Cinco palavras da campanha: “austeridade”, “confiança”, “maioria”, “útil”, “verdade”

Das muitas palavras que se ouviram durante a campanha para as legislativas, escolhemos cinco. Todos as conhecemos, mas preferimos ir a uma “sessão de esclarecimento” junto dos dicionários.

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Miguel Manso

Austeridade

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Austeridade

“Carácter ou qualidade do que é austero; rigor de disciplina”, mas também “dureza no trato” e “penitência”. Na campanha, a palavra “austeridade” foi usada por uns como “esforço” que terá valido a pena no sentido da recuperação económica e por outros como “roubo” aos que menos têm e podem. Uns e outros poderiam também ter falado em “austerismo”. Isto é, “excesso de austeridade”. Nenhum assumiu ter de a repetir.

Confiança

“Sentimento positivo que se tem em relação a alguém em quem se confia.” O mesmo que “crédito”. A palavra “confiança” foi uma das escolhidas pelo Partido Socialista, que a exibiu junto ao rosto de António Costa. O dicionário dá um exemplo: “Tinha uma confiança cega no amigo.” António José Seguro deve ter uma opinião sobre isso, mas não entrou na campanha. “Confiança” também significa “atrevimento” e “fé”. Todos os partidos “confiam” num bom resultado no próximo domingo.

Maioria

“A maior parte ou o maior número de um todo”, assim se define “maioria” em sentido lato. No sentido restrito das legislativas, corresponde a “partido ou aliança de partidos que compreende o maior número de votos no Parlamento e geralmente apoia o Governo”. Mas quem usou este substantivo na campanha queria ir mais além, à “maioria absoluta”. Mesmo que a ela se referisse como “maioria clara”, “inequívoca”, “boa” e “grande”. Sem subterfúgios, o dicionário explica que “maioria absoluta” é aquela “que reúne metade do número total de votos mais um”. Basta fazer as contas.

Útil

“Que serve ou é necessário para alguma coisa, que tem utilidade.” Ou seja, “benéfico”, “bom”. Este adjectivo, quando usado em campanha, vem sempre a qualificar o substantivo “voto” (“modo de exprimir a opinião num acto eleitoral”). São os maiores partidos que invariavelmente apelam ao “voto útil”. O dicionário, que até regista e descodifica “voto nulo” e “voto em branco”, não se detém em quaisquer deambulações teóricas sobre a utilidade ou inutilidade desta prática. “Útil” também se explica como “pessoa que ajuda em alguma coisa, que presta um serviço”. Pode bem ser um serviço à democracia, ao ir votar em quem bem entender. Onde é que está a inutilidade disso?

Verdade

“Propriedade de estar conforme aos factos, ao real.” E ainda “exactidão”, “realidade”. É uma palavra que todos os partidos usam e dizem defender. Foi até usada como lema do Bloco de Esquerda, “gente de verdade”. Também se pode traduzir por “franqueza, sinceridade, autenticidade”. Características difíceis de associar a campanhas eleitorais e menos ainda ao exercício da política a que temos assistido em Portugal. Essa também é uma verdade.

Dicionários consultados: Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora, 2009; Dicionário da Língua Portuguesa, Verbo, 2006; Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013