Wayward Pines: há algo podre no reino dos pinheiros

Pela primeira vez, uma série estreia-se em todo o mundo no mesmo dia. M. Night Shyamalan realiza e Matt Dillon, Melissa Leo e Juliette Lewis vivem agora na cidade de Wayward Pines — e daqui ninguém sai vivo.

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“É uma cidade muito agradável, o cenário é lindo, há um tom antiquado porque não parece que haja muitos dispositivos electrónicos na cidade - e tanto a enfermeira Pam e a Melissa acham que isso pode não ser muito mau”, descreve ao PÚBLICO a oscarizada Melissa Leo, que interpreta a perturbadora enfermeira de uma série cheia de mistério, aparências e perguntas. E se divide em duas para responder aos jornalistas. “Mas afinal o nosso realizador é M. Night Shyamalan… e as coisas podem não ser bem o que parecem.”

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“É uma cidade muito agradável, o cenário é lindo, há um tom antiquado porque não parece que haja muitos dispositivos electrónicos na cidade - e tanto a enfermeira Pam e a Melissa acham que isso pode não ser muito mau”, descreve ao PÚBLICO a oscarizada Melissa Leo, que interpreta a perturbadora enfermeira de uma série cheia de mistério, aparências e perguntas. E se divide em duas para responder aos jornalistas. “Mas afinal o nosso realizador é M. Night Shyamalan… e as coisas podem não ser bem o que parecem.”

Sinopse rápida: Matt Dillon é o agente dos Serviços Secretos Ethan Burke e acorda em Wayward Pines, à qual chegou em busca de dois colegas do FBI desaparecidos – um deles é Kate Hewson (Carla Gugino), com quem teve um caso – depois do que terá sido um acidente de viação. Ao acordar, a enfermeira Pam é o primeiro rosto da estranheza do lugarejo do Idaho que não o deixa telefonar para casa. Suspeitas, confusão mental, pouca gente em quem confiar e o inquietante xerife Arnold Pope (Terrence Howard, o Lucious Lyon de Empire) a empatar enquanto sorve gelados de rum e passas. A personagem de Juliette Lewis, uma barista, é um bálsamo escasso.

Logo à chegada, não há dúvidas. Há algo podre no reino dos pinheiros e daqui muito poucos saem vivos. E esta foi a escolha da Fox para ser a primeira estreia mundial simultânea (ou quase, devido aos fusos horários) de uma série de TV – Wayward Pines chega a mais de 125 países esta quinta-feira. “É o futuro da arte, seja cinema ou televisão. Ou talvez tenhamos de pensar noutro nome para ela”, opina Leo.

Melissa Leo, que em 2011 venceu o Óscar de actriz secundária por The Fighter - Último Round, está ao telefone com a imprensa estrangeira, mas por vezes é quase Pam. Ela é “muito segura do que faz e só recebe muito desrespeito, como todas as enfermeiras antes dela. Ninguém diz obrigada à enfermeira” – e quase lhe vemos os lábios a estreitar-se e a rígida farda branca a endurecer-lhe a postura. A bata foi o seu ponto de partida, porque pediram ao elenco que não lesse os livros da trilogia homónima de best sellers de Blake Crouch em que a série se baseia (a primeira temporada parte do primeiro tomo, Pines, editado em Portugal pela Suma de Letras, e o argumentista Chad Hodge assina a autoria da série com Crouch, que também participa na escrita de alguns episódios). Mas, confessa, “todos lemos porque estávamos muito confusos. E sentimo-nos muito melhor depois”.

A mesma sensação tranquilizadora talvez chegue, para os espectadores, a meio da temporada. “Vão perceber coisas com que nunca poderiam ter sonhado e depois ainda temos mais cinco episódios para mergulhar mais e mais neste mundo. E levantar questões sobre os paralelos sobre esta seriezinha estranha e o mundo em que vivemos”, confirma Melissa Leo, que se esquivou elegantemente de algumas das questões que Wayward Pines suscita sobre a actual sociedade de vigilância ou o crescente sucesso das narrativas de mistério para evitar spoilers.

Ofereceu-nos em troca um pouco de “filosofia”, recuando à Grécia clássica e à “arte ancestral de actuar” como “arte curativa” para aqueles que viam o drama e a comédia e “se tornarem melhores seres humanos por terem visto esse seu reflexo. A televisão nas casas das pessoas pode ser exactamente isso”. A televisão continua a encher-se de fantasia, mistério e jogos. Pistas, segredos e fantasmas de uma sociedade passada, presente ou futura. Aqui, a preocupação da equipa em garantir que haverá respostas é notória.

Shyamalan aceitou participar em Wayward Pines sob uma única condição: “Desde que a grande revelação não seja que estão todos mortos”. E ouvimos aqui o eco da sua carreira acidentada – do começo interessante (O Sexto Sentido e a sua reviravolta de intriga, O Protegido) que redundou em despistes de bilheteira e de crítica (A Senhora da Água, O Acontecimento, O Último Airbender) – mas também de séries precedentes que já começaram a ser associadas a Wayward Pines.

Primeiro, Twin Peaks. É o subtítulo da promoção da série pelo forte papel de inspiração que teve para Crouch quando escreveu a sua trilogia, mas também pelo cenário. Uma pequena cidade, nevoeiro e montanhas, pinhais densos e pessoas normais com bizarrias sortidas. Mas, avise-se, a motivação das personagens e a narrativa em volta é algo completamente diferente. No jogo de influências, também há paralelos com Perdidos – além da questão do “estão todos mortos”, a primeira cena de Pines é um olho que se abre para o desconhecido, tal como a imagem inicial do piloto sobre náufragos numa ilha misteriosa - ou mesmo Twilight Zone. E várias narrativas sobre cidades perfeitas que encurralam. Todo este pedigree por osmose, promocional ou não, não agrada necessariamente a Melissa Leo. “Nada nunca resulta se é ‘o mesmo que’.”   

Nesta cidade cheia de gente feliz com lágrimas, o Big Brother vigia-nos. E nas paredes e nas vozes dos seus habitantes, um lema, um mantra: “Não tente ir embora. Não discuta o passado. Não discuta a sua vida anterior. Atenda sempre o telefone se ele tocar. Trabalhe muito, seja feliz e aproveite a sua vida em Wayward Pines”.