"Não acredito que a educação de moda esteja a vender um sonho falso"
A directora do curso de Design de Moda da Domus Academy, em Milão, está a participar como jurada no concurso Sangue Novo na 45.ª edição da ModaLisboa que termina domingo. Nesta conversa, Sara Desimoni desmistificou a profissão.
Esta quinta-feira, antes de participar nas Fast Talks do evento, um espaço para “reflexão, lucidez e debate” moderado pela artista Joana Barrios e com a participação de António Moura (Eleuterio Jewels), Kam Dhillon (Not Just a Label), Pedro Caride (Por Vocação), Petra Bruno (BUG Group- Brandstorytellers), a italiana Sara Desimoni conversou com o PÚBLICO, no Salão Nobre dos Paços do Concelho, sobre a crescente procura de cursos de educação superior de moda e desmitificou a profissão.
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Esta quinta-feira, antes de participar nas Fast Talks do evento, um espaço para “reflexão, lucidez e debate” moderado pela artista Joana Barrios e com a participação de António Moura (Eleuterio Jewels), Kam Dhillon (Not Just a Label), Pedro Caride (Por Vocação), Petra Bruno (BUG Group- Brandstorytellers), a italiana Sara Desimoni conversou com o PÚBLICO, no Salão Nobre dos Paços do Concelho, sobre a crescente procura de cursos de educação superior de moda e desmitificou a profissão.
A oferta de cursos de moda cresceu consideravelmente nos últimos anos. Isso reflecte a evolução e a transformação desta indústria?
Na realidade, a oferta crescente reflecte o interesse que as pessoas começaram a ter relativamente à moda — uma área que sempre foi considerada algo frívola. A imagem da moda mudou muito nas últimas décadas e isso aumentou o número de alunos que querem vir a ser designers de moda. Obviamente que, face a isto, a oferta educativa tem de ser actualizada. O próprio mercado da moda mudou e as empresas do sector também pedem agora requisitos diferentes. A Domus Academy [fundada em 1982 e com curso de Design de Moda desde 1983] tem uma relação muito próxima com a indústria, por isso actualiza a oferta com base nas exigências que uma empresa faz quando contrata um designer.
Há jovens que escolhem estudar Design de Moda para serem o próximo Alexander McQueen. O ensino da moda está a vender um sonho falso?
De todo. Não acredito que a educação de moda esteja a vender um sonho falso porque é importante sonhar-se, antes de mais. A moda é um campo onde é fundamental ter uma paixão que nos guie e, se não tivermos um sonho, é difícil. O mais importante é, durante o curso, não criar falsas expectativas nos alunos. Mas é exactamente o contrário de um sonho falso: é essencial criarmos novos sonhadores.
Como se resolve o desequilíbrio entre a oferta e a procura de cursos de Design de Moda e a falta de empregos?
Estamos a viver um momento em que o mercado está contraído, não há expansão. Há muitos designers de moda e poucos postos de trabalho. Mas tenho observado recentemente que depois de acabarem o curso em Milão, os alunos escolhem voltar para o seu país de origem — seja ele na China, na América do Sul ou na Europa — e decidem criar lá a sua pequena marca própria. Isto é algo que se está a tornar cada vez mais comum, provavelmente porque lhes dá a satisfação de verem o seu sonho a realizar-se. No entanto a nível global, este desequilíbrio é um problema. Mas os estudantes de Design de Moda têm de seguir esta carreira como uma paixão: esquecer horários de trabalho, regalias e grandes ordenados. Ao início é necessário fazer-se um grande investimento. Mas onde há talento, este é reconhecido.
Fazer formação numa escola internacional, como a Domus Academy, é essencial para se vingar?
A escola é uma plataforma — quanto mais famosa é, quanto mais bem-sucedida, mais pode ajudar. Mas o talento está em todo o lado. Às vezes, nem sequer está na escola em si. Há casos de designers que se tornaram famosos e não vêm de nenhuma escola conceituada. Quanto se tem talento e criatividade, não é um problema ir-se para uma escola desconhecida. A questão é: como é que se torna o nosso talento visível para os outros? Na Domus alimentamos o talento dos nossos estudantes, desafiamo-los profissionalmente, sempre com a presença nas aulas de um profissional do sector. E, acima de tudo, trata-se de uma relação de designer para designer e não de estudante para professor. Outra das qualidades distintivas da Domus Academy é o facto de ser uma escola muito internacional —os nossos alunos entram numa turma que tem o mundo todo lá dentro. Isso não é muito comum e é uma das coisas mais importantes e preciosas que podemos dar a um aluno. Se puderem partilhar ideias e opiniões, uns com os outros, os alunos crescem.
O Design de Moda é uma actividade vista como glamorosa. Quais são os equívocos acerca da profissão?
Muitas pessoas pensam que Design de Moda cinge-se a roupas bonitas. É um conceito muito banalizado, há quem pense assim. Mas, hoje, essa ideia está a mudar por causa do trabalho realizado por grandes designers que oferecem uma visão, um sonho, que envolve pesquisas e que explora o campo artístico embora isso nem sempre seja visível. A abertura da Fundação Prada, em Milão [palco de exposições temporárias de Arte Contemporânea, por exemplo], demonstra precisamente que a moda não são só peças de roupa, é um universo muito mais completo. É muito importante passar esta mensagem e acredito que ela está a ser bem difundida. Mas vai haver sempre uma parte da população que não vai entender a moda, tal como acontece com a arte.