Rui Rio reserva-se para uma nova oportunidade

Antigo secretário-geral do PSD desiste de concorrer a Belém, mas assume-se como o candidato presidencial que teria “as melhores condições para garantir a indispensável estabilidade e sobriedade na política nacional”.

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Rui Rio teve ontem a sua última ceia com os vereadores enquanto presidente da Câmara do Porto Adriano Miranda

A três meses das eleições presidenciais, Rui Rio renuncia a uma candidatura que nunca chegou a assumir verdadeiramente, embora tivesse a ambição de ser um Presidente “mais interventivo do que aquilo que tem existido nos últimos 40 anos”. Todavia, o seu regresso à vida política activa não passava pela Presidência da República, mas sim pela liderança do PSD, num cenário de derrota de Passos Coelho nas legislativas. O jogo duplo deixou um rasto de desagrado em alguns sectores do partido. Rio sai de cena, mas fica como uma reserva para o partido.

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A três meses das eleições presidenciais, Rui Rio renuncia a uma candidatura que nunca chegou a assumir verdadeiramente, embora tivesse a ambição de ser um Presidente “mais interventivo do que aquilo que tem existido nos últimos 40 anos”. Todavia, o seu regresso à vida política activa não passava pela Presidência da República, mas sim pela liderança do PSD, num cenário de derrota de Passos Coelho nas legislativas. O jogo duplo deixou um rasto de desagrado em alguns sectores do partido. Rio sai de cena, mas fica como uma reserva para o partido.

O xadrez muda. Rio percebe que a coligação PSD/CDS pode vencer as eleições e abandona a ideia de disputar a liderança, até porque Passos já se tinha antecipado dizendo que não deixaria a presidência dos sociais-democratas em caso de derrota. O antigo secretário-geral de Marcelo Rebelo de Sousa vira-se então para as presidenciais.

Numa entrevista à RTP Informação, em Julho, diz que “a decisão não está tomada” – “70 ou 80% talvez esteja” – e aponta três dúvidas que tem para resolver. Se tem perfil para os desafios do cargo é a primeira. Rio avançará para fazer algo que define como “absolutamente” vital: a reforma do regime político. E a outra dúvida reside nas “condições políticas e pessoais”, sem esquecer que uma campanha “custa muito dinheiro”.

Rio troca as voltas ao seu núcleo duro e diz que encontra “vantagens tácticas” em anunciar a candidatura em Setembro, mas o mais provável é esperar pelas legislativas. Há apoiantes que não gostam do timing, mas o ex-presidente da Câmara do Porto resiste argumentando que não há nenhum élan em torno das presidenciais por parte dos portugueses e fica claro que só em Outubro será conhecida a sua decisão.

A 2 de Setembro escreve um texto no Jornal de Notícias, no qual justifica as razões pelas quais o anúncio deve ser feito no mês das eleições. Mas há quem lhe lembre que Outubro “é o tempo de Marcelo”, que à boleia dos 40 anos do partido correu o país de lés-a-lés, passando a sua mensagem, comendo muita carne assada e granjeando o apoio das estruturas do PSD.

Enquanto Rui se perde em momentos de reflexões onde cabem todos os cenários, Marcelo entra na campanha das legislativas e faz o seu caminho, ao mesmo tempo que continua a comentar na TVI. As sondagens espelham a popularidade do professor juntos dos portugueses e o ex-autarca do Porto começa a perceber que a caminhada para Belém é difícil. Aproveita a campanha eleitoral para se mostrar e um dia junta-se a Passos Coelho e a Paulo Portas numa acção da coligação Portugal à Frente em Viseu. É a sua única aparição na campanha.

A vitória eleitoral da maioria é estreita, o que impede Passos de impor um candidato presidencial. Os líderes dos dois partidos deixam  perceber que podem dar liberdade de voto na primeira volta das presidenciais, uma decisão que dessagrou a Rio. Mas não desarmou, ficando à espera de um sinal do líder do partido de apoio à sua candidatura.

Vai acenando que é o garante da estabilidade governativa se for para Belém e desvaloriza o silêncio de Passos, tendo em conta as negociações que a coligação tem em curso com o PS.

Enquanto isso, na sexta-feira passada, Marcelo ruma a Celorico de Basto, no distrito de Braga, para anunciar a sua candidatura à Presidência da República. Passos é informado já de madrugada da decisão.

No dia seguinte, Rui Rio multiplica-se em contactos, fala com muita gente e tenta perceber junto de alguns dirigentes do partido qual a disponibilidade para o PSD o apoiar numa campanha presidencial. As notícias não são boas, porque Marcelo já ocupou tudo.

Candidatura "facilmente interpretada como divisionista"
Agastado com a pressão, Rio mergulha num período de reflexão, decide não avançar e anuncia que não é candidato num artigo que escreveu e que foi publicado esta quinta-feira no Jornal de Notícias. No artigo afirma que teria “as melhores condições para garantir a indispensável estabilidade e sobriedade na política na política nacional”. Mas acrescenta que isso “só fazia sentido se houvesse a mesma visão dos dois lados”, ou seja, faltou-lhe o apoio dos partidos da sua área política.

“Sendo o novo quadro parlamentar um elemento potenciador de instabilidade política, é, para mim, evidente que o Palácio de Belém terá de ser mais do que nunca, um sólido referencial de estabilidade. Se assim não for, se a Presidência for, também ela própria, um foco de perturbação e de permanente agitação, então poderemos estar a colocar seriamente em causa o futuro próximo de Portugal”, escreve.

Numa mensagem enviada aos seus apoiantes mais próximos, Rio diz ter concluído ser uma “utopia” alguém querer candidatar-se ao lugar cimeiro do Estado sem ser a partir de Lisboa. “Num país profundamente centralizado como Portugal, lançar uma candidatura presidencial vencedora e nacionalmente reconhecida a partir de uma cidade que não a capital do país, é uma tarefa muito próxima do impossível”, escreve.

A sua desistência surge seis dias depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter anunciado que é candidato e o próprio Rui Rio relaciona as duas coisas quando diz que, caso avançasse agora, a sua candidatura seria “facilmente interpretada como divisionista, senão mesmo como desestabilizadora”. Precisamente para evitar isso, bem tentaram empurrá-lo mais cedo para a corrida, mas o antigo secretário-geral de Marcelo resistiu sempre.

Reserva política
Fora da corrida a Belém, o economista que governou a Câmara do Porto durante doze anos, vai concentrar-se no seu projecto profissional. Ao que o PÚBLICO apurou, não aceitará responsabilidades num futuro governo e não estará disponível para aceitar quaisquer cargos, mas pretenderá manter-se à tona da água.

Há um ano, quando toda a gente dava como garantida a vitória de António Costa nas legislativas, especulava-se muito sobre que pasta é que Rui Rio teria num futuro governo socialista, dada a boa relação que existe entre ambos. No actual contexto, a situação está ainda muito difusa e próximo governo é ainda uma incógnita. Para já, o ex-autarca social-democrata não pretenderá ter protagonismos, mas o futuro pode dar-lhe uma nova oportunidade.

Muitos dos apoios de Rio vão agora para Marcelo. O conselheiro nacional do PSD e candidato a deputado por Gaia, Firmino Pereira, foi o primeiro a dar esse sinal. Numa carta que escreveu ontem a Marcelo, Firmino Pereira declara-lhe o seu apoio por entender que é o candidato que reúne “as mais relevantes características para assumir o mais alto cargo político de Portugal”.

“O professor, nesta altura, não precisará de ajudantes para ‘carregar o seu andor’, até porque quando as sondagens indicam uma previsível vitória, não faltarão manifestações de apoio. Tem o meu apoio, porque estou a pensar em Portugal e como pode ser catalisador na estabilidade que precisamos”, escreve o conselheiro nacional.