Governo tenta proteger venda da TAP com maior vigilância das contas

Consórcio Atlantic Gateway vai ter de reportar mensalmente as contas da TAP à Parpública e aos bancos credores.

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Efromovich entrega proposta final de compra da TAP amanhã Pedro Cunha

Mesmo no fim da legislatura, o Governo aprovou em Conselho de Ministros uma resolução (a única desta quinta-feira) que obriga a Atlantic Gateway, quando for dona da TAP, a fazer reportes mensais sobre a situação financeira da companhia.

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Mesmo no fim da legislatura, o Governo aprovou em Conselho de Ministros uma resolução (a única desta quinta-feira) que obriga a Atlantic Gateway, quando for dona da TAP, a fazer reportes mensais sobre a situação financeira da companhia.

Foi uma alteração a um anexo do acordo de venda directa da TAP realizada num momento crítico de renegociação da dívida da transportadora com os bancos credores, que recusam desistir da garantia da Parpública e têm inviabilizado o alongamento das maturidades dos créditos requerido pela Gateway.

Para o secretário de Estado dos Transportes, esta é uma alteração que visa “reforçar os mecanismos de controlo” da situação financeira da empresa e que “indirectamente reforça as garantias dos bancos”, segundo afirmou esta quinta-feira ao PÚBLICO.

Foram introduzidos no anexo exigências sobre os níveis de capital próprio e da dívida da empresa de modo a que, através da nova monitorização mensal, a Parpública possa garantir que se “a empresa voltar a ficar em mãos do Estado, estará sempre melhor do que aquilo que estava no momento da venda”.

Se houver reversão, a Gateway tem “uma perda efectiva”. Já o Estado recebe de volta os activos e passivos da TAP, “mas esses passivos não serão superiores aos passivos que nós temos agora na altura em que estamos a vender”, explicou o secretário de Estado. O objectivo, disse, é que nem os capitais próprios sejam piores do que no momento da venda, nem a dívida financeira líquida seja superior.

Já havia condições que implicavam que o Estado pudesse reverter o negócio se houvesse incumprimento do consórcio (como a não manutenção do hub e da sede da TAP em Portugal), mas “o grau de exigência dessas condições sai [agora] reforçado”, afirmou o governante na conferência de imprensa após o último Conselho de Ministros da legislatura.

“Se algum dos eventos que já no passado implicavam a reversão se confirmar, a deterioração da situação financeira da TAP levou-nos a julgar que em defesa do interesse público era necessário reforçar os mecanismos de controlo”, sublinhou. O  PÚBLICO questionou a TAP sobre as suas contas actuais, mas a empresa não forneceu esses dados.

Sobre o facto de a privatização não ter ainda sido concluída, e se isso teve impactos negativos, fonte oficial afirmou que este é “um processo que está a decorrer de acordo com os passos previstos e dentro do calendário previsto”. No final do primeiro semestre, as contas da companhia tinam-se agravado, com os prejuízos a subirem para 110 milhões de euros e o passivo a aumentar para 2100 milhões.

A questão que se coloca é porque é que o Governo tomou agora esta medida. Primeiro era necessário que o regulador da aviação civil (ANAC) desse o seu parecer, sublinhou Sérgio Monteiro. E quando o fez, numa terça-feira, dia 13, deixou apenas uma margem de dois dias, para a quinta-feira seguinte (dia em que o CM se reúne). Portanto o momento teria de ser esta quinta-feira, frisou.

Ainda assim, nem o ministro da Presidência do Conselho de Ministros, Luís Marques Guedes, deixou de ligar a resolução à negociação com os bancos: “Não se resolvendo este problema da dívida financeira, como a comunicação social tem dito ao longo das últimas semanas, o problema da TAP não se resolve pura e simplesmente”, afirmou na conferência de imprensa.

E, no entender do ministro, o nó da venda da TAP está desatado: “Agora cabe à Parpública aprovar os instrumentos jurídicos necessários para a concretização do negócio e celebrar a venda definitiva de 61% das acções”, garantiu Marques Guedes (ficando 5% com trabalhadores e o resto ainda com o Estado).

A partir desse momento, a TAP vai ter um auditor em permanência (escolhido pelo Estado e pago pelo consórcio) que vai validar as contas todos os meses e entrega-las à Parpública. E haverá também “um banco agente que fará o controlo do serviço da dívida”, revelou a secretária de Estado do Tesouro, Isabel Castelo Branco.

Ao PÚBLICO, Sérgio Monteiro adiantou que a negociação com os bancos credores da TAP prossegue. Embora “não tenham sido parte na negociação que houve entre o Governo e o agrupamento” e não tenham “imposto nada”, “indirectamente reforça-se a garantia dos bancos” com a resolução, disse ainda.

Não ficou totalmente claro, no entanto, se esta nova monitorização das contas da TAP é suficiente para tranquilizar os bancos. Até aqui, as instituições financeiras têm recusado substituir as garantias do Estado pelas dos accionistas privados, ameaçando executar a dívida antes da venda (que no final do ano passado estava nos 650 milhões). 

Fonte oficial da Atlantic Gateway mostrou-se “confiante” no sucesso da privatização, afirmando que continuam “a trabalhar intensamente em várias frentes, entre as quais, na renegociação da dívida financeira do grupo,  no sentido que permita a viabilidade e sustentabilidade do nosso projecto para a TAP”.

Outra das frentes em que a Gateway tem de trabalhar é no cumprimento das recomendações que a ANAC fez no parecer prévio ao negócio. Até à data, o consórcio não enviou ao regulador da aviação civil as alterações necessárias para que a ANAC entenda que está assegurada a legalidade, nomeadamente demonstrando “inequivocamente que a gestão corrente [da TAP] é efectivamente controlada pela HPGB”, a holding de Humberto Pedrosa.

Frisando que o “parecer emitido não é positivo nem negativo”, mas “enumera as matérias em que se considera que a operação cumpre a legislação comunitária e as matérias que obrigatoriamente têm que ser alteradas para que a operação se conforme com essa mesma legislação”, fonte oficial da ANAC explicou que “não estabeleceu uma redacção concreta para as alterações que recomendou, deixando liberdade às partes para encontrarem aquela que considerem mais apropriada”.

No entanto, a ANAC “terá sempre que validar se o consórcio foi suficientemente longe nas alterações que propõe para cumprir as recomendações formuladas”, sublinhou a mesma fonte. Com