A vida que é túnel com a morte ao fundo
Quando a vida de alguém que te tatuou se transformar em túnel com a morte ao fundo, o céu estrelado que tanto admiras deixará de estar visível. Saberás que o sentido único da via que agora a conduz finda na morte que já não tarda; e aí conhecerás a revolta
O culto de personalidades que nos deixam ocupa ainda o espaço televisivo; diz-me pouco. Mas o pequeno pergunta pela morte; outra vez. Para onde vamos, e se quando vamos, voltamos; eu respondo-lhe que há muitas, quem sabe?
A verdade faz-nos mais fortes
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O culto de personalidades que nos deixam ocupa ainda o espaço televisivo; diz-me pouco. Mas o pequeno pergunta pela morte; outra vez. Para onde vamos, e se quando vamos, voltamos; eu respondo-lhe que há muitas, quem sabe?
Há a morte de quem a quer passagem, esperança de um bem maior que nos afague quando a âncora largarmos e à deriva nos entregarmos; nessa não creio, mas é bela demais para não ser possível, não achas?
Conheço-a também definitiva, na certeza do desaparecimento do corpo que a todos tolhe e mirra. A que nos faz viver mais o dia sem esperanças na noite; a que, porém, mais nos entristece pela assumida descontinuidade...
Talvez terceira, a cíclica que nos eterniza num vai e vem de encarnações de energia; ora em "sapiens", ora em menos "sapiens". Menos triste mas, ainda sim, não tão óptima; soa-te bem? Não deixa de ter a sua piada.
Bom, é verdade que não tas disse ainda, que procuras respostas e razões, e não hipóteses difusas; mas dir-te-las-ei, certamente. E da eloquência que encontrar para tas dizer, hás-de encontrar caminhos para as absorveres; como entenderes.
Se sempre as soube? Claro que não; não as sei ainda.
Mas se há morte nas palavras, haverá certamente memória nos corações; isto me deram tarde a saber, mas sempre a tempo. Não o sentimento, mas a forma de to dizer. E, dos escombros da verdade que assim aprendo, surge um elo mais da corrente da âncora que me agarra; um amigo.
Também eu absorvo, ainda e sempre, as nuances que me moldam a afeição; são amigos que permanecem nos sentimentos que tatuam com palavras simples. A dor de quem também sofre por não escolher qual das mortes validar; qual a verdadeira.
Sofreremos todos; outra verdade não te conseguirei garantir.
Alerta, a tua imaginação promoverá frequentemente cenários em que a âncora de alguém se solte; e sofrerás por hipótese. Mais grave, a memória pesar-te-á quando alguém realmente se dissipar na tua vida; e sofrerás de saudade. Mas a dor maior espera por ti no tempo que dista uma da outra; e aí conhecerás a revolta.
Quando a vida de alguém que te tatuou se transformar em túnel com a morte ao fundo, o céu estrelado que tu tanto admiras deixará de estar visível. Saberás que o sentido único da via que agora a conduz finda na morte que já não tarda, com hora marcada; e aí conhecerás a revolta.
Mas é nessa via apertada, feita camisa de forças, que a esperança nos encontra por clarabóias de cor; é a memória quem nos apoia, criando com sinapses o que antes foi calor, com imagens o que antes foi fulgor. É ela a certeza de a morte ser a sagração da vida, pela memória que para sempre permanecerá; que nos faz viver para trás no tempo, o tempo que para a frente não há.
Por isso não deixes de viver, e recordar, num ciclo de reforço. E se algum dia te disserem que num túnel não se pode inverter a marcha, duvida; e experimenta.
Porque, então aí, conhecerás a graça das coisas.