Cinco dias depois do terramoto, começaram o êxodo e a violência em Katmandu
Falta de água e comida provocaram confrontos entre os habitantes da capital do Nepal e a polícia. Estima-se que possam sair de Katmandu cerca de 300 mil pessoas só nesta quarta-feira.
Os primeiros confrontos aconteceram durante a manhã, hora local, entre a polícia nepalesa e os milhares de habitantes que esperavam na central de Katmandu por um transporte que os levasse para fora da cidade. Há dez vezes mais autocarros do que o normal, escreve o diário britânico Guardian, mas, mesmo assim, os ânimos exaltaram-se com as enormes filas de espera e a falta de transporte. Algumas pessoas entraram em confronto com a polícia de choque, que estava destacada para guardar o Parlamento, mas ninguém foi detido, nem se registaram feridos.
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Os primeiros confrontos aconteceram durante a manhã, hora local, entre a polícia nepalesa e os milhares de habitantes que esperavam na central de Katmandu por um transporte que os levasse para fora da cidade. Há dez vezes mais autocarros do que o normal, escreve o diário britânico Guardian, mas, mesmo assim, os ânimos exaltaram-se com as enormes filas de espera e a falta de transporte. Algumas pessoas entraram em confronto com a polícia de choque, que estava destacada para guardar o Parlamento, mas ninguém foi detido, nem se registaram feridos.
Já durante a tarde, ainda perto da central, novos confrontos: dezenas de pessoas forçaram a entrada num camião que transportava água potável para os acampamentos e atiraram garrafas para a multidão que esperava. Desta vez, a polícia de choque nada fez e deixou que fossem atacados mais veículos que partiam da cidade.
Para muitos, o êxodo de Katmandu é a única resposta. As réplicas continuam e falta comida e água potável. Para os milhares que dormem no exterior, começa a aumentar o risco de uma grave epidemia. Há ainda muitos corpos na rua e a falta de saneamento potencia a probabilidade de surgirem doenças transmitidas pela água. Alguns nepaleses querem sair de Katmandu e voltar para as localidades de onde são naturais. Outros querem fugir para fora do país, ou para zonas que o terramoto poupou.
O Governo ofereceu viagens de graça para fora da capital e as próprias empresas de viação cortaram nos preços dos bilhetes. Só nesta quarta-feira, avança o diário britânico Guardian, que cita uma fonte não identificada do Governo nepalês, já saíram da capital cerca de 100 mil pessoas. Espera-se que este número possa crescer para 300 mil só nesta quarta-feira.
Mas as filas para os transportes implicam uma espera de várias horas. E são horas preciosas, uma vez que a esmagadora maioria da população que tenta sair de Katmandu não tem acesso a água potável e a alimentação que baste. Uma história que é comum e que Sarmila Panthi contou ao jornal britânico Guardian durante a manhã desta quarta-feira: “Já se passaram oito horas desde que aqui cheguei com o meu filho de um ano.” Panthi explica porque quer sair de Katmandu: “A vida tornou-se muito difícil. Não tenho água e não posso usar uma casa de banho.”
O descontentamento com o Governo tem vindo a aumentar. Nos últimos dois dias, o executivo tem sido muito criticado por não estar a fazer o suficiente na resposta ao terramoto de sábado – até ao início da tarde, como na terça-feira, a contagem oficial de mortos mantinha-se na ordem das 5000 pessoas. Com a chegada de mais equipas de salvamento, as operações estão finalmente a dirigir-se para as zonas rurais, até agora isoladas. Mas há ainda muitas localidades, especialmente em zonas montanhosas, às quais ainda não chegou nenhum tipo de assistência.
Mas se das aldeias remotas as vozes não se fazem ainda ouvir, nas zonas urbanas o protesto tem-se tornado cada vez mais claro. Entre os escombros, diz-se que o Governo não tem ajudado com os trabalhos de resgate e, nos acampamentos improvisados da capital, que o executivo nada faz por quem está desalojado ou tem receio de voltar aos frágeis edifícios que sobreviveram ao abalo.
Descontentes com a acção do Governo, cerca de 200 pessoas foram protestar para as ruas de Katmandu nesta quarta-feira. Tentaram impedir o tráfego nas ruas de cidade e foram dispersadas pela polícia. “Estamos com fome, não tivemos ainda nada que beber”, disse um manifestante à Associated Press. “Tenho uma criança com sete anos que está a viver ao relento, está a ficar frio e as pessoas estão a ficar com pneumonia”, acrescentou.
O Governo já admitiu erros nas operações de socorro – algo a que o ministro nepalês da Comunicação, Minendra Rijal, se referiu nesta quarta-feira como “fragilidades” que se vão agora corrigir. “Vamos melhorar isso a partir desta quarta-feira”, prometeu.
Alto risco de cólera
Com milhares de refugiados nos acampamentos improvisados de Katmandu e com saneamento muito limitado, o risco de um surto de cólera se repetir no Nepal é muito elevado. A diarreia, aliás, é uma constante desde o primeiro dia.
O Nepal é frequentemente assolado por surtos de cólera. E há uma agravante: a temporada das monções começa já em Maio. Em 2014, durante este período, morreram duas pessoas de um total de 600 que contraíram cólera. E não há muito tempo, em 2009, um grande surto infectou 30 mil pessoas e matou 500.
Uma epidemia cólera neste momento poderia revelar-se devastadora para o país. Mesmo com o apoio humanitário que tem chegado de outros países, os hospitais e campos médicos têm tido grandes dificuldades em responder aos mais de 10 mil feridos causados pelo terramoto. Uma epidemia de cólera, ou disenteria, que também é um risco, pode levar o serviço médico do país ao colapso total.