Kurt Wagner: “A arte consiste em ter consciência do que se está a perguntar”
Depois de Vila do Conde, o grupo americano Lambchop apresenta-se agora em Lisboa.
É assim que Kurt Wagner, 57 anos, cantor, compositor, guitarrista, líder do grupo americano Lambchop, define as “vidas paralelas” que leva entre a sua casa de Nashville e a digressão europeia que começou no domingo no Curtas Vila do Conde. “É mesmo como se tivéssemos duas vidas,” explica. “Uma em casa, que adoro, que é completamente doméstica – lavo a roupa, faço o jantar, ponho o lixo na rua, passeio os cães – e onde a música não me ocupa o tempo todo. Em digressão, a música assume toda a importância e tudo gira à volta dela. Do género, 'agora tenho de arranjar 15 minutos para falar com um jornalista português, como é que encaixo isso na agenda?'.”
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É assim que Kurt Wagner, 57 anos, cantor, compositor, guitarrista, líder do grupo americano Lambchop, define as “vidas paralelas” que leva entre a sua casa de Nashville e a digressão europeia que começou no domingo no Curtas Vila do Conde. “É mesmo como se tivéssemos duas vidas,” explica. “Uma em casa, que adoro, que é completamente doméstica – lavo a roupa, faço o jantar, ponho o lixo na rua, passeio os cães – e onde a música não me ocupa o tempo todo. Em digressão, a música assume toda a importância e tudo gira à volta dela. Do género, 'agora tenho de arranjar 15 minutos para falar com um jornalista português, como é que encaixo isso na agenda?'.”
A piscadela de olho, sublinhada por uma gargalhada, não é casual. Wagner é conhecido por estar pouco à vontade com a situação formal de entrevista, mas provou ser conversador atento e entusiasmado, numa breve conversa após o ensaio da noite de abertura da sua tournée 2015 em Vila do Conde, antes de descer a Lisboa. O grupo actua no Cinema São Jorge às 21h30 de terça-feira, num concerto em regime “greatest hits”, mas que não incluirá a colaboração encomendada pelo Curtas com o cineasta Bill Morrison que serviu de “primeira parte” no concerto de domingo. 15 anos depois do lançamento do disco que os consagrou, Nixon (2000), e três desde o último álbum publicado, Mr. M (2012), os Lambchop estão já a trabalhar em música nova que prevêem lançar em 2016 – mas que não será ainda revelada nestes concertos, centrados em material do período pós-Nixon.
Os Lambchop nunca procuraram estar onde as pessoas vos esperam. Houve sempre uma relutância vossa em repetir aquilo que já tinham feito antes.
Não somos movidos pela ideia de ter sucesso, e não é que não o queiramos ter ou que o evitemos propositadamente. Só não é a motivação principal. E na verdade não faço ideia o que é que começou por atrair as pessoas à nossa música. Nós só queríamos gravar discos, e a ideia de mostrá-los fora das nossas caves [risos], eventualmente apresentá-los num pequeno clubezinho, era o mais que nos tinha passado pela cabeça. Creio que sempre quisemos andar para a frente em vez de ficar no mesmo sítio. Perguntei-me muitas vezes se as pessoas continuariam interessadas na nossa ideia seguinte, mas por outro lado sinto que existe uma progressão lógica. A música que fazemos hoje não é a mesma que fazíamos há dez anos, que por sua vez não é a mesma que fazíamos há quinze. É assim que as vidas das pessoas são, e penso que isso faz a música reflectir melhor o que a banda é, o modo como as nossas vidas enquanto músicos foram mudando.
Os vossos fãs também já estão habituados a essa mudança constante.
Depois de Nixon, que ainda é o nosso álbum de referência para muita gente, fizemos coisas muito diferentes e continuámos a fazê-las [risos]... Estou muito entusiasmado com a música nova em que estamos a trabalhar agora. Libertou-me para outras maneiras de ver as coisas. Não é que tenha alguma coisa contra os artistas que continuam a refinar aquilo que sempre fizeram, porque não tenho. Eu é que não sou esse tipo de artista.
A sua formação é em artes plásticas e tem também carreira como pintor. Os Lambchop existem desde 1986, e só agora é que aceitaram uma encomenda para ilustrar um filme...
Não lhe sei dizer porquê, na verdade. Penso que a ligação entre o que faço enquanto pintor e enquanto músico é apenas ser um artista. A arte é para mim uma actividade intelectual: consiste em fazer perguntas, em ter consciência do que se está a perguntar. É uma coisa tão cerebral como física, não é apenas algo que se pendura na parede, e isso talvez não seja tão evidente a alguém de fora. Mas é verdade que quando a oportunidade de trabalhar com o Bill [Morrison] surgiu, tudo aconteceu quase sem esforço, o que foi muito estranho. Já estávamos a trabalhar em algo que nunca tínhamos feito, pensando na música como uma suite instrumental. Estávamos todos a olhar uns para os outros, a perguntar-nos o que estávamos a fazer, depois chegaram as imagens e de repente tudo pareceu fazer sentido. Até pensámos “isto não pode ser assim tão fácil” [risos].
A electrónica tem um papel importante na vossa música para o filme de Morrison, mas em Setembro vai lançar um álbum de música electrónica que gravou com dois outros membros do grupo, sob a designação HeCTA. Onde é que reside a fronteira com os Lambchop?
Os HeCTA são essencialmente uma experiência em termos de música electrónica, que é aquilo que o Ryan [Norris, teclista] e o Scott [Martin, baterista] fazem mais fora do grupo. Quis ver o que poderíamos fazer juntos, e tentar aprender sobre a electrónica. Não soa nada a Lambchop, e por isso não queríamos ter essa definição em cima. Os HeCTA são um modo de aprender, de ver o que no futuro será eventualmente possível transportar para os Lambchop. Uma espécie de ponte para o que há-de vir. O problema é que começámos a trabalhar nesse álbum há três anos e só agora é que sai, numa altura em que estamos a fazer esta digressão e quando acabámos de gravar as bases de um novo disco dos Lambchop, que vai ser muito diferente de Mr. M sem verdadeiramente o ser... Vejo esse projecto outro passo em frente, outro modo de tentar pegar em novas ferramentas e aprender novos modos de escrever música.