A próxima Trienal de Arquitectura de Lisboa regressa à forma para pensar o mundo
André Tavares e Diogo Seixas Lopes querem olhar para a arquitectura a partir da forma, lugar de síntese e de resolução de conflitos quando se trata de desenhar edifícios e construir cidades. Dois comissários-cúmplices para um programa que começa em Outubro de 2016.
No fim do dia, é sempre à forma que regressa o arquitecto, por mais intensas que tenham sido as discussões à volta de outros temas e situações, no atelier ou no estaleiro de obra. A forma é a síntese, o principal indicador, visível e tangível, da arquitectura. André Tavares e Diogo Seixas Lopes, arquitectos e teóricos, são os comissários-chefes da próxima Trienal de Arquitectura de Lisboa, que acontece de 6 de Outubro a 11 de Dezembro de 2016, e que foi esta quarta-feira apresentada em traços gerais na Fundação Gulbenkian, em Lisboa, instituição parceira e cenário de uma das três exposições nucleares desta que é a quarta edição.
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No fim do dia, é sempre à forma que regressa o arquitecto, por mais intensas que tenham sido as discussões à volta de outros temas e situações, no atelier ou no estaleiro de obra. A forma é a síntese, o principal indicador, visível e tangível, da arquitectura. André Tavares e Diogo Seixas Lopes, arquitectos e teóricos, são os comissários-chefes da próxima Trienal de Arquitectura de Lisboa, que acontece de 6 de Outubro a 11 de Dezembro de 2016, e que foi esta quarta-feira apresentada em traços gerais na Fundação Gulbenkian, em Lisboa, instituição parceira e cenário de uma das três exposições nucleares desta que é a quarta edição.
É sob o tema A Forma da Forma que a trienal se propõe debater as diversas maneiras de praticar arquitectura num mundo que ela ajuda permanentemente a transformar. E isto colocando a tónica, em parte, no seu papel social, que hoje parece – é só aparência, dizem os comissários – oscilar entre parâmetros extremos: o da arquitectura que é especulação e lucro, de que os projectos para os emirados árabes são exemplos paradigmáticos, e o da arquitectura de baixo custo, como bandeira de activismo político, com epicentros em África e na América Latina. Nas duas, garante André Tavares, há espaço para reflexões que podem ser incómodas para alguns: “Mesmo nessa arquitectura que trabalha a sustentabilidade, de grande activismo, participativa, há uma componente de espectáculo - ela está no aproveitamento que faz de todo o excesso social à sua volta. Aquilo que às vezes nos parece em pólos opostos, pode tocar-se e é importante pensar sobre essas intersecções.”
Pensar e debater é o que propõem num programa alargado com três grandes exposições (todas a inaugurar a 6 de Outubro) que traçam uma parte da cartografia das instituições culturais de Lisboa. A Forma da Forma, a mostra central que se instala no Museu da Electricidade, vai juntar três ateliers de arquitectura num mesmo projecto expositivo (um belga, um americano e um português) e concentrar-se na forma enquanto “medida rigorosa, por vezes justa, outras injusta”, da arquitectura, explica Seixas Lopes. Obra, na Gulbenkian, vai recorrer a vários exemplos práticos, entre eles o da Casa da Música, no Porto, para responder às perguntas “como é que o trabalho no estaleiro de obra determina a arquitectura’” e “como é que a arquitectura condiciona a obra?”. Na Garagem Sul do Centro Cultural de Belém, O Mundo nos Nossos Olhos vai voltar-se para o espaço urbano que os cidadãos também ajudam a transformar, procurando perceber como é que os arquitectos interagem com o mundo já construído, com a realidade que encontram e que é, ela própria, uma construção.
“Quem produz a arquitectura não são os arquitectos, mas a sociedade, as pessoas. Os arquitectos fazem a síntese a partir do que os rodeia, do que conhecem, do que lêem e vêem”, lembra Tavares, regressando ao tema da trienal: “O que qualifica e transforma as cidades é a forma. Ela é a síntese, não é um simples devaneio intelectual.” Ela é, garante este crítico de arquitectura, um lugar de gestão de conflitos, por exemplo, entre o autor do projecto e o dono da obra, um lugar de conciliação de vontades. E, sendo o lado mais performático da arquitectura, a forma abre também a porta da disciplina a um público não especializado que esta dupla de comissários gostaria de ver cada vez mais interessado na programação da trienal.
Em ano de bienais e trienais de arquitectura – Veneza, São Paulo, Oslo, Istambul –, Lisboa espera marcar a diferença com um tema que, “apesar de técnico e objecto de muita produção teórica”, é também inclusivo. “Veneza terá como comissário o Aravena [Alejandro Aravena, arquitecto chileno] e, por isso, já sabemos que de lá virá um programa muito virado para a arquitectura de activismo. Nós quisemos ser transversais – na forma cabe muita coisa”, acrescenta Seixas Lopes.
E uma das coisas que cabe é um olhar geracional que, não excluindo “nem os pais nem os filhos”, se centra na geração dos comissários (Seixas Lopes tem 43 anos, Tavares 40). E isso vai notar-se, por exemplo, nos convidados para exposições e conferências (há já uma lista, mas ainda não está fechada e, por isso, não se podem ainda dar a conhecer nomes), mas também nos autores dos projectos do novo programa Satélites, que integra pequenas exposições e eventos disseminados pelo território da cidade, olhando por vezes para as suas periferias, com paragens na Amadora ou na Trafaria.
É uma geração que está entre os 30 e os 50 anos, explica Seixas Lopes, “que em muitos casos já tem um corpo de obra ou de pesquisa, que está prestes a passar para outro patamar e que tem um quadro de referências mais abrangente, a olhar para fora, para áreas como a do cinema, tratando-as como iguais da arquitectura”. Uma geração que poderá rever-se num ou noutro trabalho do Satélites, a envolver música ou vídeo, e que compreende bem o que o comissário quer dizer quando identifica como um dos principais desafios contemporâneos que se colocam à arquitectura o de encontrar o seu “papel cultural” enquanto “actividade criativa” sujeita a um “olhar crítico” como todas as outras.
Algumas das perguntas que vão marcar a trienal nesta sua quarta edição, que manterá os prémios Carreira e Universidades, poderão ser aparentemente simples, mas as respostas que lhe podem dar os diversos intervenientes – ou o debate que deverão suscitar – serão certamente ricos, acreditam os comissários, que só aceitaram partilhar funções porque dizem haver entre ambos uma grande cumplicidade. “O que faz um arquitecto?” e “como é que faz aquilo que tem de fazer?” são perguntas constantes na história da arquitectura e assim devem permanecer. O mundo muda com perguntas.