Rajoy pediu ajuda a Esperanza mas nem isso lhe vai valer
A campanha para as eleições deste domingo em Espanha terminou como começou, com apelos ao voto que correspondem à estratégia desejada ou possível em tempos de mudança que nem todos souberam entender.
O PP arrasou nas municipais e autónomas de Maio de 2011, esmagou nas legislativas de Novembro do mesmo ano. Entretanto, aumentou o desemprego e cresceram as desigualdades, apareceram partidos e novas formas de fazer política. Para Rajoy, o PP ainda é a “mudança”.
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O PP arrasou nas municipais e autónomas de Maio de 2011, esmagou nas legislativas de Novembro do mesmo ano. Entretanto, aumentou o desemprego e cresceram as desigualdades, apareceram partidos e novas formas de fazer política. Para Rajoy, o PP ainda é a “mudança”.
“Esta direita”, afirmou o líder socialista, Pedro Sánchez, “que vontade tem de ganhar!”. O PSOE, disse Sánchez ao fechar a campanha, também em Madrid, é a única força capaz de o impedir, através de “uma mudança segura”. O líder socialista apelou ao voto útil e admitiu erros. “Hoje, o PSOE é um partido melhor porque aprendeu. Não vai voltar a esquecer que é um partido de esquerda para fazer políticas de esquerda”, prometeu.
No fim deste ano de todas as eleições, pouco em Espanha será como antes. Não se antecipa o caos à italiana, um país ingovernável. Em vez disso, haverá um novo tabuleiro, fruto de uma mudança radical que o PP e os socialistas, habituados a alternar no poder desde sempre em democracia, não souberam antecipar.
As eleições para o governo da Andaluzia, em Março, foram o primeiro teste: vitória para o PS, sem a habitual maioria absoluta e, dois meses depois, Susana Díaz ainda não é presidente, à espera de um voto na assembleia regional e a ter de negociar com as bancadas dos novos partidos, da esquerda do Podemos, herdeiro do movimento 15M, ao centro-direita dos Ciudadanos, nascidos há nove anos na Catalunha mas que só agora se estabeleceu como partido nacional.
Rajoy não percebeu que tinha de mudar de estratégia, que não bastava usar o discurso do medo – Aguirre repetiu várias vezes que, “se o Podemos ganha, será a última vez que vamos votar livremente” – nem insistir que “a economia está a melhorar” e que tudo vai correr bem.
Na capital do país, o primeiro-ministro recorreu ao que julgou ser o seu maior trunfo, a sua antiga adversária interna, ex-presidente da comunidade (entre 2003 e 2012). Contrariado, mas convencido de que a polémica e carismática Aguirre era a sua melhor aposta.
No momento em que os espanhóis dizem querer novos políticos e políticos novos, a corrida à capital pode parecer estranha. As duas mulheres com hipóteses de ganhar são Aguirre, uma condessa de 63 anos, ex-ministra e ex-presidente do Senado, ex-suspeita em casos de corrupção entretanto prescritos, que anunciara o abandono da política. A sua candidatura foi anunciada em Março. Dias depois, ganhava uma rival improvável: Manuel Carmena, juíza emérita do Tribunal Supremo de Espanha, que aceitou encabeçar a lista da coligação Ahora Madrid, apoiada pelo Podemos.
Carmena, que durante o franquismo defendeu operários e presos políticos, fez o seu percurso profissional na luta contra a corrupção e o abuso de poder. Ganhou o Prémio Nacional dos Direitos Humanos em 1986, foi relatora das Nações Unidas e representou Espanha no Grupo de Trabalho contra as Detenções Arbitrárias na mesma organização.
David contra Golias
Independente, Carmena preferia que o partido de Pablo Iglesias, o Podemos, não tivesse sido criado, preferindo que se transformasse num movimento mobilizador de candidaturas cidadãs, como a sua. Também confessou estar a passar “um mau bocado” numa campanha repleta de ataques pessoais. Para o Podemos, diz José Pablo Ferrándiz, do instituto Metroscopia, “é a melhor candidata possível, quem é que acredita quando Esperanza diz que vêm aí os venezuelanos e os etarras quando do outro lado está uma mulher que passou a vida a defender a democracia?”.
Numa campanha “de David contra Golias”, como descreve Arancha, uma apoiante de Carmena – com recurso a microcréditos e doações, a candidatura reuniu 200 mil euros; o PP contou com 20 milhões para as municipais e as autonómicas de Madrid –, a ex-juíza visitou todos os bairros, do centro às periferias, ouviu queixas e ofereceu a sua visão para resolver os problemas.
Carmena também encheu cinemas e praças. Aguirre fez o mesmo, mas orgulhando-se de não ter um programa: “Todos me conhecem e sabem ao que venho”. O seu rosto está por todo o lado nas ruas de Madrid, das estações de metro, aos autocarros de campanha, chegando aos táxis brancos que aceitaram receber dinheiro para colar nas suas portas a fotografia da candidata do PP e o seu slogan, “Por Madrid, Esperanza”.
Duas avós diferentes
Há uma semana, Aguirre organizou uma corrida nas ruas em redor de um pavilhão para a prática de ténis, a Cidade das Raquetas. Os inscritos podiam correr, deixar os filhos com voluntários em castelos insufláveis e, depois de ouvirem a candidata prometer “natação para todas as crianças a partir dos nove anos”, deixarem-se ficar à conversa no bar do clube, entre cervejas e tapas gratuitas a que a t-shirt da candidatura dava acesso.
Leonor, de 37 anos, mãe de dois filhos, Lucia, de três, e Tomás, de seis, não correu, mas aproveitou para trazer as crianças e marcar presença no pequeno comíci,o “porque Esperanza é a candidata mais liberal”. “Confio nela, mas votaria sempre PP”, afirma a empresária nascida em Sevilha, antes de lamentar “a desgraça de sempre na Andaluzia”, a única região espanhola onde o PP nunca governou, e a caminho para ir buscar Lucia, calças e blusa brancas de linho, laço azul no cabelo e, no peito, um crachá de Aguirre.
Beatriz, antropóloga de 36 anos, está a colar cartazes com frases de Carmena no bairro de Chamartín, a três dias das eleições. “Já queria ter feito isto antes, mas os voluntários atrasaram-se nesta zona. Cada um imprimiu os cartazes que pôde e, depois, quem quisesse podia ir buscá-los.” A jovem, recém-mãe, diz-se “encantada por poder votar numa senhora decente, sem vícios nem casos”.
“Isto foi um milagre”, disse a ex-juíza no encerramento da campanha, no parque Martin Luther King da capital. “O optimismo pode mudar o mundo”, afirmou. “Todos vamos recordar esta data como algo especial.” Depois, brincou, dizendo aos madrilenos que terão de escolher “entre duas avós”. Mais a sério: “uma que representa o que não queremos de volta e outra que está muito orgulhosa em representar as vossas reivindicações e esperanças”.