Os credores nacionais

Temos governos e partidos que fazem acordos pré-eleitorais com os credores internacionais para venderem imediatamente os direitos, os salários e as aspirações legítimas dos credores nacionais

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Hannibal Hanschke/Reuters

Quem são os verdadeiros credores? Aqueles que têm pago todos os desmandos, as mentiras ditas por este governo e o anterior e os anteriores? Os que pagam PPPs, que pagam os empréstimos da troika, os juros da dívida? Não haja a mais pequena dúvida: são os precários e as desempregadas, as pensionistas, os trabalhadores e os utentes do SNS, as pessoas que andam nos transportes (ainda) públicos. Nós, os que pagámos um Estado Social desde o seu início.

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Quem são os verdadeiros credores? Aqueles que têm pago todos os desmandos, as mentiras ditas por este governo e o anterior e os anteriores? Os que pagam PPPs, que pagam os empréstimos da troika, os juros da dívida? Não haja a mais pequena dúvida: são os precários e as desempregadas, as pensionistas, os trabalhadores e os utentes do SNS, as pessoas que andam nos transportes (ainda) públicos. Nós, os que pagámos um Estado Social desde o seu início.

Assim sendo, talvez seja hora de dizermos mais claramente que vai sendo hora de deixarem de negociar com os credores internacionais e de começarem a negociar com os credores nacionais. Senão vejamos: negociaram nas nossas costas e, mentindo-nos na cara sobre os cortes nas pensões, nos salários, no brutal aumento de impostos e nas taxas moderadoras para nos atirar de volta para os barbeiros, venderam as empresas que nós pagámos durante décadas. E tudo isto sem sequer pestanejarem.

Temos governos e partidos que fazem acordos pré-eleitorais com os credores internacionais para venderem imediatamente os direitos, os salários e as aspirações legítimas dos credores nacionais. Senão o que é que são as propostas de continuar a austeridade, de aprofundar a precariedade e o desemprego, “flexibilizando” o mercado de trabalho, de prometer mais cortes nas pensões e privatizações? A questão é simples: os intermediários — os partidos politicos — interpretam o valor dos contratos sociais ou escritos, e avaliam na balança com quem fazem coligações.

Se consideram que é mais importante cumprir um acordo não democrático e ilegal como aqueles feitos com a troika do que cumprir aquilo que assumimos enquanto sociedade, quando assinamos contratos, quando aceitamos que existe uma constituição e que existem tribunais, então favorecem os credores internacionais (além do memorando, hoje o FMI, Bruxelas e Frankfurt mandam bocas sobre salários, Estado Social, privatizações e pensões que se transformam em lei). Caso considerem que os contratos que nós assinámos valem mais, a sua única hipótese é proporem uma coligação aos credores nacionais (precários, desempregados, pensionistas e trabalhadores) e estabelecerem com estes um acordo pré-eleitoral que se comprometa a defender os seus interesses, acima de tudo, e como linha vermelha de uma política governativa.

A verdade é que a nossa humildade leva-nos a não nos levarmos muito a sério e com muito prejuízo para nós. Ora, imaginem que havia um governo que dizia ao FMI que ia deixar de lhe pagar, tal como o nosso governo nos disse que ia deixar de nos pagar uma parte do nosso salário? Ou um governo que dizia à União Europeia que ia vender o edifício da Jean Monnet para usar esse dinheiro e pagar as pensões aos mais pobres? Imaginem então um governo a dizer ao Banco Central Europeu que não lhe pagaria os juros e em vez disso utilizaria esse dinheiro para pagar aos desempregados que não têm qualquer apoio (e são mais de 3Ž4 dos desempregados, segundo as mais recentes notícias). Isso é que seria uma negociação e, convenhamos, uma negociação inteiramente legítima.