“Sou eu a ter um filho”

Um diário fotográfico da maternidade, para o bem e para o mal.

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Os gemidos continuam em repetição circular até se tornarem parte do ambiente, a banda sonora de um mundo de imagens onde saltam à vista os corpos iluminados, como se fossem escolhas divinas, corpos nus em jogos de cumplicidade, proximidade maternal e afecto. Depois de um mapeamento visual rápido das imagens que estão nas paredes da primeira sala e após ouvir a simplicidade e a ternura com que Ana fala do universo da exposição Kinderwunsch, temos a ilusão de estar preparados para o que se vai ler e ver a seguir.

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Os gemidos continuam em repetição circular até se tornarem parte do ambiente, a banda sonora de um mundo de imagens onde saltam à vista os corpos iluminados, como se fossem escolhas divinas, corpos nus em jogos de cumplicidade, proximidade maternal e afecto. Depois de um mapeamento visual rápido das imagens que estão nas paredes da primeira sala e após ouvir a simplicidade e a ternura com que Ana fala do universo da exposição Kinderwunsch, temos a ilusão de estar preparados para o que se vai ler e ver a seguir.

Nada mais falso. À medida que as imagens se vão sucedendo, percebemos como esta narrativa entre mãe e dois filhos é muito mais do que um continho de fadas: estremecemos perante o corpo outrora cheio e agora vazio e vemos cair por terra o lastro de imagens concebidas para simplificar a ideia do que é ser mãe. Ana (filha de mãe austríaca e pai espanhol), mostra como na simplicidade se revelam as mais densas e profundas emoções, mostra como pode ser sufocante viver presa a memórias ou como a maternidade pode ser desafiante perante a transformação, o desconhecido e o medo de falhar.

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Depois de uma suspeita de gravidez durante uma temporada em Viena para cuidar da avó, Ana visitou o doutor Fischl, que depois de vários resultados negativos registou num papel: “Paciente com antecedentes de quatro anos de desejo de ter um filho [kinderwunsch]." O desejo passou a ser uma realidade quando Ana tinha 38 anos. Desde então, começou a registar – sobretudo em fotografia –  o intrincado de emoções pelas quais passou durante o nascimento e o crescimento dos seus dois filhos, Lucio e Martín.

Em Kinderwunsch, uma das melhores exposições monográficas do festival, Ana Casas Broda, a viver no México desde 1974, dá seguimento a uma trajectória na fotografia muito centrada no seu corpo, nas suas memórias e relações familiares. É também um trabalho sobre a dificuldade de apreender o tempo presente, bem como sobre a constante nostalgia do presente imediato. Ana usa a câmara porque existe um desejo de controlar o processo e para construir diante de si uma história paralela, onde realidade e ficção se mesclam (Susan Bright). Os textos em jeito diarístico que acompanham as imagens são uma peça fundamental para se compreender a complexidade do que a autora foi experienciando nos últimos anos.

Através da fotografia, a maternidade como máquina do tempo é aqui potenciada a um ponto catártico, capaz de espantar fantasmas e de fazer regressar a mãe a uma infância que preferiu esquecer.

Ana Casas Broda. Kinderwunsch
Círculo de Bellas Artes. Até 30/08