A maldição do arco de governação
Se a direita teve dificuldade em revalidar a sua maioria absoluta, as maiorias absolutas à esquerda tornaram-se simplesmente implausíveis.
Coisas que ouvi: “cortaram-me na pensão”, “aumentaram-me os impostos”, “cortaram-me na pensão e aumentaram-me os impostos”, “perdi o emprego e fiquei para trás nas prestações da casa”, “o meu filho teve de voltar para casa”, “a minha filha emigrou”. Das ruas vazias do interior aos transportes sobrelotados das áreas metropolitanas, o mesmo quadro de desesperança.
O grande erro de qualquer oposição é pensar que isto basta. Que é possível abordar um ato eleitoral com uma estratégia simplesmente baseada no descontentamento com a governação cessante. Sem explicar qual é o programa político e — acima de tudo — qual é a maioria para o implementar, não é possível transformar o descontentamento em alternativa.
É com essa ambivalência que olho para os resultados destas eleições. A direita — a confirmar-se a perda da sua maioria absoluta — deixou de ter, por si só, capacidade governativa. Deixará, assim, de ter legitimidade para prosseguir as suas políticas. Mas isto apenas na condição de os mandatos da esquerda se juntarem em torno de um compromisso convergente e consequente de governação. É a essa responsabilidade histórica que os partidos da esquerda serão em breve chamados. Dizer que se rejeita a maioria de direita sem propor uma alternativa será, mais uma vez, falhar à chamada.
Se a direita teve dificuldade em revalidar a sua maioria absoluta, as maiorias absolutas à esquerda tornaram-se simplesmente implausíveis. Neste quadro, só existe uma forma de a esquerda voltar a governar de forma estável e maioritária: acabar, de uma vez por todas, com o conceito de “arco da governação”.
A esquerda à esquerda do PS teve neste domingo possivelmente o melhor resultado da sua história — com destaque e mérito para o excelente resultado do Bloco de Esquerda. Esse é um dado essencial de que todos os atores políticos, a começar pelo Presidente da República, devem tomar nota desse facto. Não é mais possível excluir partidos que representam um quinto dos portugueses da possibilidade de governar o país.
O Partido Socialista, na reflexão que fizer nos próximos dias, passará provavelmente pelo dilema já bem conhecido dos seus homólogos europeus. Se ceder ao canto da sereia do Bloco Central, perderá legitimidade como oposição à austeridade. Se se abrir a soluções políticas com o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português, terá sem dúvida de enfrentar uma barragem de críticas das áreas mais conservadoras da política portuguesa. Mas só assim poderá encarar de frente o grande problema estrutural da democracia portuguesa.
Por outro lado, é verdade que essa exclusão tem, em primeiro lugar, partido dos próprios Bloco de Esquerda e Partido Comunista Português. Durante estas eleições deram sinais de que isto poderia mudar. Resta saber se levam a sério aquilo que disseram. Caso contrário, continuaremos a viver sob a maldição do arco da governação.
Quanto a mim, fui candidato de uma candidatura cidadã, democrática e aberta, de que muito me orgulho pela verdade com que falou aos cidadãos, mas que não atingiu os resultados que para ela desejámos. A ela dedicarei a minha próxima crónica.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Coisas que ouvi: “cortaram-me na pensão”, “aumentaram-me os impostos”, “cortaram-me na pensão e aumentaram-me os impostos”, “perdi o emprego e fiquei para trás nas prestações da casa”, “o meu filho teve de voltar para casa”, “a minha filha emigrou”. Das ruas vazias do interior aos transportes sobrelotados das áreas metropolitanas, o mesmo quadro de desesperança.
O grande erro de qualquer oposição é pensar que isto basta. Que é possível abordar um ato eleitoral com uma estratégia simplesmente baseada no descontentamento com a governação cessante. Sem explicar qual é o programa político e — acima de tudo — qual é a maioria para o implementar, não é possível transformar o descontentamento em alternativa.
É com essa ambivalência que olho para os resultados destas eleições. A direita — a confirmar-se a perda da sua maioria absoluta — deixou de ter, por si só, capacidade governativa. Deixará, assim, de ter legitimidade para prosseguir as suas políticas. Mas isto apenas na condição de os mandatos da esquerda se juntarem em torno de um compromisso convergente e consequente de governação. É a essa responsabilidade histórica que os partidos da esquerda serão em breve chamados. Dizer que se rejeita a maioria de direita sem propor uma alternativa será, mais uma vez, falhar à chamada.
Se a direita teve dificuldade em revalidar a sua maioria absoluta, as maiorias absolutas à esquerda tornaram-se simplesmente implausíveis. Neste quadro, só existe uma forma de a esquerda voltar a governar de forma estável e maioritária: acabar, de uma vez por todas, com o conceito de “arco da governação”.
A esquerda à esquerda do PS teve neste domingo possivelmente o melhor resultado da sua história — com destaque e mérito para o excelente resultado do Bloco de Esquerda. Esse é um dado essencial de que todos os atores políticos, a começar pelo Presidente da República, devem tomar nota desse facto. Não é mais possível excluir partidos que representam um quinto dos portugueses da possibilidade de governar o país.
O Partido Socialista, na reflexão que fizer nos próximos dias, passará provavelmente pelo dilema já bem conhecido dos seus homólogos europeus. Se ceder ao canto da sereia do Bloco Central, perderá legitimidade como oposição à austeridade. Se se abrir a soluções políticas com o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português, terá sem dúvida de enfrentar uma barragem de críticas das áreas mais conservadoras da política portuguesa. Mas só assim poderá encarar de frente o grande problema estrutural da democracia portuguesa.
Por outro lado, é verdade que essa exclusão tem, em primeiro lugar, partido dos próprios Bloco de Esquerda e Partido Comunista Português. Durante estas eleições deram sinais de que isto poderia mudar. Resta saber se levam a sério aquilo que disseram. Caso contrário, continuaremos a viver sob a maldição do arco da governação.
Quanto a mim, fui candidato de uma candidatura cidadã, democrática e aberta, de que muito me orgulho pela verdade com que falou aos cidadãos, mas que não atingiu os resultados que para ela desejámos. A ela dedicarei a minha próxima crónica.