Quadros superiores: elas ganham menos 30% do que eles
Diferenças salariais acentuam-se no topo da hierarquia. Dados compilados pela Pordata, a propósito do Dia da Mulher, sobre a vida e a morte, a educação e o trabalho, mostram avanços e retrocessos.
Desde logo, fica a saber-se que para qualquer nível de qualificação, a remuneração base média das portuguesas que trabalham por conta de outrem é sempre inferior à dos homens. Mas que é no topo da hierarquia, nos quadros superiores, que encontramos a maior diferença, 27,5%. Na categoria dos profissionais não qualificados, por exemplo, o hiato não vai além dos 12%. Na categoria de "praticantes e aprendizes", 4,9%.
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Desde logo, fica a saber-se que para qualquer nível de qualificação, a remuneração base média das portuguesas que trabalham por conta de outrem é sempre inferior à dos homens. Mas que é no topo da hierarquia, nos quadros superiores, que encontramos a maior diferença, 27,5%. Na categoria dos profissionais não qualificados, por exemplo, o hiato não vai além dos 12%. Na categoria de "praticantes e aprendizes", 4,9%.
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“Estas diferenças não se têm esbatido com o tempo”, diz Maria João Valente Rosa, directora da Pordata, em declarações ao PÚBLICO. Pelo contrário: em alguns grupos de qualificação, a desigualdade salarial é mesmo mais acentuada agora do que era em 1985.
Veja-se, uma vez mais, o que se passa nos quadros superiores. A diferença salarial entre homens e mulheres agravou-se, em Portugal, comparativamente com 1985, em quase oito pontos percentuais. Entre os profissionais não qualificados, perto de quatro pontos.
A tendência já tinha sido referida pelo Eurostat na quinta-feira, quando fez saber que Portugal foi o país onde a disparidade salarial mais aumentou entre 2008 e 2013 — de 9,2% para 13% (na UE a diferença é maior, passou de 17,3% para 16,4%, mas o sinal é de descida). Contudo, a Pordata faz a análise por grupos de qualificações em Portugal e mostra que nalguns o hiato é bem maior do que isso.
“Sempre houve discrepâncias”, diz Valente Rosa. “Mas quando olhamos para os níveis de qualificação onde essa discrepância mais se nota, verificamos que ela existe essencialmente nas qualificações mais elevadas, quadros superiores, profissionais altamente qualificados, quadros médios, ou seja, mulheres que apostam na educação, no avanço das suas qualificações, esbarram com um problema de mentalidades. São dados muito preocupantes, do meu ponto de vista.”
Mais educação
Em Portugal, as raparigas dos 18 aos 24 anos abandonam menos a escola do que os rapazes. Desde 1986, o número de mulheres matriculadas no ensino superior ultrapassou o dos homens. E “sabia que a larga maioria dos diplomas no ensino superior é, todos os anos, atribuído às mulheres?” — lê-se no especial “Sabia que...” da Pordata para o Dia da Mulher.
“Houve um investimento fortíssimo das mulheres, que tem a ver com aquilo que eu poderia chamar como uma emancipação das mulheres pelos estudos”, continua a professora. Isso tem-lhes permitido, de resto, chegar a áreas profissionais tradicionalmente mais masculinas. Por exemplo, a maioria dos magistrados judiciais são mulheres (1054, contra 762, em 2013, seis vezes mais do que no início dos anos 1990). E o número de empregadoras “aumentou quase seis vezes em relação a meados dos anos 1970”.
“As sociedades modernas estão muito dependentes do conhecimento. Portanto, esta aposta das mulheres no conhecimento através da escolaridade e da qualificação está completamente em linha com aquilo que são os grandes desafios da modernidade", diz a directora da Pordata. "O reverso da medalha, o que não está nada bem resolvido na sociedade portuguesa, e é a questão das remunerações. Quando olhamos para a rapidez da mudança na área da educação, percebemos que mesmo havendo alguma evolução na parte do trabalho ela é tão lenta que está a haver uma resistência muito grande.”
Depois, existe o problema das responsabilidades parentais, “uma questão onde há desequilíbrios profundos no interior das famílias”, prossegue. “E isto levanta a questão do tempo: mais do que os resultados, continuamos a premiar o tempo total, a disponibilidade total para o exercício de determinado tipo de funções. Uma pessoa que faça a mesma coisa mas em menos tempo, não é tão valorizada como a que faz a mesma coisa em mais tempo, quando devia ser o contrário.”
A directora da Pordata admite que esta “mentalidade” ajude a explicar os indicadores das remunerações, tão desfavoráveis às mulheres. E que, também por questões de “mentalidade”, nas empresas, em muitos casos, se atribuam mais facilmente a homens funções que na prática as mulheres até exercem. Exercem na prática, mas não formalmente ou com o salário correspondente, sublinha.
Mais longevidade
Mas a desigualdade está igualmente presente noutras áreas, pelas mais diversas razões — na política, na saúde e até na morte. “Sabia que em Portugal, o número de deputadas eleitas em 2011 para a Assembleia da República foi três vezes mais do que em 1975?” — prossegue o “Sabia que...” da Pordata. Ainda assim, elas representam só cerca de um quarto do total de deputados.
E para algo completamente diferente: “Sabia que Portugal está entre os dez países da União Europeia onde as mulheres, aos 65 anos, podem esperar viver mais anos?” — mais 20. Mas que, “no entanto, nem um terço (seis anos) desse tempo é vivido de forma saudável”?
Portugal é mesmo daqueles que apresentam menos anos de vida saudável entre as mulheres, após os 65 anos, explica Valente Rosa. E os homens? Vivem menos tempo, mas têm mais anos de vida saudável depois dos 65 anos (6,6), de acordo com os dados da Pordata.
A pirâmide etária não engana: no início, até nascem mais meninos do que meninas. Mas como a intensidade da mortalidade é sempre superior nos homens, essa supremacia à nascença inverte-se e a partir do grupo etário dos 25 anos há sempre mais mulheres do que homens.
A Pordata - Base de Dados de Portugal Contemporâneo é um projecto da Fundação Francisco Manuel dos Santos, distinguido, em 2011, com o prémio World Summit Award, atribuído pelas Nações Unidas às aplicações mais inovadoras na promoção da sociedade do conhecimento. O seu site, reúne mais de 2300 quadros estatísticos. Com base na análise que faz daqueles que analisam a situação das mulheres portugueses, e apesar de todas as desvantagens que alguns revelam, Maria João Valente Rosa acredita que “o futuro será cada vez mais feminino”. Mas para isso, remata, é preciso que “o mérito, de facto, comece a prevalecer sobre os direitos adquiridos, ou sobre atributos como o sexo”.