Um quarteirão inteiro para (mais) um hotel de charme

Projecto de hotel para o antigo Convento do Corpus Christi, em plena Baixa de Lisboa, está atrasado porque os promotores ainda não conseguiram retirar todos os inquilinos.

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Está prevista para 2018 a inauguração daquele que será um dos maiores hotéis da Baixa de Lisboa, com cerca de 140 quartos distribuídos por cinco pisos ao longo de um quarteirão inteiro encaixado entre as ruas dos Fanqueiros, São Nicolau, Douradores e Vitória. Mas os promotores ainda têm nós para desatar.

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Está prevista para 2018 a inauguração daquele que será um dos maiores hotéis da Baixa de Lisboa, com cerca de 140 quartos distribuídos por cinco pisos ao longo de um quarteirão inteiro encaixado entre as ruas dos Fanqueiros, São Nicolau, Douradores e Vitória. Mas os promotores ainda têm nós para desatar.

O Hotel Indigo Lisbon Old Town, um quatro estrelas da sub-marca da cadeia norte-americana Intercontinental, vai ocupar o antigo Convento do Corpus Christi, erigido no século XVII e reconstruído após o terramoto de 1755, mas desactivado no século XIX com a extinção das ordens religiosas. O quarteirão composto por três prédios contíguos passou a ser usado para habitação e comércio, mas nos últimos anos estava já muito degradado e quase vazio.

Em 2013, os proprietários - o Fundo de Investimento de Imobiliário Fechado Corpus Christi, gerido pela Gesfimo, criada no quadro do antigo Grupo Espírito Santo - despejaram os inquilinos que restavam, para poderem avançar com as obras (mesmo assim já com um ano de atraso em relação ao previsto).

Naquele conjunto vivia, por exemplo, o morador mais antigo da Baixa, segundo o anterior presidente da antiga junta de S. Nicolau, António Manuel, que já em 2013 criticava a “febre hoteleira”. No rés-do-chão funcionava a Adega dos Lombinhos, que faria 100 anos em 2017. Saíram todos menos dois: a loja Mundo dos Fatos, que ainda está a ocupar o número 131 da Rua dos Fanqueiros, com as montras recheadas de calças a 3,50 euros e fatos de seda empoeirados; e um espaço no rés-do-chão que a tasca Caneca de Prata (instalada na Rua da Prata, 163) utiliza como armazém desde 1910.

No primeiro caso, a arrendatária não chegou a acordo com os proprietários sobre os valores das rendas (entretanto aumentadas com a nova lei) e da indemnização, e o caso deverá estar ainda em tribunal. Já os donos da Caneca de Prata não abdicam de ter um espaço para guardar a mercadoria mas nenhum dos que foram sugeridos pelo Fundo serve para o efeito. Por isso, continuam a ocupar a loja, e a pagar 533 euros de renda, mais 500 euros do que antes da nova lei.

Apesar da degradação a que foi votado nos últimos anos, o antigo convento, que inclui uma igreja onde ficará situado o átrio do hotel, continua a ser um dos quarteirões mais singulares da Baixa, um “extraordinário misto de convento e prédio pombalino, numa interligação de funções e modos de vida que à partida ninguém descobre ao passar na Rua dos Douradores”, como descreve o olissipógrafo José Sarmento Matos, num parecer sobre a instalação do hotel.

O projecto foi aprovado pela Câmara de Lisboa em 2011 e a obra deveria estar concluída em 2014, mas ainda decorrem os trabalhos de diagnóstico arqueológico, acompanhados pela Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), que deu parecer positivo à obra com essa única condicionante, até porque o edifício é Monumento de Interesse Público desde Setembro de 2013. Segundo a DGPC, “os trabalhos previstos para 2014/2015 ainda não foram concluídos devido à presença de inquilinos em espaços que faltam intervencionar”. Fonte do gabinete de comunicação do grupo Intercontinental disse ao PÚBLICO que a inauguração está planeada para o início de 2018.

Os arqueólogos identificaram já vestígios da época romana, como tanques para preparar peixe; e vestígios da construção pré e pós-terramoto.