Uso excessivo da Net pode vir a ser considerado perturbação mental

No Hospital de Santa Maria (Lisboa) já existe há um ano um “núcleo de utilização problemática da Internet” no serviço de psiquiatria. É um problema "preocupante", frisa Daniel Sampaio.

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Maria João Gala

Especialistas contactados pelo PÚBLICO demonstram algumas reservas em relação a esta possibilidade, apesar de reconhecerem que o problema é "preocupante". Tão preocupante que a equipa de Daniel Sampaio, director do serviço de psiquiatria do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, criou há cerca de um ano um “núcleo de utilização problemática de Internet” para dar resposta ao número crescente de pedidos de consulta para problemas deste tipo. Problemas de adolescentes e jovens adultos, basicamente, e que usam de forma excessiva uma série de novas tecnologias, sobretudo jogos online.
 
Os dados disponíveis para Portugal indicam que o problema é sério. Um conjunto de estudos recentes conduzido pelo psicólogo clínico e investigador português Halley Pontes da Nottingham Trent University (Reino Unido), que contou com a co-autoria da investigadora Ivone Patrão do Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), mostrou que quase três quartos dos jovens (até aos 25 anos) inquiridos apresentavam E, destes, 13% exibiam níveis severos de dependência  sintomas de dependência do mundo digital. Em casos extremos, o vício online pode implicar isolamento, comportamentos violentos e até exigir tratamento. Estes estudos contaram com três fases de aplicação de questionários a cerca de 900 adolescentes e jovens portugueses dos 14 aos 25 anos.

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Especialistas contactados pelo PÚBLICO demonstram algumas reservas em relação a esta possibilidade, apesar de reconhecerem que o problema é "preocupante". Tão preocupante que a equipa de Daniel Sampaio, director do serviço de psiquiatria do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, criou há cerca de um ano um “núcleo de utilização problemática de Internet” para dar resposta ao número crescente de pedidos de consulta para problemas deste tipo. Problemas de adolescentes e jovens adultos, basicamente, e que usam de forma excessiva uma série de novas tecnologias, sobretudo jogos online.
 
Os dados disponíveis para Portugal indicam que o problema é sério. Um conjunto de estudos recentes conduzido pelo psicólogo clínico e investigador português Halley Pontes da Nottingham Trent University (Reino Unido), que contou com a co-autoria da investigadora Ivone Patrão do Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), mostrou que quase três quartos dos jovens (até aos 25 anos) inquiridos apresentavam E, destes, 13% exibiam níveis severos de dependência  sintomas de dependência do mundo digital. Em casos extremos, o vício online pode implicar isolamento, comportamentos violentos e até exigir tratamento. Estes estudos contaram com três fases de aplicação de questionários a cerca de 900 adolescentes e jovens portugueses dos 14 aos 25 anos.

O núcleo do Hospital de Santa Maria cobre escolas da zona, como as secundárias Virgílio Ferreira ou a José Gomes Ferreira, exemplifica Daniel Sampaio. Mas quem se enquadra, afinal, neste tipo de definição? “São pessoas que não fazem mais nada, [estão viciadas] sobretudo em jogos online. Chegam a faltar às aulas, não cumprem os seus compromissos”, sintetiza, sublinhando que este comportamento está habitualmente "associado a ansiedade e a depressão" e que a dependência surge muitas vezes como uma espécie de “tranquilizante”.

Na DSM 5 (que é de 2013), apesar de a única dependência comportamental incluída ser “o jogo patológico”, a Internet gaming disorder (perturbação de jogo na Internet) aparece já no apêndice das entidades que se reconhece precisarem de mais investigação. Mas o problema é mais lato, estendendo-se às novas tecnologias em geral.
 
Não deitem fora agenda em papel
“Isto está em estudo há muito tempo”, frisa Daniel Sampaio, que lembra que estão a ser feitos trabalhos de campo para se perceber se o uso excessivo da Net preenche ou não os critérios para ser considerado uma perturbação psiquiátrica. O que se pode dizer, por enquanto, é que o problema “existe e é preocupante”, enfatiza. Mas não se sabe ainda se vale a pena listá-lo como uma perturbação autónoma. Classificar como doença situações que podem ser apenas problemas de comportamento pode ser complicado, alerta. 

“A maior parte das pessoas, mesmo que faça uso da tecnologia durante horas excessivas, ainda não o entende como uma adição”, sustenta Alexandra Rosa, que é psicóloga da saúde no Hospital dos Lusíadas e chama a atenção para outro problema relacionado com este: o da utilização constante de iPhones ou de agendas electrónicas, que pode acabar por prejudicar a memória. “Com os iPhone as pessoas deixam, por exemplo, de decorar datas de aniversário."

A psicóloga até já se acostumou a recomendar aos seus doentes a não deitarem fora a velha agenda de papel. “A visualização e o treino de outros aspectos da memória são muito importantes, até porque a tecnologia também falha”, frisa.

Sobre o uso excessivo da Internet em geral Alexandra Rosa lembra que está a ser tudo muito rápido: "No espaço de 15 anos, ficámos habituados ao contacto permanente, e agora sentimos ansiedade quando tememos ficar desligados do mundo.” O que defende é que a diferença entre o que será normal ou patológico deve ser ponderada em função da utilização que é feita da tecnologia. “Quando a pessoa deixa de ter padrões relacionais, quando prejudica o seu trabalho, o seu sono e até a sua alimentação, isso já é motivo de preocupação”, considera.

“Pode haver dependência de tudo e mais alguma coisa”, defende o coordenador nacional para a saúde mental, o psiquiatra Álvaro Carvalho, para quem nem todo o tipo de comportamentos excessivos deve ser entendido como patológico. "Isso depende de o uso da Internet poder ou não ser altamente pernicioso para o desenvolvimento, contribuir para desarranjar a vida, como acontece com a dependência do jogo", compara. 

"Face a uma  prevalência muito elevada, e no caso de pessoas que não vivem para outra coisa, estão sempre ligados à Net", isso deve ser encarado como um motivo de preocupação, reconhece. Mas alerta que a DSM 5 "teve uma grande influência da indústria farmacêutica" e que esta perversidade até foi "denunciada pelo coordenador" da anterior versão do manual. O que Álvaro Carvalho teme é que "a psiquiatrização de comportamentos" seja usada para aumentar "a prescrição de medicamentos".

O que se pode fazer nos casos extremos de dependência, então? É preciso que haja "um diagnóstico precoce e uma tentativa de reeducação", nomeadamente através de "intervenção psicoterapêutica", preconiza. Mas reconhece que existem "poucas respostas" deste tipo no Serviço Nacional de Saúde. 

 Notícia alterada para esclarecer que o autor do estudo referido é Halley Pontes