Portugal precisa de quê? Empregados de comércio e restaurante
Foram inquiridas 1630 empresas. Antigo secretário-geral da UGT diz que resultados são "extremamente enganadores".
Actualmente já quase 50% dos alunos que frequentam o ensino secundário estão em cursos profissionais, a maior parte dos quais em escolas públicas.
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Actualmente já quase 50% dos alunos que frequentam o ensino secundário estão em cursos profissionais, a maior parte dos quais em escolas públicas.
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Multimédia e informática têm liderado tanto na oferta como na procura, mas estas são algumas das opções para as quais a Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional (ANQEP) aconselha uma redução acentuada a curto prazo por não se coadunar com o que se espera ser a evolução de emprego nestas áreas. Esta orientação já fora dada em 2013, quando o Ministério da Educação e Ciência (MEC) consagrou a indústria e agricultura, e também o comércio, entre as áreas prioritárias para o ensino profissional.
Agora, para dar corpo a um novo sistema de antecipação de necessidades de qualificação, que permita identificar as áreas e saídas profissionais prioritárias para quem tenha equivalência ao ensino secundário, a ANQEP perguntou às empresas quais as qualificações de que mais precisam. As respostas variam consoante as regiões, mas no geral o retrato que emerge é o de um país consagrado aos serviços. A necessidade de qualificações ligadas à indústria apenas aparece em 12.º lugar a nível nacional e é particularmente sentida na região Norte, embora também aqui, num inquérito a 601 empresas, a tabela das mais procuradas seja encabeçada por empregados de restaurante/bar.
Acontece o mesmo no Algarve (64 empresas inquiridas). Na região de Lisboa, um inquérito a 498 empresas catapulta os empregados de comércio para o topo da lista de qualificações mais requeridas. O Centro (357 empresas) e o Alentejo (110 empresas) são a excepção com os operadores logísticos e agrícolas a destacarem-se no cimo da tabela. Estas duas qualificações ocupam respectivamente o 16.º e o 10.º lugar da tabela das 20 qualificações mais procuradas a nível nacional. Já a procura de assistentes administrativos, auxiliares de saúde e agentes de geriatria coloca estas qualificações no top 5 nacional.
Resultados "extremamente enganadores"
Para Gonçalo Xufre, presidente da ANQEP, a predominância do sector dos serviços neste levantamento é um reflexo do “peso específico das empresas desta área no terreno” e também confirma que “o grande volume de emprego em Portugal está neste sector e no turismo”. “São resultados extremamente enganadores ”, contrapõe ao PÚBLICO João Proença, antigo secretário-geral da UGT e actual assessor da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), frisando que tanto o comércio como a restauração “são sectores onde o desemprego está a aumentar”. “Não estão a criar mais emprego, o que acontece é que por serem áreas com muito trabalho precário têm uma maior rotação de mão-de-obra”, especifica.
No ano passado entre as áreas prioritárias definidas pelas ANQEP para o ensino profissional figuravam muitos cursos ligados à indústria (manutenção industrial, electrotecnia, mecatrónica, entre outros), mas por ”falta de condições” das escolas acabou por se “assistir a uma grande concentração da oferta nas áreas de comércio e vendas”, que também figuravam entre as prioritárias, refere Gonçalo Xufre. O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares e director do agrupamento de escolas de Cinfães, Manuel Pereira, confirma que a oferta de cursos profissionais tem sido sobretudo determinada pelas possibilidades existentes nos estabelecimentos de ensino. “Os alunos muitas vezes têm de se adaptar ao que é proposto porque as escolas não têm os cursos que precisam ou que procuram”, diz.
Mas a oferta de formação, acrescenta, também é determinada pelo tecido empresarial existente, o que acaba por “prejudicar e muito o interior do país”. Por exemplo, no seu agrupamento existem três turmas de ensino vocacional, onde se exige uma formação em contexto de trabalho superior à requerida nos cursos profissionais. A expansão desta modalidade, que actualmente é frequentada por mais de 24 mil alunos do básico e secundário, é a grande aposta do MEC (as escolas podem concorrer para abrir cursos até 24 de Abril próximo)), mas em Cinfães as três turmas têm em comum a formação em hotelaria “porque é a única área que temos na região para providenciar a formação em contexto de trabalho. Não há outras empresas”, conta Manuel Pereira.
"Ajustamento suave"
Para este dirigente escolar, os resultados do inquérito afora divulgado pela ANQEP fornecem “um bom instrumento de trabalho para que se possa parar e reflectir seriamente de modo a garantir uma formação de qualidade”. Xufre destaca que estes resultados vieram confirmar que a rede de formação profissional continua em parte desajustada em relação à procura. “Constatámos que, sobretudo no Norte, ainda não se está a corresponder às necessidades de operadores de máquinas, por exemplo, uma qualificação que não estava reflectida nas áreas prioritárias que tínhamos definido”, especifica.
Xufre defende que se deve agora proceder a um “ajustamento suave” da rede de ensino profissional, que passará por uma definição por parte da ANQEP do número de turmas necessárias por curso em cada região. Este reordenamento terá na base não só os resultados do inquérito feito às empresas, mas também um retrato das “dinâmicas recentes do mercado de trabalho por profissão, escalão etário e nível de habilitação” e uma análise prospectiva sobre a evolução da procura de qualificações e das tendências de evolução do emprego em Portugal.
Com base neste diagnóstico, a ANQEP recomenda, por exemplo, uma quebra até menos 20% da oferta, entre outros, de cursos de Multimédia, Audiovisuais, Técnicos de Gestão e Programação de Sistemas Informáticos, Apoio à Gestão Desportiva (outro dos favoritos entre os alunos), Energias Renováveis, mas também de Viticultura e Enologia, apontada como uma área prioritária no ano passado.
Entre as áreas em que se propõe uma expansão da oferta formativa, que pode ir até mais 20%, por serem aquelas em que se prevê maior empregabilidade, estão para além dos cursos de empregados de comércio e de restaurante, formações para operadores de máquinas, agentes em geriatria, empregados de andares (hotelaria), electricista, bombeiros, padeiros, pedreiros, entre outras.