Milhares de refugiados respiram a liberdade ao chegarem à Áustria e à Alemanha
As autoridades de Berlim e Viena receberam com calor e comida milhares de refugiados exaustos de dias de tensão na Hungria. Mas em Budapeste, rapidamente a estação de comboios se voltava a encher.
Sob o frio e a chuva, o primeiro grupo de cerca de 400 refugiados recebia bebidas quentes e pouco depois instruções da polícia, na cidade austríaca de Nickelsdorf, perto da fronteira. Alguns estavam tão cansados que se deixaram simplesmente cair no chão do centro da Cruz Vermelha, fechando os olhos, de sorriso na cara. Ao lado havia camas portáteis e colchões, onde muitos conseguiram finalmente dormir.
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Sob o frio e a chuva, o primeiro grupo de cerca de 400 refugiados recebia bebidas quentes e pouco depois instruções da polícia, na cidade austríaca de Nickelsdorf, perto da fronteira. Alguns estavam tão cansados que se deixaram simplesmente cair no chão do centro da Cruz Vermelha, fechando os olhos, de sorriso na cara. Ao lado havia camas portáteis e colchões, onde muitos conseguiram finalmente dormir.
“Agora respiramos o ar da liberdade”, dizia ao chegar à Áustria Walid, um jovem sírio que ajudou a organizar a marcha, em que iam muitas pessoas com crianças ao colo, e até idosos em cadeiras de rodas. Depois de andarem 25 quilómetros pela estrada, chegaram os autocarros húngaros para os levar. Ainda desconfiados por tentativas anteriores das autoridades húngaras os levarem para centros de refugiados, alguns estavam reticentes em entrar, mas notícias vistas nos telemóveis convenceram-nos de que desta vez o destino era mesmo a fronteira.
A Áustria disse que quem quisesse poderia pedir asilo logo no país, e quem preferisse poderia passar sem impedimentos para a Alemanha, destino preferido da maioria. Dos milhares que chegaram à Áustria, apenas dez pediram asilo, disse a ministra do Interior, Johanna Mikl-Leitne.
O primeiro destino alemão foi Munique, com o primeiro grupo de refugiados a sair da estação de comboios sob o som de palmas – eram cidadãos comuns que os aplaudiam, gritavam "bem-vindos à Alemanha", e estendiam garrafas de água, doces para as crianças, ou pratos com comida.
Os refugiados foram levados para um centro e esperava-se que fossem rapidamente distribuídos por várias cidades da Baviera e de outros estados-federados do país.
Tudo isto foi possível depois de a Hungria desistir de registar os refugiados e de os tentar obrigar a ir para centros de acolhimento. A mudança de posição terá acontecido depois do início da marcha com mais de mil pessoas numa auto-estrada para a Áustria que segundo as autoridades trazia problemas de segurança para os refugiados e os condutores, e do anúncio da Áustria e Alemanha de que abriam as fronteiras.
O Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) elogiou a atitude da Áustria e da Alemanha, que mostraram “liderança política assente em valores humanitários”. Mas “a concentração de refugiados e migrantes num número pequeno de países dispostos a recebê-los não é uma solução sustentável”, alertou a organização liderada por António Guterres.
Todos os responsáveis ecoaram esta ideia: esta não foi uma solução duradoura para a crise humanitária, mas sim uma saída para o problema mais agudo. “Era uma situação impossível, tinha de ser resolvida”, disse um porta-voz de Angela Merkel.
A chanceler dizia, entrentanto, numa entrevista, que não havia limite para os pedidos de asilo a aceitar. “O direito a asilo político não contempla um limite para o número de pedidos”, sublinhou Angela Merkel, dizendo ainda que a chegada de 800 mil refugiados (quatro vezes o número que recebeu em 2014) não vai levar a um défice orçamental ou a aumento de impostos. A Alemanha recusou mais de metade dos pedidos de asilo que recebeu o ano passado, a maioria vindos de cidadãos dos Balcãs, e a revista alemã Der Spiegel disse que o país está a apressar os repatriamentos daqueles a quem recusa asilo.
“Isto não pode continuar”
Os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia reuniam-se este sábado para discutir como gerir o fluxo de refugiados vindos da Síria através da Turquia, Grécia e Balcãs, enquanto a Comissão Europeia se preparava para apresentar novas propostas e está marcada uma cimeira para dia 14 de Setembro. Mas como a política tem de ter o acordo de todos os 28, parece difícil concretizar algo significativo.
“Esta situação tem de servir para a Europa abrir os olhos”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros da Áustria, Sebastian Kurz, na reunião deste sábado. “Espero que sirva como um alerta de que isto não pode continuar.”
Já o ministro húngaro dos Negócios Estrangeiros repetiu a ideia de que a Alemanha é culpada por ter dito que receberia os sírios mesmo que se tivessem registado noutros países. Peter Szijjarto disse que “o que aconteceu é consequência da política de imigração falhada da UE e das declarações irresponsáveis feitas pelos políticos da UE”.
Na Hungria, depois de no sábado de manhã a estação de Keleti estar muito mais vazia, rapidamente começaram a chegar mais pessoas e a meio da tarde já havia descrições de que parecia de novo ter quase tanta gente como durante a semana. E mais uma vez, uma marcha de milhares de refugiados pôs-se a caminho da fronteira com a Áustria.
O Governo húngaro garantiu, no entanto, que não vai fretar mais autocarros, uma medida que classificou como excepcional. “O problema não são 150 mil migrantes [o número dos que passaram já este ano pela Hungria], ou 500 mil, são milhões, dezenas de milhões, porque o número de imigrantes é ilimitado”, disse o primeiro-ministro conservador e anti-imigração, Viktor Órban.