O adeus emigrante
Por isso já não dizemos adeus. Afinal, já passou tanto tempo... dizemos até já e até breve, vemo-nos qualquer dia e um dia temo-nos outra vez
Chegámos à conclusão de que não somos daqui. Ao contrário do esperado, viemos de licença e apenas de licença, por alguns dias ou algumas semanas, com hora de partida e hora de chegada. E se por breves instantes nos vemos de volta a casa, tal acontece apenas para nos lembrar como é bom ser-se português e ter pais outra vez.
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Chegámos à conclusão de que não somos daqui. Ao contrário do esperado, viemos de licença e apenas de licença, por alguns dias ou algumas semanas, com hora de partida e hora de chegada. E se por breves instantes nos vemos de volta a casa, tal acontece apenas para nos lembrar como é bom ser-se português e ter pais outra vez.
E ter pais outra vez, irmãos e irmãs, e já sobrinhos para levar ao colo à procura de um outro amanhã. E ter pais outra vez na consciência plena de quem sabe chegada a hora de deixar de os ter, numa orfandade que se repete ao sabor das estações do ano. Por isso já não dizemos adeus. Porque vamos deixar tudo para trás sem poder nada trazer. E já bem o sabemos: de nada vale fotografar tudo o que tudo nos quer dizer. Porque não vamos ter tempo para ver as imagens. Porque não vamos querer ver as imagens onde já não somos nós mas outros quaisquer que nos riem e acenam de um mundo em tudo distante.
Assim, deixamos tudo para trás mais as coisas simples pelas quais quisemos morrer: a porta de casa, o sorriso dos teus pais e os beijos da minha mãe, uma sobrinha a correr, a cadela que nos cumprimenta entre cinquenta lambidelas, o café ao pé de casa, a praia a perder de vista, a água, sempre a água, e o mar que vem, sol, céu, tu e eu, e tudo aquilo que tivemos de lutar para poder aqui estar, nos braços um do outro, como se nunca tivéssemos daqui saído, como se não precisássemos de algum dia sair.
Como se não precisássemos, mas precisamos. Por isso já não dizemos adeus. Afinal, já passou tanto tempo... dizemos até já e até breve, vemo-nos qualquer dia e um dia temo-nos outra vez, mas desta vez sem lágrimas, e desta vez sem saudades, desta vez sem "selfies" e desta vez sem virar as costas enquanto caminhamos na direcção das partidas, de mão dada, um passo a seguir ao outro a caminho do inexorável. Porque entre os dois sabemo-lo bem, haveremos de voltar ou, como disse um reguila de cinco anos à partida de Lisboa, "'Bye Portugal, thank you."