António Manuel Baptista, físico, poeta, combatente
Depois do combate pela Ciência que é preciso renovar, julgo, infelizmente, que é urgente também travar um duro combate pela literatura.
Com um temperamento especial e uma visão muito própria das coisas, a que se manteve sempre fiel, recusou, num processo que acompanhei, uma alta condecoração que o Estado decidiu atribuir-lhe. Condecoração que me custou muito não tivesse recebido, por ser tão merecida e por ser da iniciativa de José Mariano Gago, que, na sua acção pública, singular e corajosamente, liberto de simpatias ou antipatias pessoais, distinguiu sempre quem considerou dever ser distinguido.
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Com um temperamento especial e uma visão muito própria das coisas, a que se manteve sempre fiel, recusou, num processo que acompanhei, uma alta condecoração que o Estado decidiu atribuir-lhe. Condecoração que me custou muito não tivesse recebido, por ser tão merecida e por ser da iniciativa de José Mariano Gago, que, na sua acção pública, singular e corajosamente, liberto de simpatias ou antipatias pessoais, distinguiu sempre quem considerou dever ser distinguido.
António Manuel Baptista, tal como José Mariano Gago, esteve desde a primeira hora ligado à Gradiva. Foi um companheiro sempre empenhado, sempre encorajador, no combate pela cultura científica. Combate que proporcionou a ambos muitos momentos de entusiasmo gratificante. Combate que, no seu início, pareceu a muitos impossível e inútil. Mas não foi. Para além dos muitos jovens que descobriram o caminho da Ciência e nele se realizaram, nesses anos breves de um florescimento que agora se extingue, ficou provado que o país pode mudar e depressa, que mudará, se houver continuidade na acção, gente, na sociedade e no Estado, com competência, persistência, arrojo e sonho – com a grande e patriótica ambição de contribuir para que a nossa Terra tão amada e sofrida vença o atraso de séculos e possa participar, também ela, no "destino de conhecimento que é o destino do homem".
O combate que travámos pela cultura científica – isto é, pela consciência crítica, pelo conhecimento, pela "abertura de espírito a todas as ideias, novas e velhas, e o máximo rigor crítico na análise de todas elas" (era assim que definia o espírito científico Carl Sagan, modelo e exemplo para todos nós) –, combate contra o obscurantismo, a ideologia cega, esse nosso combate não significou nunca uma desvalorização da cultura literária. Pelo contrário, José Mariano Gago, eu próprio e António Manuel Baptista crescemos a ler tudo, formámo-nos com a grande, inspiradora, literatura, também ela manifestação do melhor das realizações da humanidade. Refiro isto para registar que António Manuel Baptista, sempre inspirado pelas obras literárias, que gostava de citar, leitor compulsivo de poesia, companheiro de poetas, foi ele próprio poeta.
Depois do combate pela Ciência que é preciso renovar, julgo, infelizmente, que é urgente também travar um duro combate pela literatura. Literatura que é incontornável para a formação dos nossos jovens, combate pelas humanidades. Combate em que António Manuel Baptista seguramente também participaria.
Depois de 40 anos de devastação ideológica e pedagógica na educação, de perversão da escola, de secundarização e humilhação dos professores, de idiotização e esvaziamento programado da sua formação, de caminho acelerado para o fim da leitura, que aí está, é preciso, é urgente, lançar e travar esse combate determinante pela literatura.
Mas “onde estão os Homens?”
Editor da Gradiva