Bastonário dos médicos critica arquivamento de casos de mortes nas urgências

À Ordem dos Médicos foram comunicados três dos oito casos de mortes em serviços de urgência no Inverno passado, mas ainda não há decisões

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O bastonário reagia à notícia de que a IGAS considerou não haver matéria para instaurar processos disciplinares aos profissionais de saúde envolvidos no atendimento de oito doentes que morreram após horas de espera para serem vistos por médicos ou enquanto aguardavam exames em hospitais públicos, entre Dezembro e Janeiro passados, quando se instalou uma situação de caos em vários serviços de urgência do país, devido ao pico de procura e à falta de recursos.

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O bastonário reagia à notícia de que a IGAS considerou não haver matéria para instaurar processos disciplinares aos profissionais de saúde envolvidos no atendimento de oito doentes que morreram após horas de espera para serem vistos por médicos ou enquanto aguardavam exames em hospitais públicos, entre Dezembro e Janeiro passados, quando se instalou uma situação de caos em vários serviços de urgência do país, devido ao pico de procura e à falta de recursos.

As mortes aconteceram entre o final de Dezembro de 2014 e as três primeiras semanas de Janeiro nos hospitais de S. José (Lisboa), Santa Maria da Feira, Setúbal, Peniche, Santarém, Aveiro e Garcia de Horta (Almada, dois casos). Os inquéritos foram todas arquivados, por “não haver matéria para processos disciplinares”, segundo a IGAS, que propôs “mudanças de natureza administrativa”. Ninguém foi considerado culpado.

“Face às circunstâncias em que estas mortes aconteceram, com as urgências congestionadas, a decisão já era de prever. A Ordem tinha criticado repetidamente as insuficiências das equipas e a falta de capacidade de internamento. Os doentes não foram convenientemente atendidos. O que nos deixa perplexos é que não tenham sido avaliadas as responsabilidade objectivas dos conselhos de administração e dos directores clínicos dos hospitais. Por que é que não foram instaurados processos disciplinares a estes responsáveis?”, insiste José Manuel Silva.

Lembra, a propósito, que uma auditoria do Tribunal de Contas (TdC) ao serviço de urgência do Hospital Amadora-Sintra (onde os doentes tiveram que esperar durante longas horas na urgência no Inverno passado) concluiu que o conselho de administração teve "responsabilidades".

Quanto ao papel da OM nestes casos, o bastonário revela que foram comunicadas à Ordem três das oito mortes que foram mediatizadas, mas ignora o resultado das averiguações. “Como em todas as circunstâncias, os casos foram enviados para os conselhos disciplinares para se fazerem inquéritos”, diz. Seja como for, a investigação da OM estava “parcialmente pendente das entidades a quem compete a auditoria e fiscalização”, e não compete à Ordem averiguar responsabilidades administrativas, apenas pode instaurar processos disciplinares, acentua.

Pondo em causa o “timing” da divulgação das conclusões da Inspecção, José Manuel Silva considera que a IGAS "não é uma entidade independente" e reclama a divulgação de todo o relatório das mortes nas urgências. Ao mesmo tempo, defende que o Ministério da Saúde deve apresentar atempadamente um plano de contingência para o Inverno que se aproxima. Mas essa não é uma competência da Direcção-Geral da Saúde (DGS)? “Uma coisa é a DGS apresentar umas brochuras excelentes, outra coisa é proceder à sua operacionalização”, ironiza.

O plano de contingência que o bastonário reclama deve incluir um aumento do número de camas hospitalares, mais profissionais para os serviços de urgência e a flexibilização de horários nos centros de saúde, o que no Inverno passado só aconteceu após o maior pico de procura.  “Nessa altura, havia centros de saúde fechados por causa das férias, dos feriados e das ´pontes`”, recorda, sublinhando que um serviço de urgência que funcione bem “tem que estar preparado para os picos de procura”.

“Há anos escrevi um artigo com o título É impossível trabalhar assim. Os problemas das urgências não são de agora, mas agora agravaram-se por causa dos cortes excessivos, da diminuição dos SAP (serviços de atendimento permanente) e da redução dos horários de atendimento dos centros de saúde”, enfatiza.

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