzig (Alemanha), que liderou o trabalho agora publicado. “Os humanos modernos são parentes mais afastados.” Quanto ao antepassado comum dos denisovanos, neandertais e Homo sapiens, terá vivido há um milhão de anos.
Voltando aos fósseis de denisovanos, diga-se que, para além do osso da mão, também fora descoberto no mesmo local, no ano 2000, um molar desses misteriosos humanos – mas cuja análise genética ainda não tinha sido realizada. Contudo, parecia óbvio que a morfologia desse molar era muito diferente da dos molares de neandertais e de Homo sapiens.
Mas a verdade é que tudo o que se sabia até aqui da linhagem genética dos denisovanos em relação a nós e aos neandertais provinha daquele ossinho da mão de uma criança com 30.000 anos. “Os denisovanos, um grupo irmão dos neandertais, têm sido descritos [até agora] com base no genoma nuclear de uma falange do dedo”, escrevem os autores na PNAS.
E o que estes cientistas apresentam agora de novo é, por um lado, uma análise genética daquele primeiro molar – cujo ADN mitocondrial, salientam, é muito semelhante ao ADN mitocondrial da falange. E por outro, a descrição morfológica e a análise do ADN – mitocondrial e nuclear – de um novo molar, entretanto descoberto na mesma gruta em 2010.
“As análises do ADN nuclear sugerem que os três espécimes (a falange e os dois molares) pertenciam ao mesmo grupo filogenético e confirmam a ideia de que este grupo [os denisovanos] era distinto dos neandertais e dos humanos modernos”, lê-se num comunicado da PNAS.
Os autores analisaram também o ADN mitocondrial dos três fósseis para tentar calcular a idade de cada um. Isto é possível porque o ADN mitocondrial, que vai sofrendo mutações espontâneas ao longo do tempo, funciona como um “relógio molecular” que permite fazer este tipo de estimativas. E embora não tenham conseguido obter a sua idade exacta, constataram que o ADN mitocondrial do segundo molar apresenta uma acumulação de mutações inferior aos outros dois fósseis (a falange e o primeiro molar encontrado). Isso significa, concluem, que esse segundo molar é significativamente mais antigo do que os outros dois espécimes, “sugerindo que os denisovanos terão estado presentes naquela região [dos montes Altai] durante vários milhares de anos”.
Os autores terminam recordando algo que também já se sabia: o ADN da falange de denisovano também contém fragmentos genéticos provenientes de uma quarta espécie de humanos – esta sim, totalmente desconhecida por enquanto. Essa misteriosa espécie, escrevem, terá divergido “há um a quatro milhões de anos da linhagem que conduziria aos neandertais, aos denisovanos e aos humanos modernos”. Estão criadas as condições para outras grandes surpresas, no futuro, acerca da evolução da espécie humana.