A tristeza de ser pequenino

Em Portugal não existe uma política cultural. Existem apenas agendas de amigos, bastando possuir os conhecimentos e as influências adequadas para que do outro lado da linha telefónica atenda a pessoa certa no lugar certo.

Ser pequeno antes de tudo no plano mais sério do projecto que nos constrói como Nação e Estado. Com efeito, um primeiro e mais profundo sinal de pequenez é aqui a facilidade com que podem ser postas em causa, quiçá destruídas, orientações estratégicas, que se julgaria estarem consolidadas. No fundo, concluímos mais uma vez, como se não soubéssemos já, que em Portugal não existe uma política cultural, muito menos uma política museológica. Existem apenas agendas de amigos, bastando possuir os conhecimentos e as influências adequadas para que do outro lado da linha telefónica atenda a pessoa certa no lugar certo. Neste caso, um primeiro-ministro prestado a “pisar os calos” a um secretário de Estado de sua tutela directa, obrigando-o a desdizer-se. Dificilmente se identificará quem é mais pequeno neste universo liliputiano, se um administrador de Serralves, pequeno no seu acto gestionário ou bairrismo, ambos vesgos, se um primeiro-ministro, pequeno na sua visão do interesse nacional, se um secretário de Estado, pequeno na defesa das políticas do sector que circunstancialmente lhe foi dado dirigir e pequeno também na sua própria verticalidade. Neste último caso, aliás, com a agravante de ter potencialmente cometido uma irregularidade ao anular o seu despacho de incorporação da Colecção SEC no MNAC, dado que nos termos da letra e do espírito da Lei-quadro dos Museus Portugueses qualquer acto de desincorporação de colecção de museu público deve carecer de parecer prévio da secção relevante do Conselho Nacional de Cultura, ainda que a mesma se mantenha no domínio público sem o que estaria aberto o caminho à total discricionariedade dos políticos de turno na gestão de acervos que constituem memória de contrato intergeracional.

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Ser pequeno antes de tudo no plano mais sério do projecto que nos constrói como Nação e Estado. Com efeito, um primeiro e mais profundo sinal de pequenez é aqui a facilidade com que podem ser postas em causa, quiçá destruídas, orientações estratégicas, que se julgaria estarem consolidadas. No fundo, concluímos mais uma vez, como se não soubéssemos já, que em Portugal não existe uma política cultural, muito menos uma política museológica. Existem apenas agendas de amigos, bastando possuir os conhecimentos e as influências adequadas para que do outro lado da linha telefónica atenda a pessoa certa no lugar certo. Neste caso, um primeiro-ministro prestado a “pisar os calos” a um secretário de Estado de sua tutela directa, obrigando-o a desdizer-se. Dificilmente se identificará quem é mais pequeno neste universo liliputiano, se um administrador de Serralves, pequeno no seu acto gestionário ou bairrismo, ambos vesgos, se um primeiro-ministro, pequeno na sua visão do interesse nacional, se um secretário de Estado, pequeno na defesa das políticas do sector que circunstancialmente lhe foi dado dirigir e pequeno também na sua própria verticalidade. Neste último caso, aliás, com a agravante de ter potencialmente cometido uma irregularidade ao anular o seu despacho de incorporação da Colecção SEC no MNAC, dado que nos termos da letra e do espírito da Lei-quadro dos Museus Portugueses qualquer acto de desincorporação de colecção de museu público deve carecer de parecer prévio da secção relevante do Conselho Nacional de Cultura, ainda que a mesma se mantenha no domínio público sem o que estaria aberto o caminho à total discricionariedade dos políticos de turno na gestão de acervos que constituem memória de contrato intergeracional.

Mas importa ir mais longe. Importa não nos refugiarmos apenas na crítica “aos políticos”, mantendo um doce e cúmplice silêncio sobre o comportamento dos técnicos, de colegas afinal. Existem neste plano outras dimensões de ser pequenino.

Em face de situação denunciada publicamente, causadora da demissão do director do museu e da comissária (curadora, diz-se agora, embora mal) da exposição, será razoável que a tutela imediata não suporte o Museu e o projecto cultural estratégico que lhe subjaz e, pelo contrário, amesquinhe director e museu de uma assentada? Será normal que se destaquem dirigentes-para-todo-o-serviço, de resto patéticos nas suas intervenções públicas, com o fim de, como se diz em linguagem policial, “tomar conta da ocorrência”? E será tolerável profissional e humanamente que colegas de outros museus aceitem instalar-se no MNAC, exercendo funções que deveriam caber à respectiva equipa? Cumprirão seguramente ordens, dir-se-á. Mas, no mínimo, expressaram publicamente repúdio pelas mesmas como deviam? Ou recusaram até cumpri-las como poderiam em obediência ao seu código ético? Ou será simplesmente que vivemos já no reino do vale tudo do ponto de vista da ética profissional e as relações humanas desceram ao nível do “salve-se quem puder”?

Há cerca de ano e meio, quando foi chamado às funções de direcção no MNAC, o director que ora se agigantou, demitindo-se, foi ele próprio um tanto infeliz ao comentar a saída do seu antecessor, também ela em contencioso na defesa do Museu, dizendo que “é sempre possível contornar as dificuldades”. Palavras que lhe podem agora ser retribuídas por quem o suceder. Porque, sendo indiscutível que “contornar as dificuldades” ou fazer melhor é sempre possível, aquilo que a presente situação demonstra é que também é sempre possível… descer mais fundo, sermos mais pequeninos. Por este caminho, do mundo não passaremos cada vez mais a ver senão a imagem difusa e pardacenta de quem vai sucessivamente descendo no poço.

Arqueólogo