Uma ruína
A morte do “progressismo”, que mandou em nós durante meio século, deixou um deserto.
Há planos fantasiosos, que nem os próprios se atreveriam a executar; e planos mais próximos do mundo que misturam alhos com bugalhos e são feitos de promessas dúbias que se contradizem e dependem da habilidade ou da sorte. O cidadão comum não sabe o que pensar. Nenhuma verdade indiscutível e estabelecida o ajuda a medir o que lhe dizem. E muito menos tem um critério para avaliar o que de toda a parte lhe gritam como se fosse o Sermão da Montanha. Esta balbúrdia instituída no espírito dos portugueses vem de uma razão irremediável: o fim da ditadura do “progressismo”, que em várias doses se exerceu sobre a vida intelectual portuguesa.
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Há planos fantasiosos, que nem os próprios se atreveriam a executar; e planos mais próximos do mundo que misturam alhos com bugalhos e são feitos de promessas dúbias que se contradizem e dependem da habilidade ou da sorte. O cidadão comum não sabe o que pensar. Nenhuma verdade indiscutível e estabelecida o ajuda a medir o que lhe dizem. E muito menos tem um critério para avaliar o que de toda a parte lhe gritam como se fosse o Sermão da Montanha. Esta balbúrdia instituída no espírito dos portugueses vem de uma razão irremediável: o fim da ditadura do “progressismo”, que em várias doses se exerceu sobre a vida intelectual portuguesa.
Para começar o “intelectual”, como autoridade moral e consciência do público letrado, desapareceu. O último, Eduardo Lourenço, serve intermitentemente de ornamentação a várias cerimónias sem sentido: e, fora isso, já não abre a boca. O que resta – sob o nome de economistas, politólogos, psicólogos, sociólogos, “críticos” disto e daquilo e de coisa nenhuma – é uma vozearia de acaso a que ninguém liga. O colapso do “socialismo real” arrastou como seria de prever as suas variações, incluindo o “socialismo”, que só em relação a ele se definiam. Até a linguagem da “esquerda”, falada ou escrita, deixou de aparecer, excepto por hábito e por erro. O que sobrou não passa de um lamento pela pobreza e pelo desemprego, que, demonstrando bons sentimentos, não leva a nada e, principalmente, a um plano de acção.
A devoção pelo papa Francisco, que se tornou hoje numa das grandes personagens do “progresso”, é o perfeito atestado da dependência cultural do que dantes se chamava a “esquerda”: para lá de um certo ponto a caridade e a solidariedade começam a não se distinguir. Em 1970 ou mesmo em 80, nenhum “marxista” de nenhuma espécie aceitaria esta amálgama. Agora, tirando essas longas e, aliás, meritórias queixas sobre a miséria do país, não lhe sobra senão o silêncio. O que os políticos do PS discutem (e com o PSD e o CDS) é engenharia financeira: nada mais. Mas, numa eleição, as vantagens de um “projecto” ou de um conjunto de promessas (supondo que se percebem) não significam coisa alguma. A morte do “progressismo”, que mandou em nós durante meio século, deixou um deserto: meia dúzia de tiques, meia dúzia de asneiras (como a idolatria do Estado, por exemplo); e talvez também a tristeza de uma ruína.