Os Pirenéus testam a resistência da Europa
A Europa está com os olhos postos em França e a França pode já estar com um pé fora da Europa.
Este domingo os espanhóis na Andaluzia e os franceses nas eleições departamentais vão provavelmente consolidar a tese de que terminou o bipartidarismo nos dois lados dos Pirenéus. Em Espanha, as eleições autonómicas provavelmente só permitirão uma leitura nacional a 29 de Maio. Mas do outro lado da fronteira a Frente Nacional (FN) pode confirmar já hoje na primeira volta a tese de que a vitória nas eleições europeias não foi um acto isolado.
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Este domingo os espanhóis na Andaluzia e os franceses nas eleições departamentais vão provavelmente consolidar a tese de que terminou o bipartidarismo nos dois lados dos Pirenéus. Em Espanha, as eleições autonómicas provavelmente só permitirão uma leitura nacional a 29 de Maio. Mas do outro lado da fronteira a Frente Nacional (FN) pode confirmar já hoje na primeira volta a tese de que a vitória nas eleições europeias não foi um acto isolado.
Se as europeias foram lidas como um voto de protesto, as departamentais em França serão um voto de implantação territorial para a FN, e, como reconhece a própria Marine Le Pen, “não há sucesso presidencial se não houver uma malha territorial”. Ou seja, é a FN a pavimentar a estrada que a poderá levar à Presidência da República em 2017 – o que seria preocupante ou mesmo dramático para o projecto europeu. O partido nacionalista e populista quer o regresso ao franco, defende a saída da União Europeia, o fim de Schengen e é anti-imigração. E todas estas crenças são pinceladas por laivos de xenofobia, racismo e intolerância. O PÚBLICO foi visitar Fréjus, a maior cidade conquistada pela FN nas eleições municipais há um ano, e encontrou um presidente de câmara cuja primeira medida de governação foi retirar a bandeira da União Europeia do edifício da câmara.
Numa altura em que muitos europeus não se revêem e não encontram respostas na clássica dicotomia direita/esquerda, vão nascendo por esta Europa forças políticas radicais que ameaçam fazer implodir o sonho da integração europeia. Mario Draghi do BCE formula a questão com uma simplicidade desconcertante: “Os países têm de se sentir melhor dentro [do projecto europeu] do que se estivessem fora.” E essa percepção não está a acontecer em várias partes da Europa, a começar pela Grécia, que hoje é governada por um partido de extrema-esquerda.
Numa entrevista este fim-de-semana ao semanário Expresso, Marine Le Pen diz que “o euro e a austeridade estão indissociavelmente ligados”. É este ciclo e esta percepção que é preciso serem quebrados. E mesmo assim não chega. É preciso mudar a forma e a legitimidade no processo de tomada de decisões sobre o próprio projecto europeu. É embaraçoso, para não dizer vergonhoso, episódios como aquele que aconteceu no final desta semana, quando no meio de uma reunião do Conselho Europeu Tusk, Juncker, Draghi, Dijsselbloem, Hollande e Merkel se fecharam numa sala com Tsipras para discutir o futuro da Grécia no euro. O primeiro-ministro belga veio dizer que estava furioso: "Não demos nenhum mandato nem à França nem à Alemanha para negociar em nosso nome." Passos Coelho, claro está, veio dizer que não está “nada incomodado”. O bom aluno até é bom aluno quando não o deixam entrar na sala. São estas e outras incongruências em Bruxelas que ajudam a criar um ambiente fértil para Le Pen e companhia.