A história do ovo e da galinha na Guiné
Um decreto presidencial derrubou um governo legitimado pelo Parlamento. E agora Jomav?
O futuro teima em não chegar à Guiné-Bissau. É um dos países mais pobres do mundo, entrou no circuito internacional do tráfico de droga e tem graves problemas de corrupção. E, a nível político, é preocupante revisitar a história do país desde 1994, quando fez a transição para o sistema multipartidário: desde então até agora não houve um único governo a completar um mandato. Em 1994, o PAIGC, até então partido único, vence as legislativas com maioria absoluta e Nino Vieira é eleito Presidente. Ao fim de três anos o primeiro-ministro foi demitido. E desde então a Guiné-Bissau tem sido um Estado falhado, com uma sucessão de golpes, guerras civis, violência, atentados, assassinatos, moções, governos de gestão, de iniciativa presidencial, etc...
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O futuro teima em não chegar à Guiné-Bissau. É um dos países mais pobres do mundo, entrou no circuito internacional do tráfico de droga e tem graves problemas de corrupção. E, a nível político, é preocupante revisitar a história do país desde 1994, quando fez a transição para o sistema multipartidário: desde então até agora não houve um único governo a completar um mandato. Em 1994, o PAIGC, até então partido único, vence as legislativas com maioria absoluta e Nino Vieira é eleito Presidente. Ao fim de três anos o primeiro-ministro foi demitido. E desde então a Guiné-Bissau tem sido um Estado falhado, com uma sucessão de golpes, guerras civis, violência, atentados, assassinatos, moções, governos de gestão, de iniciativa presidencial, etc...
O último golpe, em 2012, derrubou Carlos Gomes Júnior e lançou o país numa situação de quase total isolamento internacional. Até que se realizaram as eleições de 2014 em que dois militantes do PAICG, José Mário Vaz e Domingos Simões Pereira, foram eleitos democraticamente para ocuparem a Presidência e a liderança do Governo, respectivamente. A normalidade regressava à Guiné e havia no horizonte a esperança de que desta vez a paz iria perdurar. Ainda nesta quinta-feira Ramos-Horta recordava os progressos conseguidos em 12 meses “no plano social e económico, no ambiente político geral, no plano de segurança e no apoio internacional”. Foi sol de pouca dura.
Esta quarta-feira, José Mário Vaz, também conhecido como "Jomav", fez um discurso à nação para dizer que uma remodelação governamental não chega para sanar as suas divergências com o Governo e, duas horas depois do discurso, emitia um decreto presidencial que terminava com a seguinte frase: "É demitido o Governo chefiado pelo eng.º Domingos Simões Pereira.” Infelizmente é o regresso da instabilidade à Guiné e a prova de falta de maturidade democrática de um país onde as instituições teimam em não funcionar.
A decisão de demissão do Governo é tanto mais incompreensível quanto o Parlamento aprovou há pouco tempo, e por unanimidade, uma moção de confiança. Quando tomou posse em 2014, José Mário Vaz fez um discurso num estádio de futebol perante os guineenses em que dizia: “A instabilidade político-governativa não é a causa dos nossos problemas, é antes sim uma mera consequência da pobreza.” É a velha questão do ovo e da galinha. Se é a verdade que a pobreza não ajuda à estabilidade, mais verdade é que a instabilidade é meio caminho andado para o país não sair da situação de miséria. E se o PAIGC, como tudo indica, não aceitar nomear ninguém para substituir Domingos Simões Pereira, Jomav ficará com um problema grave entre mãos. Isto não significa naturalmente fechar os olhos às acusações feitas pelo Presidente: “Corrupção, o nepotismo e peculato.” Mas a democracia na Guiné tem ou deveria ter instrumentos para resolver a situação sem ter recorrer à bomba atómica política sempre que há um problema a resolver.