Francisco Assis: "PS não pode ser governo custe o custar"

Eurodeputado socialista discorda das negociações à esquerda e defende que Passos deve ser primeiro-ministro.

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Assis assumiu divergências com Costa, mas diz que a liderança do partido não se coloca nesta altura nFactos/Fernando Veludo

O eurodeputado socialista Francisco Assis discorda das diligências que António Costa está a fazer com o BE e o PCP com vista à formação de um governo, e deixa claro que quem devia ser nomeado primeiro-ministro é Pedro Passos Coelho, reservando ao PS o papel de oposição.

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O eurodeputado socialista Francisco Assis discorda das diligências que António Costa está a fazer com o BE e o PCP com vista à formação de um governo, e deixa claro que quem devia ser nomeado primeiro-ministro é Pedro Passos Coelho, reservando ao PS o papel de oposição.

“Face à leitura dos resultados eleitorais, entendo que a melhor solução para o país é aquela que passa pelo Governo da coligação, com o PS a assumir claramente o papel de oposição na Assembleia da República e, naturalmente, estando disponível para dialogar permanentemente quer com os partidos situados à sua direita, quer com os partidos situados à sua esquerda”, declarou Francisco Assis.

Numa entrevista à RTP 3, o eurodeputado assumiu que tem divergências em relação a muitas pessoas do PS, nomeadamente o secretário-geral e diz que as devia tornar públicas. Disse que ponderou muito se deveria enunciar publicamente essa diferença ou não, mas acabou por fazê-lo por entender que “tem responsabilidades perante o país e perante o PS”. E explicou: “Contrariamente à leitura que tem prevalecido nalguns sectores do PS, não considero que a questão fundamental na nova Assembleia da República seja a distinção entre a direita e a esquerda, porque não há uma esquerda em Portugal, há várias esquerdas e, por isso, eu não vejo a AR num perspectiva bipolar, mas tripolar”.

Segundo Assis, "há o bloco de direita, que é o bloco correspondente à coligação que obteve sensivelmente 38% dos votos nas eleições de 4 de Outubro, sem maioria absoluta; há um bloco que representa o centro esquerda que é o PS, que teve 32,3%, e há depois um outro bloco da esquerda mais extremista e que é um bloco que representa sensivelmente 19% do eleitorado, que se subdivide em dois partidos: Bloco de Esquerda e PCP, partidos que representam sensibilidades políticas e sociológicas diferentes”.

“Olho para o PCP como um partido ideologicamente e doutrinariamente muito fechado e muito conservador e olho para o BE como um partido em transformação. Dentro do Bloco de Esquerda há, de facto, tensões internas significativas que nos permitem projectar uma expectativa positiva em relação ao que pode vir a ser a sua evolução, o seu comportamento parlamentar e a sua intervenção na sociedade portuguesa”, comparou.

O ex-líder da bancada parlamentar socialista disse não considerar que a “clivagem fundamental em torno de questões que têm que ver com a governação do país seja uma clivagem colocada ao centro, mas à esquerda”. E reforçou: “A grande clivagem situa-se à esquerda, entre o PS e as formações situadas à sua esquerda em questões fundamentais como sejam as questões europeias, concepção do que deve ser a Europa, a concepção da União Económica e Monetária, a concepção do papel do euro o Tratado Orçamental e em questões de política externa, onde há claríssimas divergências”.

Dadas as explicações, Assis disse que a “melhor solução para o país” é haver um Governo liderado por Pedro Passos Coelho e não por António Costa, o que, na sua opinião, será também a “melhor para o PS”, porque, explicou, “eu não coloco a questão do ponto de vista da legitimidade”.

O ex-líder da bancada parlamentar lançou várias questões: “É possível um governo monopartidário assente num compromisso parlamentar com o BE e com o PC?” “Esse governo é um governo com garantia de estabilidade política? É um governo com verdadeira capacidade reformista?”. Assis acha que não e entende que as reformas que o país tem que fazer - “e tem que fazer algumas” -, fazem-se mais ao centro e menos com a extrema-esquerda. E atirou exemplos: “Uma reforma séria da Segurança Social no sentido de a salvaguarda tal como nós concebemos que ela deve ser salvaguarda, o mesmo acontecendo com o Estado social, que é uma marca identitária do PS”.

“Com a força parlamentar que temos, é preciso impedir que a direita destrua o Estado social”, atirou, criticando a “visão anti-reformista dos partidos à esquerda do PS, partidos que estão muito fechados a qualquer transformação”.

Entende Francisco Assis que “num momento em que a Europa enfrenta uma situação difícil não é responsável fazer um governo dessa natureza”. “Um governo dessa natureza era um governo contranatura porque as divergências são muito profundas e retiraria capacidade ao governo do PS e isso seria muito negativo para o país”, assinalou.

“Nós não podemos estabelecer um entendimento de fundo de governação num momento em que a Europa atravessa um momento difícil e em que nós podemos voltar a enfrentar dificuldades grandes, porque a ideia de que os problemas do país estão resolvidos é uma ficção que nos foi vendida em grande parte pela direita e nós podemos voltar a ter problemas graves nos próximos tempos. Basta haver ligeiras alterações na economia internacional ou alterações geopolíticas e as coisas podem voltar a descambar", sublinhou

Questionado sobre as iniciativas de António Costa para tentar formar um governo de esquerda, Assis disse respeitar "a sua determinação e a sua visão” e assumiu que nesta questão a sua posição é bem diferente. “Há uma fractura. Temos entendimentos bastantes diversos”. "Não podemos ser governo custe o custar", frisou, por mais de uma vez. E sublinhou também que não entende "as pressões" que estão a ser feitas a camaradas do seu partido que pensam o mesmo que ele.

Clivagens à parte, Assis saiu em defesa de António Costa, afirmando “compreender perfeitamente” que o secretário-geral do PS não se tenha demitido na eleitoral. Depois enalteceu as “capacidades extraordinárias do líder do partido para dirigir o Governo”, caso o PS tivesse vencido as eleições. E aproveitou para afastar uma candidatura à liderança do partido. “A questão da liderança do partido não se coloca nesta altura”, repetiu, lembrando que já foi candidato há quatro anos e que essa não é uma questão que esteja no seu “horizonte pessoal”. Depois de ter sido várias vezes questionado sobre o assunto, Assis admitiu que “só em circunstâncias excepcionais” poderia avançar, fazendo mesmo questão em dizer que não queria falar mais sobre esse assunto.

Sobre as eleições presidenciais, disse que irá fazer campanha por Maria de Belém Roseira. “Precisamos de um candidato à Presidência da República confiável”. E manifestou o seu desagrado pela forma como todo o processo das presidenciais correu no partido.