Tsipras cedeu um pouco: a tragédia grega segue dentro de momentos

Primeiro-ministro grego reuniu-se em Bruxelas com François Hollande e Angela Merkel, que acredita que o compromisso é possível. "Quando há vontade as soluções aparecem", garantiu a chanceler alemã.

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O primeiro-ministro da Grécia reuniu com Angela Merkel e François Hollande depois do jantar oficial com os líderes latino-americanos REUTERS/Yves Herman

As metas orçamentais eram um dos mais fortes pontos de contenda entre as instituições credoras (Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia) e o Governo de Atenas. A Grécia pretendia fixar o superávit primário, ou seja, o balanço das receitas e das despesas sem o pagamento de juros, nos 0,6% do PIB, mas Alexis Tsipras sabia que esses eram os termos onde a sua margem de manobra negocial era mais “elástica”. Ao fim do dia, fontes do Governo grego confirmavam a disponibilidade para aceitar a meta definida pela troika – e mais do que os reflexos financeiros desse acerto, os observadoras destacavam a importância do gesto.

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As metas orçamentais eram um dos mais fortes pontos de contenda entre as instituições credoras (Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia) e o Governo de Atenas. A Grécia pretendia fixar o superávit primário, ou seja, o balanço das receitas e das despesas sem o pagamento de juros, nos 0,6% do PIB, mas Alexis Tsipras sabia que esses eram os termos onde a sua margem de manobra negocial era mais “elástica”. Ao fim do dia, fontes do Governo grego confirmavam a disponibilidade para aceitar a meta definida pela troika – e mais do que os reflexos financeiros desse acerto, os observadoras destacavam a importância do gesto.

Os três líderes europeus reuniram-se ao início da noite desta quarta-feira em Bruxelas: foi preciso esperar pelo fim do jantar oficial que encerrou os trabalhos da cimeira entre a União Europeia e os países da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), que concentrou as atenções durante o dia. Mas as movimentações já se tinham intensificado antes do ansiado encontro em pessoa desta nova espécie de troika negocial: a conta-gotas, foram-se sucedendo sinais de “abertura”, “flexibilização”, “cedências” e “concessões” de uma e outra parte, que indicavam uma “aproximação de posições”.

“A mensagem que quero deixar é esta: nenhuma solução será má para a Grécia, para a União Europeia ou para a zona euro”, sublinhou François Hollande, elevando as expectativas de um desfecho positivo do processo, que se arrasta há cinco meses. “Quando há vontade, as soluções aparecem”, vaticinou Angela Merkel. Mas segundo o porta-voz do Governo alemão, a solução não passará por negociações ad-hoc, ou o “relaxamento” das regras do programa: informações avançadas pela Bloomberg, sobre a suposta disponibilidade da chanceler em facilitar o pagamento da última tranche de 7200 milhões de euros à Grécia, mediante a aprovação imediata de pelo menos uma das reformas defendidas pelos credores, foram desmentidas como “uma pura invenção” pelo assessor de Merkel.

Deixando para trás a tensão da última semana, o presidente da Comissão Europeia e anfitrião da cimeira, Jean-Claude Juncker, recebeu efusivamente Tsipras, com beijos e abraços e um sorriso aberto. “Os dois trocaram ideias, numa conversa detalhada e um clima muito construtivo, e concordaram em voltar a ver-se amanhã [quinta-feira]”, informaram os assessores gregos.  Um encontro com o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, também estava a ser combinado.

No fim de uma reunião que durou cerca de uma hora e 45 minutos, as declarações foram todos no mesmo sentido: as negociações devem continuar a um ritmo intenso.

A Grécia não conseguiu convencer os credores com a sua contraproposta avançada no início da semana, que foi considerada “insuficiente” face às exigências das instituições, informou um porta-voz da Comissão Europeia. Ainda assim, o BCE acedeu a um aumento de 2300 milhões de euros dos fundos disponíveis para a banca grega através do programa de Assistência de Liquidez de Emergência, que assim passam para os 83 mil milhões de euros.  A medida não impediu, porém, que a agência de notação financeira Standard and Poor’s rebaixasse a nota da Grécia para “CCC” (apenas dois pontos acima do default), por entender que, sem um acordo, o país não terá condições para pagar a dívida a partir de Setembro.

O prolongamento do impasse deixa tanto o primeiro-ministro grego como a chanceler alemã à mercê das críticas dos seus próprios apoiantes, que não querem cedências. Na Alemanha, a pressão sobre Merkel dos legisladores da CDU tem-se intensificado, com os conservadores a manifestarem cepticismo quanto às “tácticas gregas” e exigirem firmeza quanto ao cumprimento do programa dos credores. “Ou então já não estamos a falar de um programa de ajuda, mas antes do sustento de um sistema que simplesmente não funciona”, criticou Michael Frieser, do partido social cristão da Bavária (CSU).

Do lado grego, os sinais de descontentamento também se multiplicam, e aumenta a pressão sobre o Governo para rejeitar qualquer compromisso que implique novas medidas de austeridade. Os comunistas prometeram convocar os seus militantes para a rua em protesto contra as políticas económicas do Governo de Tspiras. Também falaram em organizar uma “frente de resistência combativa” ao que designam como o quarto memorando de entendimento que Atenas está prestes a assinar.

Em declarações em Estrasburgo, o presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, criticou a abordagem das instituições durante as negociações com a Grécia, que na sua opinião se concentrou em ganhos de curto prazo que dificilmente conseguirão ser sustentados. . “Temos de ser honestos e reconhecer que, o que quer que seja que venha a ser decidido nesta semana ou na próxima, não vai resolver os problemas da Grécia”, disse. Para Schulz, a solução passa por uma “estratégia de longo prazo” que garanta o retorno ao crescimento, e não medidas como a subida do IVA ou o corte das pensões, com as quais não concorda.