Defesa de Sócrates pode continuar sem acesso ao processo durante semanas
Procurador ainda não pediu nenhuma clarificação do acórdão da Relação de Lisboa, o que poderá fazer até à próxima segunda-feira.
Só depois caberá aos juízes da Relação que proferiram o acórdão, o relator Rui Rangel e o adjunto Francisco Caramelo, responder ao Ministério Público. Se os dois juízes não estiverem de acordo na resposta, poderá ter que intervir no processo o presidente da secção criminal, o que prolongaria por mais uns dias a decisão. E depois a decisão torna-se definitiva, sem qualquer hipótese de reacção ou recurso.
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Só depois caberá aos juízes da Relação que proferiram o acórdão, o relator Rui Rangel e o adjunto Francisco Caramelo, responder ao Ministério Público. Se os dois juízes não estiverem de acordo na resposta, poderá ter que intervir no processo o presidente da secção criminal, o que prolongaria por mais uns dias a decisão. E depois a decisão torna-se definitiva, sem qualquer hipótese de reacção ou recurso.
O presidente da Relação de Lisboa, Luís Vaz das Neves, adiantou ao PÚBLICO que não tinha entrado na secretaria daquele tribunal qualquer pedido de aclaração ou a invocação de qualquer nulidade até ao fim desta segunda-feira.
O prazo dos dez dias de que o Ministério Público dispõe para fazer aqueles pedidos termina no domingo, mas, como nesse dia os tribunais estão fechados, o prazo prolonga-se até segunda-feira. Se o Ministério Público nada fizer até lá, então a defesa de Sócrates e a dos restantes oito arguidos poderão ter acesso aos autos já na próxima semana.
O acórdão deixa, contudo, várias interrogações. É que os juízes da Relação declaram “o fim do segredo de justiça interno desde a data de 15 de Abril de 2015”, mas não dizem as consequências a tirar dessa determinação. Caberá, por isso, ao próprio Ministério Público dizer o que entende ficar invalidado com aquela decisão. A defesa de Sócrates já anunciou que iria pedir a invalidade de todos os actos proferidos a partir de 15 de Abril, mas é praticamente certo que o procurador Rosário Teixeira, o titular do inquérito, não aceitará esses efeitos.
Aliás na sexta-feira passada, os advogados de Sócrates, João Araújo e Pedro Delille, anunciaram ter apresentado um requerimento no Departamento Central de Investigação e Acção Penal para que fosse seja declarada “a nulidade do processo” desde 15 de Abril e por, consequência, revogada a prisão domiciliária do antigo governante e decidida a sua libertação. No dia seguinte, contudo, a defesa veio dizer que o procurador lhes tinha vedado o acesso aos autos, invocando o facto de ainda estar a decorrer o prazo para pedir a aclaração do acórdão da Relação.
O Ministério Público tem-se recusado a prestar qualquer tipo de esclarecimentos quanto à posição que irá adoptar face à decisão dos juízes Rui Rangel e Francisco Caramelo. “De momento, nada a acrescentar à informação que tem vindo a ser prestada”, tem repetido a Procuradoria-Geral da República, quando questionada sobre este assunto.
“Ele [procurador Rosário Teixeira] não adiantou se iria ou não pedir a aclaração, apenas falou dessa possibilidade”, referiu Pedro Delille. A defesa do ex-primeiro-ministro confirmou, em comunicado, ter entregado na tarde desta segunda-feira no Tribunal Central de Instrução Criminal um requerimento pedindo ao juiz de instrução Carlos Alexandre “que garanta a efectividade do acórdão de 24 de Setembro de 2015, do Tribunal da Relação de Lisboa”.
Na nota, a defesa de Sócrates diz que a iniciativa “decorre da recusa, transmitida pelo senhor procurador-geral-adjunto, em dar imediato cumprimento ao que se dispõe nesse acórdão, designadamente no que diz respeito a facultar à defesa o acesso aos autos, indispensável à garantia dos direitos de defesa” do ex-primeiro-ministro. Para os advogados de Sócrates, o eventual pedido de aclaração não passa de um “expediente dilatório totalmente infundado e ilegal”.
Contudo, o Ministério Público poderá vir a invocar algumas incongruências na decisão da Relação. Isto porque os juízes desembargadores invalidam um despacho do juiz de instrução, de 15 de Abril, que pretendia acautelar a possibilidade de vir a ser invalidada a declaração da especial complexidade do caso - o que reduziria o prazo máximo do inquérito e, com o fim deste, terminaria o segredo de justiça para os intervenientes do processo.
Como estava pendente um recurso na Relação de Lisboa para avaliar a especial complexidade do processo e como, pelas contas do Ministério Público, se a mesma fosse invalidada, o prazo limite para o inquérito seria 18 de Abril, o procurador decidiu pedir ao juiz de instrução que prolongasse o segredo de justiça por três meses, uma possibilidade prevista na lei para quando se esgotam os prazos máximos do inquérito.
No entanto, num acórdão de 17 de Junho, a Relação de Lisboa validou a especial complexidade do processo, logo, o inquérito nunca chegou a atingir o seu limite. Aliás, são os próprios juízes Rui Rangel e Francisco Caramelo a concluir que o prazo máximo da investigação só se esgota a 19 de Outubro. Ora, se o prazo de inquérito não atingiu o limite, o segredo de justiça interno não terminou, e o despacho do Juiz Carlos Alexandre de 15 de Abril torna-se inútil. Por isso, mesmo que esse despacho fosse ilegal por falta de fundamentação como dizem Rangel e Caramelo, tal não levaria ao fim do segredo de justiça interno, porque aquele despacho não chegara a produzir efeitos. Com Ana Henriques