Ao lado de uma grande Mulher há sempre outra grande Mulher
A desigualdade entre os dois géneros significa que não estão a ser dadas oportunidades a milhares de mulheres no mundo inteiro para utilizarem o seu potencial e contribuírem para o desenvolvimento económico.
De manifestações de carinho acompanhadas de flores, chocolates, cartões com frases celebres que têm como objectivo homenagear e enaltecer as qualidades tidas como obrigatoriamente femininas: beleza, fragilidade, vaidade, delicadeza... No fundo, em determinados casos, vêm reforçar um padrão único de mulher, um ideal que precisa de ser abanado. Gosto destes presentes, o ano inteiro, de forma inesperada, mas nada têm a ver com o propósito do Dia Internacional da Mulher. A linha que separa o que é gentil do que é machista, nas homenagens feitas nesta data, é ténue na medida em que muitas vezes, desta forma, são reforçados estereótipos, tendo até como intenção comemorar situações de igualdade e empoderamento que na realidade ainda não existem. Não as considero acções negativas, mas tendem a esvaziar a verdadeira missão do 8 de Março. Esta data já suou muito, tem na sua origem fortes movimentos de manifestação política, trabalhista, greves... é uma data que simboliza a procura da igualdade social entre homens e mulheres em que as diferenças biológicas devem ser respeitadas e não sirvam para subordinar e inferiorizar a mulher. Subjacentes aos grandes movimentos sindicais e políticos (nos sécs XIX e XX nos países que se industrializavam, o trabalho fabril era realizado por homens, mulheres e crianças durante 14 horas, 6 dias por semana em condições terríveis) emergiam outros, que ditavam uma nova consciência do papel da mulher enquanto trabalhadora e cidadã (baseados na discriminação, mesmo em altura de reivindicações, quando por exemplo, no tema da igualdade salarial, as mulheres já não eram consideradas).
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De manifestações de carinho acompanhadas de flores, chocolates, cartões com frases celebres que têm como objectivo homenagear e enaltecer as qualidades tidas como obrigatoriamente femininas: beleza, fragilidade, vaidade, delicadeza... No fundo, em determinados casos, vêm reforçar um padrão único de mulher, um ideal que precisa de ser abanado. Gosto destes presentes, o ano inteiro, de forma inesperada, mas nada têm a ver com o propósito do Dia Internacional da Mulher. A linha que separa o que é gentil do que é machista, nas homenagens feitas nesta data, é ténue na medida em que muitas vezes, desta forma, são reforçados estereótipos, tendo até como intenção comemorar situações de igualdade e empoderamento que na realidade ainda não existem. Não as considero acções negativas, mas tendem a esvaziar a verdadeira missão do 8 de Março. Esta data já suou muito, tem na sua origem fortes movimentos de manifestação política, trabalhista, greves... é uma data que simboliza a procura da igualdade social entre homens e mulheres em que as diferenças biológicas devem ser respeitadas e não sirvam para subordinar e inferiorizar a mulher. Subjacentes aos grandes movimentos sindicais e políticos (nos sécs XIX e XX nos países que se industrializavam, o trabalho fabril era realizado por homens, mulheres e crianças durante 14 horas, 6 dias por semana em condições terríveis) emergiam outros, que ditavam uma nova consciência do papel da mulher enquanto trabalhadora e cidadã (baseados na discriminação, mesmo em altura de reivindicações, quando por exemplo, no tema da igualdade salarial, as mulheres já não eram consideradas).
Em 1910, Clara Zétkin e Rosa de Luxemburgo propuseram o Dia Internacional da Mulher na 2ª Conferência Internacional de Mulheres socialistas em Copenhaga como protesto contra a opressão feminina. 105 anos passaram e aqui estamos nós, com uma lista muitíssimo significativa de conquistas adquiridas e uma outra, igualmente fundamental, por atingir. “A igualdade para as Mulheres e Meninas significa verdadeiramente o progresso para todos e todas e é a chave para um futuro mais sustentável.” Esta frase de Babatunde Osotimehin, Director Executivo do UNFPA, diz tudo. E fica ainda mais reforçada com as recentes declarações do vice-presidente para a região do Banco Mundial, Makhtar Diop: “a capacitação das mulheres em África poderia acabar com a pobreza!”.
A desigualdade entre os dois géneros significa que não estão a ser dadas oportunidades a milhares de mulheres no mundo inteiro para utilizarem o seu potencial e contribuírem para o desenvolvimento económico. Empoderar as mulheres é, de facto, empoderar a humanidade. As mulheres exigem o reconhecimento dos seus direitos, estar em pé de igualdade (e não de superioridade) com os homens numa sociedade que se quer ética, equilibrada, humanista. Assim sendo, (e para que seja mais fácil argumentar quando a reivindicação vem de uma mulher) é necessário escancarar os factos, por exemplo: os acordos de paz que envolvem mulheres duram mais tempo; as empresas com mais mulheres na liderança têm melhor desempenho; a participação feminina nos Parlamentos é crucial para a criação de leis nas áreas da saúde, educação, apoio à criança; as mulheres gastam a maior parte dos seus salários no bem estar dos seus filhos e família; quando a mulher é dona de uma terra, investe duas vezes mais do que o homem; a educação das raparigas faz diminuir a probabilidade de terem filhos que morrem antes dos cinco anos e promove a sua permanência na escola.
Quem defende a dignidade humana só pode ser feminista, homens e mulheres, até ao dia em que já não exista nenhuma destas leis grotescas: na Índia, a violação é permitida mesmo que a rapariga tenha 15 anos de idade e desde que seja praticada pelo próprio marido. Nas Bahamas a fasquia baixa até aos 14 anos e em Singapura até aos 13. Em Malta, o crime de violação (ou rapto) é anulado desde que o autor case com a vitima. Na Nigéria, a violência sobre as mulheres não é crime quando tem o propósito de “corrigir” a mulher. Na China e na Rússia, existem diversas profissões que são interditas às mulheres. Em Madagáscar, as mulheres não podem ter contratos de trabalho nocturno a não ser que sejam negócios familiares. Na Arábia Saudita, as mulheres estão impedidas de tirar a carta e conduzir. Na República do Congo, as mulheres são obrigadas a viver para sempre com os seus maridos e acompanha-los no seu dia a dia. Na Tunísia, nos Emirados Árabes Unidos, no Irão a mulher vale (legalmente) menos do que o homem e em caso de herança as filhas ficam sempre prejudicadas enquanto que os filhos homens herdam a maior fatia. No tribunal, o valor de um depoimento de uma mulher é metade do do homem, ou seja, têm de ser duas mulheres para que o testemunho seja aceite no processo, mas o homem vale por si próprio. Assim como a indemnização em caso de morte de um filho é superior para os pais comparativamente ao que recebem pelo falecimento de uma filha.
Poderia continuar com mais alguns exemplos. Mas eu não estou a falar das discriminações, violações dos direitos humanos ou actos de violência com base no género que ocorrem todos os dias no mundo desenvolvido e no mundo dito em desenvolvimento. Essas dariam uma lista chocantemente longa, com Portugal incluído. Apenas enumerei algumas das leis que nos dias de hoje protegem estas desigualdades perpetuando um sofrimento incalculável a milhares de mulheres e as impossibilitam de escolher. As decisões sobre a sua vida, o seu corpo, a sua vontade. Não terem acesso a cuidados de saúde, sexual e reprodutiva e a serviços de educação.
Priscilla Sitienei, queniana, considerada a estudante mais velha do mundo, com 90 anos, é uma aluna atenta e dedicada. Diz que decidiu ir para a escola porque quer deixar um recado: “às crianças do mundo, em especial às raparigas, que a Educação é a sua riqueza. Não olhem para trás. “
Só vale olhar para trás para relembrar os grandes passos e arranjar inspiração e energia para os obstáculos do presente e do futuro. Com indignação. Todos juntos, partilhando o mesmo banco de escola.
Embaixadora de Boa Vontade do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA) e Presidente da ONGD Corações com Coroa