O rato-das-neves também vive em Portugal
É um pequeno mamífero que existe em zonas montanhosas desde o Turquemenistão até à Península Ibérica. Conhecia-se a sua existência em Espanha e só agora foi encontrado em Portugal, redefinindo assim os limites de distribuição da espécie.
O rato-das-neves, ou Chionomys nivalis, é uma nova espécie para Portugal. A presença deste ratinho especial — adaptado ao ambiente montanhoso e que só habita locais de elevada altitude — foi agora confirmada em Portugal. Uma equipa de cientistas portugueses capturou-o na Serra de Montesinho e revelou que a população portuguesa de ratos-das-neves tem características genéticas que a distingue das restantes populações da Península Ibérica.
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O rato-das-neves, ou Chionomys nivalis, é uma nova espécie para Portugal. A presença deste ratinho especial — adaptado ao ambiente montanhoso e que só habita locais de elevada altitude — foi agora confirmada em Portugal. Uma equipa de cientistas portugueses capturou-o na Serra de Montesinho e revelou que a população portuguesa de ratos-das-neves tem características genéticas que a distingue das restantes populações da Península Ibérica.
Os investigadores — do Centro de Investigação e de Tecnologias Agroambientais e Biológicas (CITAB) da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO) da Universidade do Porto — apresentaram a sua descoberta num artigo científico publicado há dias na revista Italian Journal of Zoology, no qual também atribuem a esta espécie o nome comum em português: rato-das-neves.
O Chionomys nivalis foi detectado em Portugal pela primeira vez no Verão de 2014, pelas câmaras do fotógrafo de natureza Gonçalo Rosa, como noticiou o site Wilder.
Em Lama Grande, uma das zonas mais altas da Serra de Montesinho, Gonçalo Rosa deixou as suas máquinas fotográficas preparadas com um dispositivo que dispara assim que detecta movimento e diferenças de temperatura — uma técnica usada para fotografar espécies difíceis de observar. A verificação das fotografias tiradas durante uma noite trouxe-lhe uma grande surpresa: em várias aparecia um rato com uns grandes bigodes brancos e uma grande cauda (que chega aos sete centímetros) e que não se parecia com nenhuma espécie que ele conhecia. Era pardo, com tons entre cinzento e branco, e o corpo, excluindo a cauda, teria entre dez e 12 centímetros.
A surpresa levou o fotógrafo a enviar as imagens para Hélia Vale Gonçalves e Paulo Barros, especialistas em micromamíferos do CITAB. “Tinha características muito diferentes das outras espécies que conhecemos nesta zona. Não tivemos dúvidas de que era um Chionomys nivalis”, conta ao PÚBLICO Hélia Gonçalves.
“Tem umas patas posteriores bastantes grandes, uma cauda comprida e vibrissas [bigodes] muito desenvolvidas. É um animal perfeitamente adaptado ao ambiente montanhoso”, continua a investigadora. O Chionomys nivalis vive apenas nas regiões mais elevadas das montanhas, existindo desde o Turquemenistão até à Península Ibérica, sabendo-se da sua existência desde 1842.
Também na Serra da Estrela?
Poucos meses depois da descoberta desde mamífero também em Portugal, os investigadores foram à sua procura no campo, na região onde tinha sido fotografado. “Já sabíamos que esta espécie era muito difícil de capturar”, diz ainda Hélia Gonçalves. “É muito exigente em termos de habitat. Vive apenas em zonas de rocha e mato e com coberto herbáceo.”
Das 27 armadilhas que montaram, os cientistas conseguiram capturar um macho e uma fêmea. “Depois de os fotografar, pesar, fazer várias medições e recolher amostras — de um milímetro de tecido das orelhas — para análises genéticas, libertámo-los de novo no local da captura.” Pelas características e dimensões, eram ratos-das neves.
As restantes revelações sobre este pequeno mamífero vieram das análises genéticas. Não só comprovaram que os ratos eram realmente da espécie Chionomys nivalis, como revelaram a origem da população. “São mais próximos das outras populações da Península Ibérica do que das do resto da Europa. Ainda assim, têm várias diferenças genéticas das populações de Espanha”, conta-nos Joana Paupério, especialista em genética de micromamíferos no CIBIO e co-autora do artigo científico.
Os ratos-das-neves de Montesinho pertencem por isso a uma população portuguesa. Porém, os cientistas ainda não sabem há quanto tempo é que as populações portuguesas e as espanholas se separaram. É uma pergunta a que tentarão responder no futuro, com amostras populacionais e mais estudos genéticos.
Por agora, ainda não se sabe se o rato-das-neves está presente noutros locais em Portugal, embora os investigadores pensem que também possa existir na Serra da Estrela. “Esta serra tem um habitat muito semelhante ao de Montesinho e também tem neve no Inverno”, conta Hélia Gonçalves. “Não é uma praga. E é bastante sensível a alterações do habitat. Além disso, como todos os roedores, tem um papel importante na disseminação de sementes”, refere ainda Hélia Gonçalves, citada num comunicado de imprensa da UTAD.
Ao encontrar-se o rato-das-neves em Portugal, os limites da sua distribuição geográfica aumentam assim a sudoeste. Mas, como é salientado no artigo científico, é necessária uma avaliação mais detalhada das características da população portuguesa e a determinação do seu estatuto de conservação.
Globalmente, o estatuto de conservação do rato-das-neves, de acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza, é “pouco preocupante”, o que significa que tem um risco baixo de extinção. Porém, devido à sua distribuição muito fragmentada, limitada apenas ao topo das cadeias montanhosas, e às características únicas de algumas populações, nalgumas regiões de Espanha, Itália e da Ucrânia esta espécie é considerada “vulnerável”. “As populações espanholas estão classificadas como quase ameaçadas, pelo que a descoberta da população portuguesa tem elevada relevância para a conservação deste roedor”, considera Joana Paupério.
Texto editado por Teresa Firmino