Confiantes, doutores e licenciados
A confiança está em máximos de 14 anos. É o espelho de um país que está a andar a duas velocidades
Quem olhar para os dados que foram publicados hoje pelo INE dificilmente dirá que são de um país que nos últimos anos foi sujeito a um violento processo de ajustamento e de empobrecimento. Dizem as estatísticas que em Agosto o indicador que mede a confiança das famílias portuguesas voltou a subir e atingiu o valor mais elevado desde 2001. Segundo o inquérito, o aumento da confiança reflectiu uma expectativa mais positiva dos consumidores em relação ao desemprego, à evolução da economia e à situação financeira das famílias.
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Quem olhar para os dados que foram publicados hoje pelo INE dificilmente dirá que são de um país que nos últimos anos foi sujeito a um violento processo de ajustamento e de empobrecimento. Dizem as estatísticas que em Agosto o indicador que mede a confiança das famílias portuguesas voltou a subir e atingiu o valor mais elevado desde 2001. Segundo o inquérito, o aumento da confiança reflectiu uma expectativa mais positiva dos consumidores em relação ao desemprego, à evolução da economia e à situação financeira das famílias.
Claro que dizer que as famílias estão mais confiantes é uma frase que pode ser enganadora. O índice do INE pode variar dos -100 aos +100 e, desde que foi criado 1997, nunca registou um valor positivo. O máximo alcançado foi de -5,5 pontos no ano de estreia. Naturalmente que esta constatação não pode e não deve servir para desvalorizar a melhoria que se tem registado neste indicador desde o início de 2013 e que mostra que os portugueses, podendo não estar mais optimistas, estarão sem dúvida menos pessimistas. São números que vão entrar na campanha eleitoral e que vão ser usados pelos partidos da maioria para valorizar as políticas adoptadas pelo Governo, e a oposição não deixará de fazer o seu papel e mostrar o que vai mal no país.
Para tal basta folhear as páginas dos jornais para ver que a retoma nas estatísticas ainda não chegou à vida de muitos portugueses. E para alguns dificilmente chegará. Ainda ontem, uma reportagem no PÚBLICO contava a história de licenciados e doutorados que estão a concorrer a concursos para assistentes operacionais nas escolas, para desempenhar funções como vigiar o recreio das crianças ou limpar as casas de banho. Funções que só exigem escolaridade obrigatória e que naturalmente estão desajustadas à formação e habilitações dos tais licenciados e doutorados. “É ilustrativo do estado do país e não deixa de ser um desperdício de recursos”, comentava o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares.
É o exemplo de um país que está a andar a duas velocidades e que está a deixar muitos para trás. É indiscutível que a economia está a melhorar, que a Europa está a puxar por nós, que o desemprego está a baixar, que o turismo está em níveis recorde e que as exportações estão em alta. Mas há uma parte dos portugueses que, com a crise e com o ajustamento da economia, caiu naquela categoria a que os economistas chamam desemprego estrutural (e estima-se superior a 10%). São os tais cujas habilitações já não são valorizadas e procuradas pela empresas e que dificilmente conseguirão regressar ao mercado de trabalho a não ser para empregos altamente precários e mal remunerados. Não é por acaso que o Banco de Portugal considera que este é um dos problemas mais graves da economia portuguesa e que terá de ser encarado de frente com políticas agressivas de requalificação e de ajuda àqueles cuja retoma da economia e os indicadores de confiança pouco ou nada querem dizer.