A Grécia?
No princípio do século XIX, a Inglaterra inventou a Grécia para consolidar o seu domínio no Mediterrâneo Oriental (e, de caminho, defender a rota para a Índia). Antes do canal (de Suez) ninguém queria saber daquele pedaço pedregoso do império turco e depois da independência da Índia ninguém queria gastar um vintém numa posição inútil. No célebre papel das percentagens que Churchill entregou a Estaline, lá estava: “Grécia – 90 por cento para a Inglaterra, dez por cento para a URSS”. Mas bastaram oito ou nove anos para a Inglaterra, exausta, vender a sua quota-parte a Washington, em nome do anticomunismo.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
No princípio do século XIX, a Inglaterra inventou a Grécia para consolidar o seu domínio no Mediterrâneo Oriental (e, de caminho, defender a rota para a Índia). Antes do canal (de Suez) ninguém queria saber daquele pedaço pedregoso do império turco e depois da independência da Índia ninguém queria gastar um vintém numa posição inútil. No célebre papel das percentagens que Churchill entregou a Estaline, lá estava: “Grécia – 90 por cento para a Inglaterra, dez por cento para a URSS”. Mas bastaram oito ou nove anos para a Inglaterra, exausta, vender a sua quota-parte a Washington, em nome do anticomunismo.
Entretanto, a Grécia passara pela ocupação italiana e alemã, por uma guerra civil entre estalinistas (sem o beneplácito de Estaline) e democratas, por indescritos governos, que tentaram copiar a organização política do Ocidente, e por uma ditadura militar, com o extraordinário coronel Patakos, que tinha uma cruzada pessoal contra a mini-saia. Quando isso passou, os novos senhores da América e da Europa não se preocuparam em deixar o mínimo de ordem atrás de si. As prevaricações da Grécia (por exemplo, aldrabar as contas) eram vistas com condescendência, e a importação para uma economia que não funcionava, nem podia funcionar, dos mais subtis requintes do Estado social como sinais de modernidade.
Esta última crise, com o seu mantra da “solidariedade europeia” e do “berço da civilização”, esconde o essencial. Sucede que na Grécia não existiu um “berço” da civilização moderna; e que a Europa sempre mostrou o seu carinho pela Grécia (como antes, de resto, os romanos) deitando a mão a tudo o que conseguiu apanhar. Se Bruxelas quisesse fazer alguma coisa por aquela triste terra, em vez de exibir os seus sentimentos democráticos, devia ajudar a construir um Estado capaz de reger e ordenar o caos reinante – uma espécie de colonização sem o nome e com dinheiro. Só que os tempos mudaram e a sr.ª Lagarde quer malcriadamente “adultos” para falar, como se não lhe chegasse a criança que tem no Eliseu. Quanto a nós, talvez convenha imaginar Portugal com 6000 ilhas, 280 habitadas por gente a reclamar um “subsídio de periferia”.