Novo Banco disputado por sete instituições

Carlos Costa ouvido na comissão de inquérito ao BES.

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Carlos Costa voltou à comissão do BES Miguel Manso

"A resolução não foi uma medida de destruição de uma instituição", o BES, mas uma medida de salvação de todo o sistema bancário, defendeu esta tarde o governador do BdP, Carlos Costa, na CPI ao colapso do GES/BES.

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"A resolução não foi uma medida de destruição de uma instituição", o BES, mas uma medida de salvação de todo o sistema bancário, defendeu esta tarde o governador do BdP, Carlos Costa, na CPI ao colapso do GES/BES.

O governador, que está a ser ouvido no quadro da segunda audição, lembra que a 2 de Agosto de 2014 (quando o BCE retirou ao BES o estatuto de contraparte junto do eurosistema, decisão que levou ao resgate do BES) o BdP se viu confrontado com apenas duas soluções: ou a liquidação ou a resolução.

A primeira medida teria abalado a confiança no sistema financeiro nacional e teria implicado grandes custos para o sector, accionistas e detentores de divida subordinada.

A segunda foi, em seu entender, a menos penalizadora e permite que neste momento a actual gestão do Novo Banco esteja a recuperar a confiança na instituição.

Carlos Costa sublinha que o processo de venda do Novo Banco, com início a 4 de Dezembro de 2014, está a decorrer com normalidade e de acordo com o previsto.

O governador comunicou que 7 entidades (das 15 que, na fase anterior, tinham manifestado interesse em estudar o dossier) apresentaram propostas de valor, ainda que não vinculativas, para comprar o Novo Banco (entre os quais estão o Santander, BPI, Apollo, Fosun). O que, na sua perspectiva revela forte interesse no Novo Banco.

"Como poderia o BdP não ter conhecimento do que se passava no BESA?", pergunta Carlos Costa  que explica que a actuação do BdP se encontrava dependente da iniciativa do BNA e das auditorias da KPMG.

O supervisor diz que estranha a ausência do Credit Agricole da CPI e explica que Ricardo Salgado não foi logo afastado porque o BdP "não dispunha de factos demonstrados que permitissem abrir um processo formal de avaliação da idoneidade."

Alega que até Junho de 2014  não foram identificados quaisquer factos que indiciassem a gravidade do que se passou. E que as conclusões da auditoria forense sugerem que tais situações eram do conhecimento dos administradores do BES que tinham o dever de comunicação ao BdP o que nunca aconteceu.

Costa defende que o reembolso da dívida GES aos clientes do BES é da exclusiva responsabilidade dos respectivos emitentes e admite que seria ilegal que o Novo Banco assumisse essas responsabilidades.

Ainda assim diz que os detentores de papel comercial do GES (ESI/Rioforte e outras sociedades) têm o direito de reclamar os seus investimentos à massa falida das empresas em processo de insolvência.

O governador considera que os clientes do BES que reclamam os reembolsos dos seus investimentos (os indignados do papel comercial do GES), caso se comprove que foram enganados (pois "há situações diferenciadas"), têm preferência face aos restantes credores que têm direitos sobre as entidades emitentes. No entanto, Carlos Costa admite o Novo Banco pode avançar com propostas.

Três núcleos na investigação
O governador avança que a "expectativa" é que as investigações ao GES/BES possam estar concluídas em 2016" e que só então se poderão deduzir as responsabilidades: "Caso se confirmem os indícios que determinaram a abertura de processos", então "serão deduzidas acusações".  O governador diz que as "investigações" podem ser divididas em três núcleos: "incumprimento de determinações específicas" do regulador no "processo de ring-fencing" visando a separação da área financeira do GES, da não financeira;  a "avaliação do cumprimento das regras de controlo interno do BES e di ESFG", que abrange as relações com o BESA; a "avaliação da legalidade das operações realizadas com ou através da Eurofin, entidade de direito suíço com ligações ao Dr. Ricardo Salgado e ao GES".

O responsável sublinha que quer a auditoria forense, que foi determinada por si, quer os trabalhos da CPI contribuíram para as investigações. 

Inquirido por Cecília Meirelles, do CDS/PP, Costa remata: "não há ninguém que tenha estado, nestes últimos cinco anos, mais preocupado" com a confiança e com a solidez do sistema bancário do que o próprio governador. E que ao assumir as funções de governador do BdP, em 2010, "herdou" um sector bancário com imparidades de 30,000 milhões. E garante que a situação foi, entretanto, minorada.

Ainda a responder a Cecília Meireles, sobre o papel comercia do GES vendido aos clientes do BES, Costa foi taxativo: "O Novo Banco não tem de ser herdeiro de actos e omissões de uma entidade com a qual já não tem nada a ver."

Sobre o BESA, Carlos Costa afirma que não pode divulgar informação pois o Banco Nacional de Angola "transmitiu-nos que não aceitava disponibilizar nenhuma documentação trocada com o BESA ou trocada connosco”. Sobre a garantia estatal angolana aos créditos do BESA, Costa revela que nunca leu os anexos 1 e 2, daí tê-la declarado elegível.

O governador conta que "até à publicação do artigo no Expresso [de Junho de 2014 que revela as irregularidades] "o BdP não sabia o que se passava em Luanda”, isto mesmo se as contas do BES reflectiam a exposição ao BESA  em 4000 milhões e se havia uma garantia estatal em vigor.

Miguel Tiago, do PCP, regressa ao tema do papel comercial para dizer diz que "o valor em dívida que menos caiu foi no retalho" e pergunta a Costa:" Sr. governador: Está a pedir a um deputado comunista que acredite num banqueiro?"

 Interesse em investir no BES
A "última manifestação de interesse" em investir no BES data de 25 de Julho, cinco dias antes do resgate, e na perspectiva de Carlos Costa "era verosímil". O governador declinou dar detalhes sobre a entidade que manifestou interesse em comprar o BES, nomeadamente, o seu nome. 

E avança: "Ponderei o plano de Resolução" do BES, depois da divulgação das contas semestrais (prejuízos de quase 4000 milhões), na passagem de quinta-feira, 31 de Julho, para sexta, 1 de Agosto. E evoca o que falou com o presidente da CMVM, Carlos Tavares, a 1 de Agosto, para o informar de que iriam surgir factos "relevantes durante o fim-de-semana", mas reconhece que não falou na solução que foi encontrada (Fundo de Resolução) para resgata o BES.

Carlos Costa alega ainda que “estava a ver a cotação a baixar bastante e que era preciso estar atento a qualquer fuga de informação" e "surpreendeu-me que a cotação não tivesse sido suspensa a determinado momento." Aconselhou a CMVM a fazê-lo? Carlos Costa diz que sim, pois evolução de queda "era preocupante". 

A deputada do BE, Mariana Mortágua interrogou Carlos Costa sobre se abordou o tema da “fuga de informação” com Tavares: “A esta distância eu acho que não." Mas sublinha que "não é normal" ser o BdP o pedir a suspensão da cotação, ainda que tenha "assinalado" a Carlos Tavares "que havia riscos de haver fugas de informação".

A deputada menciona agora as contradições do governador: falou ou não da fuga de informação, depois de já ter dito que o tinha feito? E Carlos Costa evidencia "que não consegue reconstruir a conversa com exactidão" e, por isso, não pode assegurar se esse foi o termo que utilizou.

Mortágua acusa o BdP de ter induzido em erros clientes do BES (que investiram em divida do GES) num email enviado pelo supervisor e onde refere que "a provisão sobre o papel comercial tinha passado para o Novo Banco." E Carlos Costa corrige a deputada sublinhado que a "provisão não passa de banco para banco". A deputada volta a recuperar o tema para inquirir: "O banco central deu uma informação errada a um cliente?" E o governador responde: “Se fosse eu a redigir, teria dito muito simplesmente que o papel comercial que beneficiava de uma garantia do BES, seria garantido pelo Novo Banco. E isso traduzir-se-ia numa perda e o Novo Banco teria de constituir uma provisão."

"Não vou conseguir uma auto-responsabilização da parte do Governador", conclui Mariana Mortágua. E Fernando Negrão pergunta: "Ao tomar conhecimento do email, o sr. governador não ponderou abrir um inquérito disciplinar? Não admite que daqui pode resultar um direito?" Carlos Costa não respondeu. 

A deputada pergunta ao governador se o BdP não devia ter "feito este trabalho [de supervisão das matérias de colocação de papel comercial] em conjunto com a CMVM?" E Carlos Costa aconselha a colocar a questão ao contrário e observa que o BdP "foi além do seu mandato" e das suas competências. 

Quatro horas depois do inicio da audição, Fernando Negrão interrompe os trabalhos para uma curta pausa.

 Carlos Costa explicou que nas vésperas do resgate ao BES, a instituição já não dispunha de "colaterais aceitáveis para o BCE e como tal teve de pedir ajuda" ao banco europeu. E avançou que a 2 de Agosto (véspera do resgate) o BES tinha 3500 milhões de euros de empréstimos de emergência concedidos pelo BdP. 

"É preferível capitalizar o banco que praticamente já não tem capital ou resolvê-lo?", perguntou Carlos Costa. E avança que "é uma grande dor de cabeça resolvê-lo, ninguém imagina o que significa resolver o banco, uma semana depois um indivíduo está esgotado". Mas, reconhece, que "em termos sociais, é uma oportunidade". O governador confessou no parlamento não "desejar ao meu pior inimigo aquilo que a equipa [do BdP] passou" do Banco de Portugal."  

Para o responsável do BdP tudo se passou "com uma grande velocidade, com um tempo muito curto", aproveitando para se insurgir contra o facto de ter sido acusado de "gatuno", como aconteceu durante o fim-de-semana, numa referência ao facto de muitos clientes do BES, lesados pelo papel comercial, terem ido manifestar-se à porta de sua casa.

 "Custa-me muito", disse. Foi "a maior ofensa que me fizeram na vida", mas a sua obrigação é cumprir a lei o que o impede de autorizar o Novo Banco a reembolsar as aplicações realizadas pelos clientes do BES em divida do GES.

"Eu estou feliz, porque nós temos [BdP] demonstrado que temos técnicos", mas também desenvolvemos instrumentos e um sistema informático inovadores, refere Carlos Costa. "E temos a ideia de que vamos a integrar bem o mecanismo único de supervisão", que é "um mundo multicultural" e "mais distante dos bancos". Para o governador "o papel do BdP como garante da estabilidade financeira vai aumentar "e como elemento de equipas europeias vai também ser posto à prova". Durante a audição, Carlos Costa teve tempo para revelar que vai (BdP) entregar ao Estado em dividendos mais de 240 milhões de euros.

Carlos Costa contraria Sikandar Sattar
Pedro Nuno Santos, do PS, vai fechar a primeira ronda de perguntas, e questionou Carlos Costa sobre a razão que levou o BdP, tendo já conhecimento dos problemas da ESI, no final de 2013, a permitir que os clientes do BES continuassem a investir em papel comercial da holding cabeça do GES. O BdP já tinha na sua posse informação enviada por Ricardo Salgado dando conta de que a ESI já estava insolvente com um passivo de 6000 milhões

O governador explica que, na altura, apenas sabia que a dívida da ESI tinha aumentado bruscamente e alega que estavam em curso muitas auditorias. Porque razão o BdP não informou a CMVM do passivo da ESI (que estava a emitir papel comercial que era colocado no mercado)? Costa explica que não estava obrigado a comunicar à CMVM informação prudencial. Para o governador, nesta altura, não há quem possa avançar com "um valor correcto sobre a dívida do GES que circula e o valor total da dívida GES pode ser muito maior”.

O deputado do PS inquiriu Costa: "Quando soube dos problemas e imparidades do BESA?" E Costa diz que "só soube dos problemas do BESA a 7 de Agosto de 2014 por uma artigo do Expresso", o que o levou a questionar o BNA. 

E Pedro Nuno Santos lembra que havia problemas de liquidez no BES e uma garantia estatal angolana sobre o BESA de 5700 milhões de dólares e não soam os alarmes? E Costa avança que o auditor a KPMG (que auditava o BES e o BESA) não reportou problemas nos créditos do BESA.  

Esta versão contraria a do próprio auditor, a KPMG, Sikandar Sattar, que a 2 de Dezembro, nesta CPI, explicou: "nas contas anuais do BES relativas a 2013 [que foram apresentadas a Fevereiro de 2013 ainda por Ricardo Salgado] a garantia estatal angolana "serviu de base para que não fosse necessária fazer uma provisão sobre os créditos de cobrança duvidosa e que tinham resultado de uma evolução negativa, particularmente, do mercado imobiliário, em Angola."

Mariana Mortágua inquiriu Carlos Costa sobre a declaração do presidente da KPMG Sikandar Sattar (que afirma a garantia angolana evitou que o BES constituísse uma provisão), que o contraria tendo o governador esclarecido: "Gostaria de lhe dizer o seguinte: obviamente foi uma decisão tomada pela KPMG que não a explicitou. E foi por essa razão que não consideraram as provisões, por que normalmente deveriam ter explicitado as provisões. A certificação de contas da KPMG só aconteceu a 4 de Junho"

,Carlos Costa aproveitou ainda para se manifestar contra a existência de conglomerados financeiros, pelas dificuldades que colocam na supervisão. "Sou a favor da diferenciação, e de holdings que não confundam os negócios", pois "há a tendência para uma mão esconder a outra", como "também sou a favor da separação entre banca de retalho e da banca de investimento."

Perante o burburinho que se gerou na sala a propósito de uma declaração confusa do governador sobre o papel comercial emitido por empresas do GES, Fernando Negrão observou: "Estou a perder o controlo disto." O que gerou risos na sala.

 A audição terminou às 22h30, sete horas e meia depois de ter começado. Nesta quarta-feira é a vez da Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, que encerra a comissão de inquérito.