Más-criações

Ensinaram-me que se deve responder a todas as cartas. Enganaram-me.

As boas maneiras estão sempre a mudar. O pior é que só quando somos pequenos é que há gente para nos ensinar.

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As boas maneiras estão sempre a mudar. O pior é que só quando somos pequenos é que há gente para nos ensinar.

Cada vez há mais desconhecidos que me mandam mails que propõem que eu altere o meu calendário e subtraia horas ao número cada vez menor de que disponho nesta vida (tragicamente única) para ajudá-los a conseguir uma coisa qualquer que muito desejam para o bem deles ou para alguma causa benéfica escolhida por eles.

Se não responder na mesma semana, reagem com indignação. Reenviam o mail original, cheio de carinhos e longos incitamentos, com uma brevíssima reprimenda: "Então?!" ou "Segunda via!"

Todos conspiram para que nos sintamos na obrigação de responder e culpabilizados por não fazermos o que apetece a pessoas que não conhecemos de lado nenhum.

Ensinaram-me que se deve responder a todas as cartas. Enganaram-me. A nossa única obrigação é abri-las e lê-las até ao fim, se não forem actos de loucura. Quem escreve uma carta escreve para que ela seja lida. A resposta, para não ser condescendente ou "formulaica", tem de conter a mesma vontade de ser lida, que é a única coisa que nunca pode ter.

É mais irritante (mas, ao mesmo tempo, mais corajoso) telefonar. Quem telefona sujeita-se. A interrupção é da mesma intensidade. Um SMS é mais simpático, desde que não nos pressione. Mas, se é para pressionar, mais vale não fazer absolutamente nada. E, mil léguas abaixo, telefonar e arriscar a resposta sincera de quem se incomodou tão malcriadamente.