Anuário de Poesia renasce em versão minimal

Retomando um projecto que deu muito que falar nos anos 80, a Assírio & Alvim lançou este sábado o Anuário de Poesia de 2015. Dos 2154 poemas recebidos, o júri só conseguiu salvar 15.

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Desta vez, o júri seleccionou apenas 15 poemas, de sete autores, uma escolha surpreendentemente escassa se tivermos em conta que chegaram à editora 2154 poemas, enviados por 223 pessoas. Na nota que antecede os poemas, o júri – composto por Almeida Faria, Armando Silva Carvalho e Golgona Anghel, e ainda pelos editores Manuel Alberto Valente e Vasco David – divide os muitos aspirantes a poetas que ficaram pelo caminho em dois grupos principais: os que “não lêem poesia, ou não lêem, pelo menos, poesia actual”, e os que “de tal maneira procuram emular alguns nomes maiores que os seus poemas carecem de qualquer originalidade”.

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Desta vez, o júri seleccionou apenas 15 poemas, de sete autores, uma escolha surpreendentemente escassa se tivermos em conta que chegaram à editora 2154 poemas, enviados por 223 pessoas. Na nota que antecede os poemas, o júri – composto por Almeida Faria, Armando Silva Carvalho e Golgona Anghel, e ainda pelos editores Manuel Alberto Valente e Vasco David – divide os muitos aspirantes a poetas que ficaram pelo caminho em dois grupos principais: os que “não lêem poesia, ou não lêem, pelo menos, poesia actual”, e os que “de tal maneira procuram emular alguns nomes maiores que os seus poemas carecem de qualquer originalidade”.

É cedo para se perceber se algum destes sete sobreviventes da razia virá a tornar-se um poeta de mérito reconhecido, como sucedeu com alguns autores que se estrearam nos quatro anuários que a Assírio & Alvim publicou entre 1984 e 1987. A acontecer, o candidato mais provável parece ser A. Rafael da Silva, de Baltar. Embora confessando não ter encontrado nada que a deixasse realmente “impressionada”, Golgona Anghel destaca esta poetisa, que abre o volume com três poemas. “Achámos que tínhamos ali poeta”, resume a autora de Como Uma Flor de Plástico na Montra de Um Talho. Transcrevemos nestas páginas um dos poemas de A. Rafael da Silva escolhidos pelo júri.

Pelo menos em termos quantitativos, não se pode dizer que esta segunda vida dos anuários de poesia tenha começado de forma muito auspiciosa. Se tomarmos como referência o Anuário de 1984, o júri de então (José Bento, José Agostinho Baptista e Fernando Luís Sampaio) sempre conseguiu salvar poemas de 87 autores, dos quais 54 tinham menos de trinta anos. Era o caso, por exemplo, de Adília Lopes ou Maria do Rosário Pedreira (que surge com o pseudónimo Maria Helena Salgado), ambas com 24 anos.

E é precisamente esta a idade do mais jovem seleccionado de 2015, Pedro Craveiro, do Porto, de quem o júri seleccionou as Variações em Adélia Prado que aqui transcrevemos. Craveiro é mesmo o único dos sete autores deste anuário ainda na casa dos vinte. Os restantes têm todos entre trinta e quarenta, com a excepção de Alexandre Monteiro, de 44 anos.

Admitindo que a generalidade dos poetas começará a fazer as suas primeiras tentativas mais ou menos sérias antes ou pouco depois dos 20 anos, esta quase completa ausência de autores sub-30 não deixa de ser surpreendente.

“Isto é tão pouco, caramba”

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Armando Silva Carvalho reconhece que ler estes poemas, quase todos “muito convencionais”, foi uma experiência “um pouco triste” e diz que a dada altura desabafou com os seus co-jurados: “Mas isto é tão pouco, caramba”. Ainda assim, diz ter tentado seleccionar “mais dois ou três” nomes, mas que não obtiveram o aval da maioria. “Eram coisas assim de uma sinceridade mais crua”, explica.

E acrescenta que o problema era mesmo a qualidade, e não a quantidade, que “aquilo era gente que nunca mais acabava”. Ainda assim, os 223 autores que enviaram inéditos em 2015 não chegam a um quarto dos 918 envelopes recebidos pelo júri de 1984.

Manuel Alberto Valente admite que muita gente não terá sabido da existência deste anuário, e acredita que as coisas melhorarão na próxima edição, para a qual os interessados já podem começar a enviar poemas (o regulamento pode ser consultado no site www.assirio.pt). Não é também de excluir que o anuário de 2016 até possa receber menos poemas (uma parte dos que agora foram excluídos tenderão a não reincidir), mas que mesmo assim apareçam mais poetas publicáveis. E o critério restritivo do júri até pode funcionar como um estímulo.

Mas se é plausível que os resultados bastante decepcionantes deste ano se possam ter parcialmente ficado a dever às contingências próprias de uma estreia, não faltam outras razões que podem ajudar a explicar este aparente eclipse quase total de poetas ainda inéditos e minimamente prometedores.

Pedro Mexia, poeta e responsável pela nova colecção de poesia da Tinta da China, argumenta que a proliferação de pequenas editoras especializadas, com tiragens pequenas, tornam hoje “mais fácil” a publicação de um primeiro livro. Um cenário que, observa, também tem consequências curiosas, já que muitos dos autores que publicam nestas chancelas não chegam às livrarias generalistas. E dá o exemplo do próximo poeta que vai publicar, Miguel-Manso: “É um dos nomes mais relevantes dos últimos tempos, e toda a gente sabe quem ele é, mas de todos os livros que publicou, só o que saiu na Relógio D’Água se encontra nas livrarias”.

Mexia lembra ainda uma realidade que pura e simplesmente não existia em meados dos anos 80: a Internet. “Conheço poetas que publicam em blogues, e até no Facebook, e dizem que isso lhes basta, e que assim até chegam a mais gente”.

O diagnóstico de Fernando Luís Sampaio, o mais novo dos jurados de 1984, é bastante semelhante: “Vejo muitos blogues dedicados à poesia, e gente que publica regularmente poemas no Facebook, e suponho que sejam hoje, de facto, espaços de partilha mais fiáveis do que a edição”.

Da sua experiência de 1984, Fernando Luís, como então assinava, valoriza o facto de o júri ter sido constituído por pessoas de “gerações e gostos completamente diferentes”. E lembra, divertido: “Fui eu que escolhi os poemas da Maria José Oliveira e tive de convencer o José Bento e o José Agostinho Baptista de que aquilo era bom”. A história tem mais graça sabendo-se que a referida Maria José já então usava o pseudónimo de Adília Lopes.