Activistas angolanos apelam ao perdão e reconciliação nacional
"Do Presidente da República ao último agente da opressão - todos eles precisam de perdão", defendem activistas, em carta aberta aos angolanos
Numa carta aberta aos angolanos, divulgada esta quarta-feira, os quinze activistas políticos detidos desde Junho e acusados de actos preparatórios para prática de rebelião e atentado contra o Presidente da República, apelam ao perdão dos “detentores do poder” e das forças do regime, e também à reconciliação nacional. “Ódio e vingança não são o caminho para o futuro de Angola (uma Angola livre, democrática e de bem- estar)”, lê-se na carta, que é endereçada a todos os compatriotas.
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Numa carta aberta aos angolanos, divulgada esta quarta-feira, os quinze activistas políticos detidos desde Junho e acusados de actos preparatórios para prática de rebelião e atentado contra o Presidente da República, apelam ao perdão dos “detentores do poder” e das forças do regime, e também à reconciliação nacional. “Ódio e vingança não são o caminho para o futuro de Angola (uma Angola livre, democrática e de bem- estar)”, lê-se na carta, que é endereçada a todos os compatriotas.
Assinado por Nuno Álvaro Dala “com o consenso dos 14 activistas detidos no hospital prisão de São Paulo”, em Luanda, o manuscrito confirma as reduzidas esperanças que os arguidos depositam no desfecho do seu julgamento, que foi agendado para 16 de Novembro. “Estamos cientes de que já fomos condenados publicamente pelo regime de José Eduardo dos Santos”, lê-se. Mas apesar da desesperança, os quinze companheiros recusam alimentar rancores e ódios, defendendo, pelo contrário, que “o perdão é o melhor caminho”.
“Temos sofrido tremendamente com a prisão (…), mas não desenvolvemos qualquer ódio. Não odiamos o Presidente da República nem aqueles que executaram a trama urdida contra nós”, garantem os activistas – que reafirmam o seu pensamento político “regido por uma filosofia assente nos valores da dignidade humana, igualdade, justiça social, desenvolvimento, tolerância, angolanidade e reconciliação”, em contraponto com “a ética do mal que rege os agentes do regime”.
Sublinhando que o seu “projecto político filosófico de nação” preconiza que “Angola deve ser construída por todos”, e defendendo que “a reconciliação nacional deve ser um processo de todos e para todos”, os quinze subscritores da carta aberta pedem “a todos os angolanos de bem para que perdoem esta gente”, numa referência aos “detentores do poder” que “vivem permanentemente aflitos e com medo de perderem tudo (inclusive as riquezas que saquearam à nação)”. “Do Presidente da República ao último agente da opressão – todos eles precisam de perdão”, escrevem os activistas.
A carta aberta aos angolanos foi conhecida um dia depois do anúncio do fim da greve de fome do músico Luaty Beirão, um dos arguidos do processo, ao fim de 36 dias sem comer. O rapper de 33 anos, que foi transferido da prisão para a clínica Girassol, uma unidade privada de saúde onde permanece internado sob supervisão médica, pediu para se juntar aos seus companheiros no hospital prisão de São Paulo, a partir de onde falariam “a uma só voz”.
Com data de 27 de Outubro, a missiva faz um breve inventário dos acontecimentos que marcaram a vida destes reclusos desde a sua detenção, “há mais de 120 dias”, na sala de aula do Instituto Luandense de Línguas e Informática onde participavam numa sessão de debate da obra “From dictatorship to democracy”, de Gene Sharp. Nuno Álvaro Dala refere-se às “condições desumanas” dos vários locais de detenção dos activistas, que se viram confrontados com “água imprópria para consumo”, “comida de má qualidade” e “camas de betão”, e também às “agressões físicas por agentes dos serviços prisionais e outros”, em cumprimento de orientações superiores e em desrespeito pela Constituição e as leis do país. Também aponta as consequências do tratamento recebido nestes quatro meses de prisão preventiva na saúde dos reclusos: “Problemas de visão, infecções no sangue, infecções na pele, infecções urinárias, gastrite, hérnias, amigdalites, etc”, enumera. “Mas mantemo-nos firmes”, garante.
Vigílias em Lisboa e no Porto vão continuar
A libertação imediata dos 15 activistas detidos a 20 de Junho voltou a ser exigida, esta quarta-feira, em concentrações de apoio realizadas em Lisboa e no Porto – e que serão repetidas, todas as semanas, segundo prometem os organizadores. “A solidariedade não tem prazo nem fronteiras, e não vamos desistir até que a liberdade devida lhes seja concedida”, sublinha o grupo LAPA – Liberdade Aos Activistas Presos em Angola.
O grupo diz que “apesar da batalha da greve de fome [de Luaty Beirão] estar ganha”, a luta pela liberdade dos presos políticos e por um julgamento justo “tem de continuar”.
Esta quarta-feira, a secção portuguesa da Amnistia Internacional entregou na embaixada de Angola em Lisboa uma série de petições para o respeito dos direitos humanos em Angola, entre as quais uma que defende a “liberdade para os 15 prisioneiros de consciência detidos em Luanda” com mais de 38 mil assinaturas.
No decurso do encontro, a organização lembrou que Luanda ainda não deu resposta aos inúmeros apelos e pedidos para a libertação dos activistas, nomeadamente dos seis relatores das Nações Unidas que classificaram como “arbitrária” a prisão dos 15 indivíduos que exerciam o direito a liberdade de expressão e de reunião pacífica.