O recreio feliz de Tom Cruise

Missão Impossível: Nação Secreta é um caso feliz de entretenimento de Verão feito com cérebro, e a pensar em espectadores não-lobotomizados.

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Tem-se a sensação de que ele os faz para garantir a manutenção do seu estatuto de super-vedeta, mas também de que eles só existem por causa desse estatuto – são “veículos”, como se dizia na terminologia da Hollywood antiga. 

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Tem-se a sensação de que ele os faz para garantir a manutenção do seu estatuto de super-vedeta, mas também de que eles só existem por causa desse estatuto – são “veículos”, como se dizia na terminologia da Hollywood antiga. 

Mas, e não foi à toa que utilizámos a palavra “recreio”, percebe-se que ele se diverte e, mais importante, que nos diverte. É verdade que as expectativas nunca foram tão baixas e nunca se foi tanto ao cinema – para mais a uma destas grandes superproduções de Verão – com uma descrença tão grande. Mas não será só por a fasquia estar posta muito em baixo que esta Nação Secreta nos parece um pequeno sucesso: diríamos que é, facilmente, o melhor filme de acção desde que John McTiernan desapareceu, e por certo também o melhor filme da série desde o volume inicial de de Palma.

Dirigido por McQuarrie, que já trabalhara com Cruise no estimável Jack Reacher, esta Missão Impossível trata bem a “acção” no seu sentido lato – a acção narrativa, o movimento, a sua plasticidade. É praticamente tudo o que lhe interessa, e a intriga (que casa um misterioso “sindicato” de malfeitores com implicações geopolíticas e a pressão da CIA sobre a “força Missão Impossível”) está lá apenas com a precisão minimalista necessária para estruturar aquilo que são, no fundo, uma meia-dúzia de longas sequências de acção, desenvolvidas no tempo e no espaço. Uma das coisas inteligentes deste tratamento – e que, de facto, tanto encontramos em McTiernan como em de Palma – é a enorme previsibilidade da cada uma delas: as personagens expõem perante o espectador o que vai acontecer e o que pode acontecer na sequência seguinte, e o resultado é que o espectador nunca é apanhado num mar de explosões a trouxe-mouxe nem numa montagem aleatória a simular “acção”. Pelo contrário, tem uma noção exacta do que faz e precisa de fazer cada personagem, tem um sentido espacial do cenário e um sentido temporal da acção – nunca fica perdido, sabe sempre tudo, está mais próximo do “suspense” do que da “surpresa”. Este rigor dá pelo menos um episódio notável, a sequência de Casablanca, primeiro com uma aventura subaquática (as melhores cenas do filme) e depois com a perseguição pelas estradas do deserto marroquino, filmada com nervo, imaginação, humor, e a batota digital reduzida ao mínimo possível. Mas ainda antes disso, numa prova de que a imaginação também se revela pela escolha dos cenários, houvera outra sequência, muito bem filmada e montada, na Ópera de Viena, durante um Turandot de Puccini.

Missão Impossível: Nação Secreta é um caso feliz de entretenimento de Verão feito com cérebro, e a pensar em espectadores não-lobotomizados. Uma raridade, portanto.

 

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