Guiné-Bissau à procura da confiança
A solução da crise depende mais do PAIGC em aceitar o diálogo com o presidente da república na procura de um consenso para ultrapassar o impasse.
Decorrido apenas um ano, tudo parece voltar ao mesmo sítio de partida. Perante o inesperado acontecimento, que nada justificava à primeira vista, requer uma aprofundada análise para apurar as suas verdadeiras causas, antes de tomada de qualquer posição pró ou contra. Ao longo dos quarenta anos de independência, os governantes guineenses não têm pautado a sua conduta pela seriedade e pelos princípios éticos na gestão dos bens públicos. E nem sempre os seus bem elaborados discursos para o consumo externo espelha o seu verdadeiro carácter, oculto na penumbra do seu quotidiano.
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Decorrido apenas um ano, tudo parece voltar ao mesmo sítio de partida. Perante o inesperado acontecimento, que nada justificava à primeira vista, requer uma aprofundada análise para apurar as suas verdadeiras causas, antes de tomada de qualquer posição pró ou contra. Ao longo dos quarenta anos de independência, os governantes guineenses não têm pautado a sua conduta pela seriedade e pelos princípios éticos na gestão dos bens públicos. E nem sempre os seus bem elaborados discursos para o consumo externo espelha o seu verdadeiro carácter, oculto na penumbra do seu quotidiano.
O presidente da república fez graves acusações ao chefe do governo, dizendo que era intolerável a forma como estava a conduzir o país e a continuar no mesmo sentido iria criar, mais uma vez, sérios problemas e o descrédito internacional à Guiné. Também referiu que o relacionamento pessoal entre os dois tornou impossível a coabitação necessária e indispensável entre ambos os titulares dos principais órgãos de poder do país para o normal funcionamento do estado. Assim sendo, demitiu o governo e convidou o PAIGC a apresentar o substituto de Domingos Simões Pereira para formar o novo gabinete.
O presidente, parecendo ser uma pessoa responsável, não podia demitir o primeiro-ministro por mera discordância de opiniões sobre certos assuntos de relevância para o país. Ou tinha a razão mais que suficiente para o fazer, ou deu-lhe um ataque de loucura para tomar aquela decisão, o que não é credível.
Agora, a solução da crise depende mais do PAIGC em aceitar o diálogo com o presidente da república na procura de um consenso para ultrapassar o impasse, visando os supremos interesses do país, acima de quaisquer outros, independentemente das razões que assistam a cada um dos interlocutores.
Sendo o partido vencedor das eleições, pode indicar outra figura no seu seio para encabeçar o novo governo, podendo discordar da decisão presidencial — está no seu direito; contudo, é insustentável o seu repetido argumento, baseado apenas no que era ideal, porém, está-se agora perante o facto consumado e o país não pode continuar amarrado ao que devia ser.
Convenhamos que os interesses do país estão acima dos outros quaisquer e têm de ser salvaguardados e de merecer a confiança daqueles que se esforçam para o ajudar a sair da calamitosa situação em que se encontra.
Portugal, por obrigação histórica, devia ter uma política focalizada nos corredores do exercício de poder na sua ex-colónia, procurando saber o que se passa na realidade, em vez de concentrar mais atenção no apadrinhamento de algumas figuras pouco recomendáveis para governar um país como a Guiné em determinadas circunstâncias. A Guiné é um caso sui generis. Nem sempre está em causa a formação académica dos apadrinhados e as suas respectivas competências profissionais, embora sejam ambos os predicados necessários, mas, insuficientes para o desempenho de certos cargos de governação.
A esmagadora maioria dos governantes guinéus carece de estrutura moral forte para resistir às tentações de lidar com o dinheiro público. Aqui é que a bota não bate com a perdigota, escancarando a porta para a corrupção, os peculatos e os outros desmandos prejudiciais ao país. Por isso, tem de haver alguém com coragem para accionar a sirene, alertando para o perigo que se avizinha.
O PAIGC não pode nem tão-pouco deve sobrepor a recondução do seu líder aos supremos interesses do país, mantendo-o refém dos interesses meramente partidários enquanto a situação se vai degradando dia após dia. Devia prevalecer o bom senso no partido a que o povo confiou o poder para bem governar, mas, não para se governar. Não abaterá desgraça alguma sobre o país, se for afastado Domingos Simões Pereira da cena da polémica, antes pelo contrário. O que é mais grave e preocupante é o PAIGC, tendo o poder nas mãos, revelar-se incapaz de lidar com as situações difíceis, quando com elas é confrontado.
Por outro lado, o presidente devia também esperar que o partido indicasse outra pessoa de consenso para chefiar o executivo, evitando a confrontação desnecessária. Ou será que todos perderam o juízo, arrastando o país para o abismo?
Dirigente da Associação Guineense de Solidariedade Social