Sócrates proibido de contactar responsáveis do grupo Lena

Há vários prazos a pressionar o Ministério Público para terminar a investigação nos próximos três meses.

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O prazo da investigação deverá terminar a 19 de Outubro – segundo a defesa já terminou em Janeiro –, mas tal não terá grandes efeitos práticos. Isto porque é consensual na jurisprudência (decisões de tribunais superiores) que os prazos do inquérito são meramente indicativos, atribuindo a lei uma única consequência: o processo deixa de estar abrangido pelo segredo de justiça.

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O prazo da investigação deverá terminar a 19 de Outubro – segundo a defesa já terminou em Janeiro –, mas tal não terá grandes efeitos práticos. Isto porque é consensual na jurisprudência (decisões de tribunais superiores) que os prazos do inquérito são meramente indicativos, atribuindo a lei uma única consequência: o processo deixa de estar abrangido pelo segredo de justiça.

Mas mesmo esta consequência pode ser evitada. Para impedir que a defesa tenha acesso a todos os elementos do processo, o Ministério Público, neste caso os procuradores do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, podem solicitar ao juiz de instrução que o acesso aos autos seja adiado por um período máximo de três meses, que pode ser prorrogado por mais uma vez.

Contudo, o Ministério Público terá outros prazos a pressioná-lo para terminar esta investigação. É que apesar de, neste momento, nenhum dos arguidos estar em prisão preventiva, há vários em prisão domiciliária – José Sócrates, Armando Vara, Carlos Santos Silva e Joaquim Barroca  uma situação equiparável à primeira para efeitos de vários prazos. Não é possível, por isso, ao procurador Rosário Teixeira manter os arguidos  sujeitos a estas medidas de coacção, se até 25 de Novembro não for deduzida acusação. Se tal não acontecer, há um efeito automático: as medidas de coacção caducam.

A defesa acredita que o procurador Rosário Teixeira poderá avançar com uma acusação só relativamente a alguns factos e manter os outros em investigação, extraindo certidões que darão início a novos inquéritos. Essa possibilidade foi avançada há uns dias pelo Correio da Manhã, o que levou os advogados de José Sócrates a questionar o Ministério Público. “O senhor procurador recusou-se a esclarecer esta questão”, afirmou ao PÚBLICO, Pedro Delille.

Este sábado, os dois advogados de Sócrates, João Araújo e Pedro Delille, deram uma conferência de imprensa, insistindo que não existem provas de que o seu cliente cometeu qualquer crime. João Araújo diz que a saída de Sócrates da cadeia não é “uma vitória” e que prisão domiciliária é “manobra de propaganda”. O advogado considera que o Ministério Público começou a “bater em retirada” porque “não tem razões sérias” para deduzir acusação ao fim de nove meses de prisão preventiva do ex-primeiro-ministro. “Os únicos indícios sérios, fortes, são de que o Ministério Público não tem nem pode vir a ter indício de coisa nenhuma”, lançou.

A defesa reafirmou este sábado que vai recorrer desta decisão. Mais tarde, Pedro Delille lamentou, em declarações ao PÚBLICO, que os prazos existentes para o recurso das medidas de coacção sejam tão extensos, retirando praticamente o efeito prático destas decisões, obrigatoriamente revistas de três em três meses. “O recurso da decisão de 9 de Junho, que manteve o nosso cliente na cadeia só subiu à Relação de Lisboa há uns dias”, exemplificou o advogado. Tal significa que quando o tribunal superior proferir uma decisão, essa já estará ultrapassada por uma outra, neste caso o despacho do juiz Carlos Alexandre da passada sexta-feira.

Na conferência de imprensa desta manhã, o advogado de Sócrates disse ainda que o processo de que está a ser alvo José Sócrates “nasceu amamentado pela enorme história do Grupo Lena” mas que, como esse” já foi chão que deu uvas”, “o Ministério Público inventou uma nova: o Vale do Lobo”. Sobre isso, João Araújo disse que se trata “de uma invenção patética, ridícula”.

A defesa do arguido assegura que “era impossível qualquer acto a beneficiar [o empreendimento de] Vale do Lobo, porque os últimos actos, legais ou administrativos, foram em 2004 e 2013”. Nesse sentido, João Araújo afirma que “a honra do engenheiro José Sócrates tem que ser a curto prazo reparada”. Quanto a um eventual pedido de indemnização, João Araújo respondeu “veremos”.

Ao ver as manchetes deste sábado, João Araújo diz estar num país “que esquece a liberdade”, afirmando-se “um bocado envergonhado com a justiça em Portugal”.

O advogado defende que, “sem provas sérias”, não se deve manter “qualquer restrição de liberdade” e mostra-se confiante de que ”o processo vai terminar inevitavelmente em arquivamento”.

Considerando que a proposta de pulseira electrónica foi uma tentativa de “aviltar” e “humilhar” o antigo primeiro-ministro, o advogado afirma que, entre a recusa dessa medida e a actual transferência para prisão domiciliária, “o engenheiro ficou mais 90 dias preso”. Mas durante esse período, ironizou, o Ministério Público ouviu “dez pessoas”.

Quanto ao limite que a lei prevê para a prisão preventiva sem que haja acusação, Araújo reconhece que “a lei permite um prazo maior” mas defende que “há prazos da lei e prazos de decência”.